Jovem passa duas vezes na USP mas, sem auxílio, opta pela Unicamp

Aprovado em Administração na FEA pelo Sisu e Fuvest, calouro vai para a UNICAMP por dificuldades em conseguir os auxílios de permanência

Foto: João Rodrigues / Arquivo Pessoal

Por Beatriz Gomes

No dia 16 de fevereiro, uma postagem no grupo do Facebook do Conjunto Residencial da USP (CRUSP) chamou a atenção: um jovem dizia que foi classificado como perfil 1 no Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE), prioridade máxima para recebimento dos auxílios. “Minha família não tem condições de me manter em São Paulo e estou desesperado diante à possibilidade de não poder ir à universidade que sempre foi meu sonho, queria saber se existe alguém que possa me hospedar pelo menos até que eu reforce aos assistentes sociais minha posição de vulnerabilidade”.

O nome do jovem que fez o post é João Rodrigues, e aquela não foi sua última mensagem. Dois dias depois, o relato foi outro. Ele anunciava não ter conseguido a moradia provisória da USP, e teve que optar pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Natural de Altinópolis, interior de São Paulo, cidade com cerca de 15 mil habitantes a 300 quilômetros da capital, João é filho de um trabalhador rural que ganha, aproximadamente, dois salários mínimos por mês. A mãe, faxineira, trabalha duas vezes por semana na cidade vizinha. Por não ter casa própria, João e sua família moram com a avó.

Junto com a irmã, Betânia, ele estudou a vida inteira em escola pública. Ela foi a primeira pessoa da família a passar em uma universidade pública, a Unicamp. Atualmente, cursa Engenharia de Alimentos. João conseguiu uma bolsa de estudos para fazer pré-vestibular quando estava no segundo ano do Ensino Médio. Seus familiares fizeram um esforço financeiro e conseguiram pagar seus estudos durante um ano. Foi neste momento que ele descobriu o que eram os vestibulares e seu funcionamento.

Em 2018, seu último ano do ensino médio, prestou o Enem, a Fuvest e a Comvest. Foi aprovado em todos. Passou na Unicamp, USP, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e Universidade Presbiteriana Mackenzie, as duas últimas com bolsas integrais.

A rotina de estudos de João em 2018 era extensa. Todos os dias ele começava a estudar das 4h às 6h30 da manhã, parava para ir à escola. Quando voltava, estudava até às 23h.

A aprovação

João ficou imensamente feliz ao saber da aprovação na USP. “Meu pai até chorou porque ele nunca teve oportunidade de estudar na vida, nem ele nem minha mãe; como os dois não terminaram o ensino fundamental, minha família ficou muito contente”. A dificuldade veio quando teve que escolher a universidade.

“Foi uma das decisões mais difíceis da minha vida, a felicidade tocou meu coração de diversas formas, por um lado eu tinha a Unicamp uma universidade pública muito conceituada, e do outro eu tinha a USP, um sonho antigo de criança”.

Ao ser aprovado na USP, ele pensou, imediatamente, como se manteria na universidade. Segundo ele, o que mais contribuiu para optar pela Unicamp foi o fato de pedir todos os auxílios emergenciais e conseguir somente o auxílio alimentação na USP, mesmo com a classificação máxima de prioridade.

Ele conta que a Superintendência de Assistência Social (SAS) não deu nenhuma certeza quanto ao recebimento do auxílio e informava ao estudante que só restava aguardar a próxima lista disponível.

Outros fatores que contribuíram para a escolha da Unicamp foi o início das aulas e a possibilidade de perder a vaga na Unicamp enquanto não tinha certeza se seria contemplado pelos auxílios da USP.

Assistência social?

Para João, a documentação dos pedidos de bolsa era muito extensa. Ele entende a preocupação da universidade em coibir fraudes, no entanto, a impossibilidade da entrevista presencial fez com que o processo se tornasse pouco transparente para ele. Digitalmente, poderiam haver duplas interpretações acerca da documentação enviada.

Quanto aos prazos, ele achou “tranquilo” e o site da SAS foi, no seu caso, efetivo. Ele diz ter tomado conhecimento de pessoas que moravam a mais de 1.000 quilômetros de São Paulo e tiveram que abandonar a USP ou passar por transtornos maiores que o processo do vestibular.

Na Unicamp, a entrega dos documentos também é online. No entanto, é possível que os interessados passem por entrevista com as assistentes sociais.