Cara gente branca,

esse não é o começo do programa de rádio de uma série norte-americana, até porque você está lendo, mas poderia ser. Quando você se descobriu negra? Como é ser negra na USP? Já sofreu preconceitos pelo seu tom de pele? São coisas frequentemente questionadas a um preto que estuda na Universidade de São Paulo. A resposta? Eu não sei.

Isso mesmo, você não leu errado: eu não sei. Posso te devolver com outras perguntas já que a primeira resposta foi difícil de engolir. Quando você se descobriu branca? Eu sou, de fato, negra? Gosta de reviver momentos dolorosos, então, por que a pergunta? 

Mais complicado ainda engolir a outra resposta? Eu sei, também é difícil engolir suas perguntas. Eu sei que nem sempre é por maldade, mas, como diria minha queridíssima mãe, de boas intenções o inferno está cheio e suas palavras são sim capazes de gerar feridas.

Acompanhe minha linha de raciocínio: eu sou uma aluna da USP. Ponto. É isso mesmo, não tem nada além disso. Não fui criada como uma pessoa negra, fui criada como uma pessoa e gostaria de continuar sendo tratada assim ao me mudar de cidade. 

Não é que eu esteja invalidando as discussões do movimento, muito pelo contrário, sempre estou por aí conversando sobre. Mas vai além disso, sabe? Por exemplo, a minha maior descendência, pasmem, é indígena. Na minha cidade eu sou só mais uma pessoa, sem distinções de cor, olha como a capital super evoluída tem que aprender com o interior. 

Cara gente branca, quando digo que não sei responder às suas perguntas, de fato, eu não sei. Talvez só seja desligada o suficiente para não perceber pequenas coisas, talvez só esteja cansada de em cada local ser considerada de uma cor, talvez só não deseje ser sua wikinegra. 

Pessoas negras NÃO TÊM nenhuma obrigação de falar sobre o racismo ou sobre negritude. Óbvio? Um óbvio que sinto que ainda precisa ser dito. Acontece de só se saturar de tanto falar e repetir o mesmo assunto e, cara gente negra, tá tudo bem se isso acontecer com você.

Por outro lado, cara gente branca, antes de repetir perguntas óbvias sobre o assunto leia, pesquise, assista. Não cobre que os negros à sua volta te expliquem o que é racismo ou se o que você disse foi racista, dá um Google que você vai achar não só uma, mas várias respostas. 

Cara gente branca, estamos no mês da consciência negra, pesquise para despertar a sua ou entender mais do assunto, não desgaste ainda mais o coleguinha. Esse não é o fim do programa de rádio de uma série norte-americana, até porque você está lendo, mas poderia ser.

Por Thaislane Xavier