O mimimi da alienada

Por Jonas Santana

Arte: Júlia Vieira

Apesar de estar no meio de seu curso, Maria sentia todas as segundas-feiras quando chegava no campus de sua faculdade a sensação de alegria semelhante à da semana da calourada. Com menos fervor, é claro, mas semelhante.

Ao contrário de muitos que também são os pioneiros da família a pisar em uma universidade pública como estudante, Maria nunca sentia o tal “não-pertencimento”, mesmo nos primeiros dias tendo que contar as moedas para conseguir juntar o dinheiro da passagem do ônibus.

Na verdade, é que quando se sonha alto vindo de um contexto nada favorável, se frustrar no caminho é o de menos. Pessoas como ela aprendem desde muito cedo que sempre serão desacreditadas e qualquer deslize pode ser motivo para comprovar algo que às vezes nem existe, como sua pseudoincompetência.

Maria não gosta de glamourizar sua origem, mas sempre que pode relembra quantos obstáculos ultrapassou para estar ali. “Uma classe social em que a ‘escassez’ é algo cotidiano não pode ser glamourizada”, sempre dizia em meio aos amigos.

Mas ela só conseguiu entender isso longe de suas raízes, porque só estando em um ambiente formado para a elite a fez perceber que todos mereciam estar e aproveitar tudo que está ali, até porque todos mantêm aquilo tudo.

Ao navegar a internet, Maria viu um post nas redes sociais que a fez refletir por se aplicar a muitas pessoas como ela. “Fazer parte de grupos minorizados e alcançar objetivos inimagináveis não pode vir a ser justificativa para ser chamado de ‘guerreiro’”, dizia a publicação.

Assim, a jovem acredita que definitivamente não se escolhe ser mulher, negra, LGBT, pobre e tantas outras características que a formam como ser. Isso já é imposto ao nascer e é com isso que se deve enfrentar o mundo. “Não somos guerreiras, é que a gente é obrigada a resistir, mesmo!”

Embora tente evitar, o conceito de meritocracia sempre a perseguirá. E as análises simplistas de sua história sempre serão usadas como exemplo para justificar um problema mais profundo.

No final, nem todos concordam com ela, mas é consenso que Maria é alienada, se vitimiza e é uma excelente produtora de mimimi.