O pior sentido de “efeito retardado” do corte de bolsas

Perda de orientandos custará cada vez mais caro, acumulando problemas para o futuro

Por Marcus De Rosa

Crédito: Cecília Bastos/USP Imagem

Os cortes de bolsas Capes/CNPq não são preocupantes apenas da perspectiva dos alunos. Para todo pós-graduando que perde uma bolsa, temos um professor perdendo um orientando, além de uma pesquisa abortada. Mesmo com esse problema, coordenadores de pós da USP não veem um perigo imediato, mas o prejuízo a longo prazo será inevitável.

Um dos temores – certeza, para alguns – é a demissão e o corte de salários. Essa última alteração, um direito adquirido, seria difícil ocorrer. Isso poderia diminuir as pesquisas, cuja continuidade não depende só da Capes e do CNPq, apesar do apoio dessas instituições ser vital. A Fapesp e, em menor número, empresas, financiam a pesquisa, além de projetos tocados por conta própria, como as iniciações científicas sem fomento. Essa situação não é ideal, mas poderiam ser os meios de manter a pesquisa viva.

Professores ouvidos pela reportagem declararam que temem receber menos por não estarem orientando, passando a ganhar somente pelas outras atividades, como aulas na graduação, atendimento a alunos e atuação em projetos de extensão, além das horas de pesquisa. Até agora, o cancelamento de pesquisas não afetou o valor dos salários.

Mas são os danos a longo prazo que preocupam. A universidade está tentando correr de muletas. A pesquisa e pós-graduação são elementos essenciais para manter a universidade atualizada no cenário científico. O preço da publicação de um artigo pode chegar a 8 mil reais. Com o financiamento de pesquisa prejudicado, a USP se atrasa, por exemplo, a cada artigo que deixa de ser publicado.

O mercado está se mostrando uma área muito mais promissora do que a academia. Com salários iniciais baixos para o cargo de professor, e a alta frequência de aposentadorias, a USP corre o risco de não ficar apenas sem novos pesquisadores, mas também sem quem oriente aqueles que decidirem seguir a área. 

É um erro pensar que só a universidade perde com isso. A pesquisa científica é o maior meio que a academia tem para retribuir com seu conhecimento à população. Com a falta de financiamento, quem acaba pagando a conta da falta de pesquisa é a própria sociedade.