Professor Gualazzi é investigado por racismo

USP tem colaborado com as investigações, que levarão 30 dias. Processo criminal independe do administrativo

Extraídos do documento entregue em aula, estes trechos contribuíram para a instauração do processo contra o professor na DECRADI

Beatriz Gatti e Maria Paula Andrade

Um dia depois da aula ofensiva na Sanfran, em 26 de fevereiro foi instaurada investigação criminal contra o professor da Faculdade de Direito, Eduardo Lobo Botelho Gualazzi. A Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI) é a responsável pela apuração do que ocorreu na aula inaugural de Direito Administrativo Interdisciplinar.

O professor pode responder por crime racial definido pela lei nº 7716/89, que prevê reclusão de um a três anos para quem “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.” A instauração do processo foi iniciativa da própria DECRADI, que ficou sabendo do caso a partir da imprensa.

DECRADI
A investigação consiste na análise do material distribuído em aula, que inclui trechos ofensivos a minorias raciais e sociais, e do contexto em que foi aplicado. “Ele cita aquilo como um trecho extraído de um livro? Como um exemplo de algo histórico, que acontecia no século passado?”, questiona a delegada Daniela Branco. “Precisamos entender como foi”.

Além de Gualazzi, que já esteve na delegacia, serão ouvidos estudantes que estiveram na aula e mais dois alunos, testemunhas indicadas pelo professor – serão, provavelmente, o que se chama em linguagem jurídica de “testemunhas referenciais”, esclarece a delegada, aquelas pessoas que não presenciaram os fatos, mas podem falar da conduta do investigado, como ele é cotidianamente.

O que pode acontecer
Na DECRADI, Gualazzi não será processado por homofobia, porque essa discriminação ainda não configura crime federal. No estado de São Paulo, porém, há uma lei que pune administrativamente quem comete homofobia, explica Bárbara Lisboa Travassos, delegada-assistente da DECRADI.

Daniel Medina
Apesar do caráter discriminatório à comunidade LGBT, Gualazzi não poderá ser incriminado por este trecho. A tipificação da LGBTfobia como crime está no STF  (Arte: Daniel Medina)

A lei administrativa nº 10498, de 2001, indica punição a manifestações vexatórias ou discriminatórias praticadas contra cidadão homossexual, bissexual ou transgênero. Mas, nesse caso, a investigação fica a cargo de uma Comissão Especial da Secretaria da Justiça do Estado.

O professor foi temporariamente afastado, mas o processo criminal independe de desdobramentos do processo administrativo. A contar a partir do dia 26, a DECRADI tem um prazo de 30 dias para concluir a investigação. Depois disso, as provas são enviadas para o Ministério Público, que decide se arquiva o caso, solicita mais provas ou faz a denúncia. Se isso ocorrer, o professor poderá ser inocentado ou uma ação penal terá início.

A Universidade de São Paulo ainda poderia ser processada se fosse considerada omissa no caso. Porém, com o pronunciamento da FDUSP e a colaboração com as investigações, na opinião da delegada Daniela Branco há um interesse da instituição em agir sobre o episódio.

Replay amargo de 2014
A turma está quase lotada: são 59 alunos para 60 vagas. A ofensa do professor que ocorre diante da turma é surpreendente só para quem não sabe de outra aula controversa de Gualazzi, em 2014. Naquela ocasião, o professor reverenciou a Ditadura e gerou revolta entre o corpo discente. Depois disso, Gualazzi passou um tempo afastado das atividades na São Francisco, o que de certa forma “enterrou sua fama”, afirma a diretora do Centro Acadêmico XI de Agosto, Graziela Jurça.

De acordo com Guilherme Pires, estudante do quinto ano, a maioria dos atuais alunos da São Francisco não havia entrado na faculdade em 2014 e, portanto, não teve conhecimento sobre a polêmica. Além disso, a necessidade de cumprir créditos obrigatórios e a limitada oferta de disciplinas faz muitos alunos se matricularem sem necessariamente saber quem serão os professores.

Confira a primeira parte da matéria neste link.

A seguir, a íntegra do documento entregue em sala de aula: