Aluna da EACH alega ter queimado a mão com água da faculdade

Caso demonstra que ainda persistem dúvidas sobre a segurança ambiental do campus

Por Pietra Carvalho

 

Imagem da mão da estudante veiculada nas redes sociais. Foto: Arquivo pessoal

Há algumas semanas, ao chegar no campus da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH-USP), uma aluna cujo nome será preservado foi lavar as mãos antes de entrar na aula.

Sempre com pressa, a jovem não tem costume de passar produtos no corpo e nem comer no café da manhã. Naquela manhã, seu único comportamento atípico foi lavar as mãos “como a gente aprendia na TV Cultura”, passando cuidadosamente o sabonete e a água, até mesmo entre os dedos.

Do banheiro, a aluna foi direto para a sala de aula, também no prédio I1, popularmente conhecido como Titanic, sem passar pelo sol.

Em dez minutos, as duas mãos da estudante paulistana começaram a ficar vermelhas, “com aspecto esturricado e ardidas”, inclusive no “meinho” dos dedos que ela extraordinariamente tinha esfregado.

Dependendo do SUS e atribuindo os sintomas a uma reação alérgica ao sabão, a aluna conseguiu consulta para apenas um mês depois e tentou métodos alternativos para remediar o incômodo, como babosa, pomadas e antialérgicos.

Ao contrário do esperado, seus machucados ficaram ainda piores, com aspecto de queimadura de limão.

Na diretoria

A aluna, conversando com amigos e professores, resolveu informar o caso à diretoria da EACH. Depois de receber um email com a história, a primeira providência da administração do campus foi enviar a todos os alunos seus certificados de qualidade da água, que também foram enviados ao JC.

Depois, a secretária da diretora Mônica Sanches Yassuda marcou uma reunião com a estudante, para o dia 8 de maio, exaltando o interesse em saber mais sobre a alegação da aluna. Só que Yassuda não foi ao encontro. A estudante foi atendida por duas funcionárias da administração.

Uma delas logo alertou a aluna sobre outra denúncia de intoxicação, feita em 2014 que, em teoria, havia sido desmentida. Em tom mais ameno, as funcionárias recomendaram a visita a um plantonista de dermatologia do Hospital Universitário.

No médico

Na consulta, em meio a uma fila de pacientes, o médico não fez nenhuma pergunta à estudante, apenas olhou suas mãos e afirmou categoricamente que o problema eram queimaduras de limão.

A aluna protestou, afirmando não ter tido contato com o suco ácido. Foi quando o dermatologista abriu o Google e mostrou uma imagem como se, assim, provasse seu diagnóstico.

Ao ser novamente questionado, o médico entrou em uma discussão com a universitária, que chorava, chamando-a de “doida da teoria da conspiração da EACH”. Chamou atenção da estudante que, em nenhum momento, ela havia mencionado ser aluna da USP Leste.

Depois de levar o caso para a Comissão de Defesa da Diversidade, Direitos Humanos e Democracia (CDDDHD) do Campus, que investiga a situação ainda indefinida, a estudante escreveu seu relato em um grupo fechado do Facebook e não respondeu às nossas tentativas de contato.

 

Diretoria da USP Leste afirma que situação da água é regular no campus

“Reservatórios e caixas d’água do campus são higienizados e limpos a cada seis meses, conforme contrato e legislação vigentes”, diz nota

Prédio 1 da EACH, popularmente conhecido como “Titanic” | Foto: Wikimedia Commos

Em comunicado oficial, a Diretoria da USP Leste afirma que todo o abastecimento é da rede da Sabesp e que “são coletadas amostras de vários pontos diferentes do Campus e os reservatórios existentes não têm contato com o solo”, concluiu o comunicado, destacando a independência em relação às águas subterrâneas da USP Leste que, conhecidamente, estão em solo contaminado.

Quanto a ausência de Mônica Yassuda no encontro agendado com a aluna que alega ter tido problemas na pele da mão usando água da EACH, a diretoria disse estar “ciente de sua queixa”, mas lamentou que, na data escolhida, a professora estivesse comprometida com uma reunião do Conselho Técnico Administrativo (CTA) que se estendeu além do previsto.

“Informamos que não houve nenhum contato entre a Direção e as Assistentes da EACH com o médico que a atendeu”, concluíram os administradores, ao serem questionados sobre a forma como o médico do Hospital Universitário atendeu a aluna.

Histórias pregressas

Alunos da EACH relatam ter medo da contaminação. Uma semana depois de sua semana de recepção, em 2013, a então caloura Bianca Goldoni participou das atividades tradicionalmente propostas, que incluem tinta e um banho na lama da USP Leste.

Depois de fazer a matrícula, Bianca passou o dia no trote da faculdade. Ela participou de uma festa no Panelas, lugar conhecido dos eachianos, e voltou para casa só tarde da noite, depois de passar horas suja de terra.

Em uma semana, a estudante passou a ter vários problemas de pele, com erupções que ardiam como queimaduras. Na segunda semana de aula, Bianca voltou para sua cidade natal, no interior de São Paulo, e foi internada sem que os médicos soubessem a causa do problema, remediado com corticóides.

Sem um diagnóstico fechado, depois de meses, uma placa no terreno da faculdade chamou a atenção da aluna: no caminho entre a biblioteca e o prédio do Ciclo Básico, próximo a caixa d’água, se lia os dizeres “não pise na grama, terra contaminada.”

No início de 2014, o campus foi interditado e os alunos, temporariamente realocados, sob a promessa de que o problema seria resolvido o que, segundo a diretoria atual, aconteceu.

Bianca ouviu relatos de casos semelhantes, incluindo o de uma professora. As dúvidas sobre os compostos responsáveis pela alergia das vítimas ainda existe. “Eu não iria desistir da faculdade, mas eu ficava incomodada, isso sim. Não comia, não bebia e nem usava mais o banheiro.”

Conforme relatou o JC em matéria de 2014, outra aluna, Rosângela, desistiu do curso de Gestão Ambiental por não acreditar em estudar o meio ambiente em um campus contaminado.