Descobri um velho panfleto de (in)segurança da USP

Por Beatriz Cristina

Arte: Beatriz Cristina

Querido diário, 

Diante da onda de furtos qualificados que vem ocorrendo na Cidade Universitária, estou apreensiva e, por isso, tentei buscar uma forma de prevenção lendo o Incrível Panfleto das Medidas de Segurança. É possível encontrar um exemplar sendo usado como calço ou em lugares como aquelas mesinhas das bibliotecas onde há papéis desde 1980 ou antes, pois a escrita do panfleto é mais erudita do que uma fusão entre Machado de Assis com José de Alencar. 

Talvez, posso criar paranoias em relação à minha segurança dentro da bolha social criada nesse lugar ou usar a criatividade para encontrar alternativas melhores. Alguns trechos interessantes para aplicarmos no dia a dia também:   

“Quando alguém se aproximar pedindo esmolas ou fazendo qualquer pergunta, tome cuidado, pois esta é uma forma de aproximação usada pelos infratores.”

Contato humano é algo realmente difícil, principalmente se alguém pergunta alguma informação que eu não sei. Na dúvida, saia correndo. 

“Evite carregar bolsas ou carteiras. Caso seja necessário, as leve junto ao corpo, protegidas pelo braço ou mão, e nunca voltadas para rua”. Depois dessa dica preciosa, levarei meus livros em um carrinho de feira, minha sacola de pano fica suja quando a coloco no chão do circular.

Grupinhos que andam vagarosamente pelas calçadas sempre são um pesadelo pra quem está com pressa, por isso outra dica de segurança seria “caminhe contra o fluxo do trânsito.” Grande risco de ser atropelado, mesmo. Já tentou fazer nas avenidas largas da Cidade Universitária? Acho o trânsito de São Paulo muito hostil, não que as cidades vizinhas sejam tranquilas. Todo dia, no meu caminho até aqui, vejo briga de trânsito. Se eles soubessem que, segundo o panfleto de segurança da USP, “se for ameaçado por algum condutor de veículo, corra em sentido oposto ao dele, grite e peça socorro”, acabaríamos com o problema de mobilidade e segurança… ou só seríamos atropelados.

Ando distraidamente pelos lugares, não adianta. Quando descobri que “à noite, caminhe sempre afastado de muros e, ao dobrar esquinas, o faça da maneira mais afastada da curva”, tive certeza: se eu encontrasse alguém na rua, eu poderia esbarrar e, assim, eu estaria cometendo a primeira infração que citei.

Desde que fui demitida, venho tentando economizar o dinheiro da conta, mas preciso me alimentar durante as aulas. “Os valores para necessidades imediatas (como transporte, alimentação, etc) devem ser separados das notas de maior valor.” Com um total de 15 reais na carteira e quase devendo no banco, a dica “evite levar grandes quantias em dinheiro para efetuar suas compras” não ajuda os amiguinhos com cartão de crédito pago pelos pais. 

Tudo bem, as tias dos restaurantes preferem que você pague com trocados para facilitar o troco. Realmente, aí eu tenho que concordar, porque são melhores do que os talões de cheques. Na verdade, talão de cheque, no singular, pois, segundo o panfleto, “evite trazer consigo mais de um talão de cheque.”

Sabe o que é mais estranho? O panfleto resiste bravamente à tecnologia coexistindo com o APP de segurança. A dica de procurar ajuda ligando para o Serviço de Prevenção e Proteção da Universidade ainda tá lá! Já tentou usar o celular em alguns lugares como a Rua do Matão e onde o eduroam não chega? 

Escrevo coisas óbvias entre as páginas desse diário. Uma delas é “caso seja abordado por um infrator, nunca reaja, pois ele pode estar armado e, geralmente não age sozinho.”  Nunca vi alguém cometer um assalto apenas na base do grito o crimes graves sem intimidar e render sua vítima. É um pouco inocente pensar desse jeito, sem pensar na imprevisibilidade humana.  

Apesar de não fazer parte de nenhuma atlética e não conseguir fazer alguma atividade do Cepeusp, gosto muito de esportes. Quando estou empolgada acabo comprando alguns equipamentos, como patins, raquetes, capacetes, luvas de boxe… mas nunca comprei um apito. E agora? Aqui fala que “Ao caminhar em lugar ermo,tenha consigo um apito, como aqueles dos juízes de futebol. Ele poderá ser útil para chamar a atenção, mas nunca use na presença do infrator” Ué…entramos em um paradoxo. 

Querido diário,

Por falta de espaço entre suas páginas restantes, deixo meus registros sobre as outras dicas para um próximo caderno.