Em poucos metros quadrados, a rica produção cultural da USP

Eventos artísticos são frequentes e organizados tanto pelos alunos quanto pela universidade

Por Lígia de Castro

Ramón Lemos, palhaço que realizou uma oficina no Festival Vórtex, organizado pela ECA Júnior. Foto: Lígia de Castro/ Jornal do Campus

A agenda lotada de apenas um dia

Era uma sexta-feira, 25 de outubro, e o dia começou cedinho na USP. Entre as tantas aulas acontecendo pela universidade, estava eu em uma sala do departamento de Artes Plásticas da ECA, enquanto uma artista chamada Lucia Mindlin Loeb mostrava várias de suas obras para nós, alunos. Ela expunha de forma prática um conceito que vínhamos aprendendo ao longo do semestre todo: o de “livro de artista”.

Esse foi apenas um dos muitos eventos culturais que aconteceram nesse mesmo dia, organizados por membros da universidade. Duas orquestras da USP ainda tocaram dentro e fora do campus central, e o Festival Vórtex, de grande porte, tomou lugar na ECA. Institucionais ou não, produções culturais como essas são tão ricas quanto presentes por aqui, e nessa matéria tentei cobrir apenas algumas dessas tantas possibilidades – começando pelo instituto de Artes da USP, na ECA.

Os eventos de alunos e professores

A pauta começou a ser construída, porque fiquei sabendo de um tal “Festival Vórtex”, com peças de divulgação de diagramação bonita e tema interessante, “faces do humor”, que aconteceria no dia 25 de outubro na USP. Vi cartazes colados por toda parte. Soube que era organizado pela Agência de Comunicações ECA Jr. e envolvia diversos tipos de patrocínio e de atividades: desde uma “Oficina do Riso”, com um palhaço, até palestras sobre “A naturalização de estereótipos ruins pelo humor”, com presença da Globosat.

Curiosa, fui atrás e descobri que o ingresso era 15 reais, e o evento aconteceria durante a tarde inteira daquela sexta-feira. Ele foi de fato inteiramente organizado pelos alunos da universidade – mais especificamente dos cursos de Publicidade e Propaganda, Turismo e Relações Públicas. O nome “vórtex”, na verdade, não nasceu em 2019: trata-se de um festival que acontece todos os anos com temas relacionados à cultura, sempre organizado pela ECA Jr.

Um outro evento bastante parecido aconteceu pelo CRP nos dias 7 e 8 de novembro, chamado TriRevirada Cultural. Mas o conceito era um pouco diferente: as atividades artísticas e as palestras ocupariam um dia todo (desde às 16h do dia 7 até às 16h do dia 8). Seriam “24 horas de balbúrdia”, como o próprio nome do evento ironizava. Dessa vez, a entrada era gratuita e até algodão doce e pipoca eram distribuídos para quem aparecesse.

As atividades eram bastante distintas: ouvi uma palestra sobre Turismo Acessível (com o Secretário Municipal de Turismo da cidade de Socorro), enquanto acontecia uma outra palestra sobre Interseccionalidade. Mais tarde fui a uma Oficina de Origami. À meia noite passaram filmes ao ar livre, e no dia seguinte uma alegre e descontraída Oficina de Cerâmica sujou minhas mãos de barro. Tudo isso completamente aberto a quem se interessasse, de dentro ou de fora da USP.

A Revirada Cultural surgiu em 2016, nas comemorações dos 50 anos do CRP e da ECA. “Um grupo de professores e funcionários, em um encontro fora do horário de expediente, tiveram a ideia de um evento que ocupasse o espaço físico e simbólico do departamento por 24 horas, com atividades culturais, acadêmicas e lúdicas”, explica Sushila Claro, funcionária, ex-aluna e aluna do CRP. 

As novas edições procuram engajar os próprios alunos através de disciplinas específicas (nesse ano, a do professor Dorinho Bastos). Sushila diz que o maior público foi o de 2017 (2000 pessoas no rotativo), e que esse ano tiveram pouco mais de 1000: “a dificuldade com as verbas e apoio, em face dos pesados ataques à Universidade pública, podem ter influenciado, já que não conseguimos fazer a mesma divulgação do evento que em 2017”. 

Os eventos institucionais

Ainda no dia 25 de outubro, quando fiz a maior das maratonas para esta reportagem, duas orquestras uspianas se apresentaram gratuitamente em São Paulo. Uma delas, a Orquestra Sinfônica da USP (OSUSP), esteve bem perto de quem estuda no campus central, às 12h30, na Biblioteca Brasiliana. Seu Quinteto de Cordas interpretou Mozart, Tom Jobim e Chico Buarque, e só não pude comparecer porque estava cobrindo um evento diferente.

À noite, às 21h, foi a vez da Orquestra de Câmara da ECA (OCAM), agora no Auditório Ibirapuera. Cheguei por ali subindo pelas formas irregulares vermelhas de Oscar Niemeyer, até avistar uma plateia relativamente vazia, se pensarmos que a noite era uma sexta-feira, e de apresentação gratuita.

O concerto estava para começar, as luzes apagadas. Sentei-me em um canto e olhei para os lados percebendo quem era aquele público. Percebi a presença de idosos, de adultos, e de poucos adolescentes (ou jovens-adultos) como eu. Poucos alunos da USP.

Os convidados da vez eram Clarice Assad e Gianluca Littera. Clarice é carioca, cantora e pianista, e esteve soltando sua voz e brincando com a plateia para que essa soltasse a sua também. Gianluca Littera, por outro lado, é romano, e contorcia todo o corpo conforme melodiava na gaita, com músicas que iam de trilhas sonoras de filmes famosos (como Cinema Paradiso, de Ennio Morricone), a melodias de Milton Nascimento. Todas de arrepiar cada fio de cabelo. A orquestra regida por Gil Jardim é composta por alunos do próprio Departamento de Música da ECA, indicados a cada ano.

Para quem não tem muito contato com músicas eruditas, foi um espaço interessante para conhecer uma orquestra. Justamente porque suas músicas e a forma como os artistas interagiam com o público tinha algo de muito leve, e mais popular do que apresentações mais rotineiras.

Como, por exemplo, a do dia 6 de novembro, na Biblioteca Brasiliana. Esse evento fez parte da Série Internacional de Música USP, promovida pela ECA com apresentações gratuitas de artistas brasileiros em parceria com convidados internacionais. Naquele dia quente, quem tocou foi o Conjunto de Música Antiga da USP, com a presença do violinista argentino Manfredo Kraemer.

Dessa vez, as músicas eram mais eruditas (e talvez por isso um pouco menos acessíveis): o programa citava Antonio Vivaldi, Philipp Rittler e Georg Telemann. Todos eles compuseram no período musical barroco (1600 até 1740). Foram tocados por 8 violinos, 2 violas, 2 violoncelos, 1 violone e 1 cravo. Seu conjunto de sons era como voltar no tempo, e sua dinâmica era impecável. Ouvir o som do cravo (um instrumento de corda que originou o piano), ao vivo, foi uma experiência incrível.

E nossos pequenos fones de ouvido nunca irão superar a sensação de ouvir os instrumentos vibrando naquela sala cheia de sol.