No meio da FFLCH, tinha um novo golpe militar

Não aconteceu. Mas, segundo relatos, a prisão de um aluno criou narrativas divergentes

Por Ane Cristina

Não tenho ideia de quantas viaturas e policiais eram, porque eu estava dentro da sala. Depois saí e ouvi coisas, não sei o quanto é verdade. Começaram a passar pessoas, policiais e os seguranças da FFLCH pelos corredores. O que eu soube é que eles estavam abordando alunos no corredor. Tinham dois policiais, se não me engano, conversando com o segurança da entrada do prédio.

Reparei que eles estavam armados, mas não conheço armas direito, então não sei dizer qual era, mas era uma arma visível e grande. Pelo que ouvi tinha uns 12 caras, mas não saí da sala até eles irem embora do prédio. Quem saía para ir ao banheiro tinha que mostrar RG se eles pedissem, acho que você não podia sair do prédio enquanto isso acontecia. Chegou a mim a informação de que eram 30 policiais. Todos portavam uma arma, acho que calibre 38, como normalmente vemos em policiais na rua, na cintura.

Um dos seguranças bateu na porta da sala e pediu para que o professor perguntasse se um tal de Leonardo estava. O professor perguntou, ninguém se manifestou, ele falou “bom, não tem essa pessoa”. Aí apareceu outro policial e pediu para que o professor mostrasse a lista de presença para confirmar que não tinha aquele aluno na aula.

Com a aula parada, ficou vendo a lista na porta da sala. Viu, passou para a professora e saiu. A aula continuou, daquele jeito meio sem continuar, porque todo mundo ficou falando disso. Dali a 5 minutos ele entrou de novo, apontou para um aluno e falou “qual seu nome?”; o aluno falou “quem, eu?”, e o policial falou “você”; e ele falou “Ricardo”, o policial foi embora. Parecia um filme americano estereotipado em que entra um monte de policial e sai perguntando “você viu um cara?”, até que acha ele.

Entrei em pânico. Eles não diziam o motivo de estarem ali e ainda mais com um fuzil. Como os alunos da época da ditadura se sentiam ao irem para a faculdade, sabendo que, a qualquer momento eles poderiam ser levados por militares que entram sem pedir licença, sem dizer o motivo de estarem ali ou o motivo de levarem tal pessoa, sem saber se eles voltariam algum dia para casa ou se seriam mais um que saiu de casa e não voltou mais? Eles simplesmente entravam, não dava nem para saber se eles eram policiais de verdade.

Era meados do dia 31 de março e toda a notícia de que o presidente tava querendo comemorar o aniversário do golpe de 64, minha mente já voou longe achando que estava rolando outro golpe, mesmo não sendo militar que estava ali. O clima ficou bastante pesado na sala. Não foi uma coisa normal.