Estudantes começam a se organizar contra violência na Universidade

As festas, momento de integração entre os alunos, também são apontadas por eles como o lugar com maior incidência de atos de desrespeito e violência, segundo pesquisa do Escritório USP Mulheres / Ecatlética

Mulheres, LGBTs e outras potenciais vítimas de agressão formam grupos de defesa

Por Mariah Lollato

“Eu me sinto na obrigação de estar atenta o tempo todo. No começo agora já estou no quarto ano eu tinha a impressão de que poderia relaxar mais nas festas da USP. Afinal, estava entre colegas de todos os dias e me sentia mais segura. Mas com o tempo fui caindo na real. Vigilante é um estado constante. Não só por mim ficar de olho em quem está por perto, atenta à bebida mas pelas minhas amigas. Fico sempre próxima e tento garantir que elas não estejam fazendo nada a que não tenham consentido”, diz uma aluna de graduação da USP.

Quando estava no primeiro ano, um veterano a puxou pelo braço e achou que podia beijá-la. Ela se desvencilhou e reagiu, mas a experiência a marcou e, pior, teve que continuar convivendo com o agressor na faculdade.

Segundo pesquisa nacional realizada pelo Instituto Avon com estudantes universitários, 67% das alunas relatam ter sofrido algum tipo de violência em espaços de convívio com a faculdade, 42% afirmam ter sentido medo e 36% dizem já ter deixado de realizar alguma atividade por conta disso. Somente 10% dos homens assumem ter cometido agressão. 

Lohana Thereza, a Lo, é diretora da Comissão Anti-Opressão da Ecatlética, a CAO, uma das primeiras organizações permanentes de estudantes a surgir para combater diretamente o assédio no campus central.

O grupo lida com casos como os relatados acima e está presente em todos os times. Também dão plantões nas festas. Apesar de abrangerem todos os grupos minorizados, recebem  mais relatos de mulheres e casais LGBT.

Faz sentido: a pesquisa USP Interações, realizada pelo Escritório USP Mulheres, mostra que mais de metade dos estudantes enxergam o espaço acadêmico como ambiente razoavelmente ou muito machista, racista e LGBTfóbico.

Lo diz sentir falta de respaldo profissional a respeito de como tratar os casos. Os integrantes da CAO recebem orientação de ex-membros e em workshops sobre como agir legalmente. “Mas como lidar emocional e fisicamente não temos nenhum apoio. A gente vai com o que a gente pode.”

A presença do Escritório USP Mulheres, da Comissão de Direitos Humanos da ECA e da Superintendência de Assistência Social (SAS) da USP  — órgãos responsáveis por tratar de casos assim — deixa a desejar. 

Cláudia Lago, presidente da Comissão de Direitos Humanos da ECA, afirma ter observado o interesse da instituição em se aproximar das CAOs; esse também um dos objetivos da diretora da CAO da Ecatlética. 

Madeleine Marcelino, formada em psicologia, atua no grupo de acolhimento Recanto, em festas universitárias na USP e na Federal de São Carlos. São como uma CAO com apoio financeiro. Para ela, há pouca discussão sobre violência no ambiente universitário. “Menos ainda se discute sobre a que existe em festas universitárias, que são um momento de celebração, mas também podem ser um momento de vulnerabilidade, onde ocorrem violências de diversos tipos como racismo, machismo e LGBTfobia.”