Eliezer: surdo, mas jamais mudo

Comunicativo funcionário da cantina da ECA não tem barreiras para estabelecer contatos

Por Giovanna Stael

Eliezer apresenta enorme carisma no lugar onde trabalha há 3 anos. Foto: Beatriz Crivelari/ Jornal do Campus

Passando pelo Prédio Central – obrigatoriamente, por causa das grades – chega-se a Vivência Vladimir Herzog, localizada na Prainha da ECA. Lá, o prédio grafitado por artistas e estudantes abriga o restaurante Dona Leoa, das sócias Monyca Feola e Maria Helena Alves, ou simplesmente Lena – foi assim que ela se apresentou quando pedi sua ajuda para me comunicar com seu Eliezer, funcionário do local há 3 anos. 

Já nos conhecíamos, mas só de vista; ele sempre respondeu o “bom dia” com um sorriso animado. Único surdo numa família de nove irmãos, Eliezer Lima da Silva esboça uma tentativa de fala, mas te juro que não precisa. A feição, olhos brilhantes, sorrisão e um costumeiro “jóia” com as mãos dão conta do recado.

“51. Igual a cachaça.” Foi isso que Eliezer me respondeu, gesticulando com as mãos – fazendo cinco, um, e o gesto de virar um copo -, quando perguntei sua idade. Perto do horário de almoço, conversamos próximos à cozinha do restaurante, onde ele contou um pouco de tudo que gosta: comer feijoada, tomar caipirinha, viajar, beber cerveja, fazer churrasco, ir pra praia, andar de bicicleta, e claro, torcer pelo Corinthians. Até samba ele dança, sentindo a vibração do ritmo no peito. Lena completa: ele só não gosta de ficar parado. 

Para Lena, Eliezer é Bode. Por causa da barbinha no queixo, é assim que ela o chama há 10 anos, quando se conheceram no Pastoral de Nossa Senhora Aparecida de Moema. Trocando brincadeiras ao longo da entrevista – foi Lena quem tornou essa comunicação possível, me incluindo em meio a conversa dos dois -, os velhos amigos trocavam apelidos. Para Eliezer, Lena é, também, Leoa, por causa dos cabelos vermelhos.                       

A ideia de trazê-lo para o restaurante veio da filha de dona Monyca, e ele logo se adaptou. A cada minuto, num canto diferente, ele passa o dia pra lá e pra cá, fazendo o que precisar, conhecido e querido por funcionários e estudantes. “A comunicação é fácil porque ele é muito simpático e brincalhão, muito comunicativo”, explica Lena. Diretamente da Vila Nova Cachoeirinha, Eliezer faz leitura labial e se utiliza de Libras também, mas não precisa de muito mais que seu clássico “joia” acompanhado do sorriso largo para comunicar toda sua simpatia.