São as águas de março fechando a Música

Pela segunda vez, rachaduras no solo resultaram na inundação do auditório do Departamento de Música

Por Giovanna Jarandilha

No último mês, os alunos do curso de Música da ECA (Escola de Comunicações e Artes) e o Coral da USP ensaiaram no Departamento de Artes Cênicas (CAC). O porquê disso data do carnaval: as chuvas do período inundaram o auditório Olivier Toni. Apresentações e aulas foram canceladas.

O mau cheiro da água parada fez com que, três dias depois, o carpete do único auditório do Departamento de Música (CMU) fosse retirado. Não por acaso, a acústica ficou prejudicada: a permanência do som no ambiente, chamada de reverberação, é atenuada com a utilização de materiais absorventes — como o carpete, que funciona como isolante acústico. Sem o carpete, que havia sido instalado em janeiro do ano passado, o som ecoa no ambiente por mais tempo.

Segundo um funcionário que presenciou a inundação do auditório, a água infiltrou através de rachaduras no chão. Porém não só chegou, como também voltou pelo mesmo lugar.

O diretor do CMU, Silvio Ferraz Mello Filho, explicou que o auditório juntou 17 mil litros de água no sábado, 2 de março. Na segunda-feira seguinte, quando, com bomba de sucção, foi retirada a água, havia 5 mil litros a menos.

Problema estrutural

Pense no prédio do CMU como um peso sobre uma esponja com água: vai vazar. Esse é o exemplo que Victor Gitti, engenheiro que desenvolveu projetos de impermeabilização, deu para explicar a ida e volta do líquido no departamento.

“A chuva aumenta o nível dos rios. Para nivelar a altura, a terra em volta do rio absorve a água”. O engenheiro completa dizendo que, na USP, isso acontece no Rio Pinheiros e na Raia Olímpica. “Nos pontos em que o solo encontra uma construção, o peso faz a água subir”. Quando o rio se estabiliza e volta a atingir o nível normal, a água que subiu é reabsorvida pelo solo.

“Geralmente se faz uso de uma manta asfáltica impermeabilizante para evitar infiltração. Se a ECA tem essa manta, provavelmente está velha e rasgada, senão também teria inundado outros prédios da USP”.

“As infiltrações são um problema antigo”, comenta um aluno do sétimo ano do curso de música. Logo depois de entrar na ECA, em fevereiro de 2013, a mesma coisa aconteceu — a água chegou a cobrir o palco do auditório Olivier Toni, atingindo os pianos elétricos, que precisaram ser realocados para o primeiro andar, para evitar danos.

O diretor do CMU definiu as enchentes como “crônicas”. “A área das artes é de várzea, e o prédio da música foi construído na década de 90 sem levar em conta este tipo de situação. Já foram diversas inundações na região CMU, CAC e CAP (Artes Plásticas).”

CMU após a inundação ocorrida no carnaval. Foto: Silvio Ferraz

A várzea da ECA

As áreas de várzea correspondem ao domínio hidrológico de um rio — ou seja, nos períodos de cheia, são ocupadas pelas águas desse rio. Como explica Jordana Zola, doutora pela FAU, a USP se encontra na área de várzea do Rio Pinheiros.

“A melhor forma de fazer ocupação de uma várzea é não ocupar”. A área é propensa à inundação, pois corresponde ao ponto mais baixo de uma bacia hidrográfica e é para onde a água tende a correr mais rápido.

“Quando a área já está urbanizada e existem poucas possibilidades de reestruturar, o ideal é tornar o terreno mais alto, através de aterros”, completa Jordana. A Diretoria da ECA informou que o CMU pretende reformar o piso. Ainda, comunicou que a Superintendência do Espaço Físico (SEF), órgão autorizado a fazer obras de infraestrutura no campus, visitou as Artes e está realizando estudos preventivos “para evitar situações como esta no futuro”. Apesar de contatado, o SEF não respondeu ao contato do JC.