Há cem anos, Lima Barreto começava campanha contra o futebol

Trazido da europa, futebol era esporte de elite, principal motivo para a crítica do autor

Escrita há cem anos, a crônica “Sobre o Football” representa uma das primeiras críticas ao esporte no Brasil e um dos maiores erros de julgamento do seu autor. Lima Barreto acreditava que o futebol não cresceria no país por ser praticado pela elite, portanto pouco interessaria ao povo.

A prosa de Lima Barreto sempre criticou as atitudes e posturas da elite brasileira. Filho de pais negros, um tipógrafo e uma professora, a questão racial e social são marcantes em suas obras.

A crítica escrita em 1918 não tinha um fundo diferente. O futebol era visto como mais um instrumento de segregação: “jogo do pontapé propaga a sua separação social e o governo subvenciona”.

O escritor preferia apoiar a capoeira como esporte nacional, que era praticada nas periferias, mas tratada pelo governo como atividade criminosa, tendo sua prática perseguida pela polícia.

Na época, Lima Barreto não estava errado. O esporte foi transportado da Inglaterra em seus moldes europeus, coisa de rico. Em 1921, ele escreveu “Bendito Football” no Correio da Manhã, criticando a decisão de Epitácio Pessoa, então presidente da República, de não levar “homens de cor” a uma competição na Argentina.

Bate-bola literário

O esporte também implicou em uma briga literária com Coelho Neto, conhecido como “príncipe dos prosadores brasileiros”. A briga não remetia apenas ao estilo do autor parnasiano e formalista, o futebol era o centro das diferenças.

Coelho Neto, reconhecido por prosas e poemas que admiravam o esporte, apoiava grandes clubes para que o futebol crescesse no país. Lima Barreto constantemente o criticava, afirmando que as agremiações que surgiam eram “uma pretensão absurda, de classe, de raça”.

O ódio de Lima Barreto ao esporte não rendeu apenas as crônicas contrárias ao futebol. O autor fundou a Liga contra o Football, mas a tentativa durou pouco porque o esporte ganhou espaço no Brasil.

Negros em campo

A década de 30 representou uma mudança no esporte. Com a profissionalização do futebol, foi permitida a entrada de negros, pardos e mulatos. O futebol se tornou massificado, gerando atrações como os clássicos jogos cariocas, atraindo cada vez mais torcedores ao longo do tempo, consagrando nomes como Leônidas Silva, Pelé e Ronaldinho Gaúcho.

Apesar de o esporte assumir um grande papel social, contrariando as previsões do escritor, Lima Barreto não estava totalmente errado. O futebol ainda serve a uma elite, de empresários aos cartolas da FIFA.

Mas, para tristeza de um dos maiores escritores da literatura brasileira, o esporte caiu nas graças do Brasil e do mundo: somos, reconhecidamente, o país do futebol.