Um acervo com destino incerto

Mais de 2900 exemplares, incluindo xilogravuras, podem ser retirados do acervo da USP

Por João Pedro Malar

Parte do acervo, mapa de 1787 (detalhe) encontra-se disponível em site. Foto: Biblioteca Digital USP

O Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) não é uma típica unidade da USP, pelo menos não como os estudantes imaginam. Não possuI curso específico, apenas disciplinas optativas oferecidas semestralmente. Dedica-se à pesquisa a partir de um grande acervo de mapas, gravuras, xilogravuras, cordéis e outras produções. Mas uma parte dessa ampla coleção corre risco de deixar o Instituto.

O acervo tem 91 fundos e coleções destinados a pesquisas e exposições, uma parte composta por peças originalmente pertencentes ao Banco Santos. O banco de Edemar Cid Ferreira faliu em 2005 e até hoje responde a processos dos afetados pelo fim da instituição, que gerou um rombo de R$ 3,2 bilhões. 

Edemar, condenado a 21 anos de prisão por crimes como lavagem de dinheiro e contra o sistema financeiro, era conhecido pela sua extensa coleção de arte, confiscada pela Justiça Federal – houve determinação judicial para que parte ficasse sob custódia da USP, para conservação e acesso ao público, sob responsabilidade do IEB e do Museu de Arte Contemporânea (MAC).

O risco

Os afetados pela falência do Banco Santos são os chamados credores. Uma das formas encontradas para garantir o ressarcimento financeiro é o leilão das posses do ex-dono, atualmente em liberdade provisória. Após duas tentativas, sua mansão foi vendida por nove milhões de reais. 

Para continuar pagando quem foi lesado, os acervos do banqueiro destinados a sete museus passaram a ter destino incerto. As obras que estavam no MAC foram recolhidas e serão vendidas em leilões. 

Diana Gonçalves Vidal, diretora do IEB, prevê que “em breve o instituto seja procurado pela Justiça Federal” e que “há grande probabilidade de que o acervo seja retirado do IEB para pagamento dos credores da massa falida do Banco Santos”. 

A perda não representaria apenas prejuízo financeiro para a Universidade, que não receberia nenhum tipo de compensação pelos gastos ligados aos acervos. Acima de tudo, a perda é intelectual, e afetaria de forma profunda as pesquisas acadêmicas e a facilitação do acesso do público a um amplo acervo. Ou seja, ainda teremos novos capítulos da novela do Banco Santos.

Os custos 

Vidal destaca que a USP arca com todos os custos associados ao acervo, envolvendo “controle de temperatura e umidade em reservas aclimatadas especialmente para este tipo de suporte; funcionários especializados na conservação e restauro das peças do acervo, bem como em sua descrição, processamento, digitalização e pesquisa; compra de mobiliário e material para acondicionamento específico para a guarda apropriada dos suportes”. Além disso, nesses 13 anos o IEB mudou de local, e a transferência do acervo também foi custeada pela USP.

A contrapartida dessa manutenção são as pesquisas desenvolvidas na graduação e na pós-graduação tendo o acervo como referência. São mais de 1700 exemplares de literatura de cordel, 850 xilogravuras, 3400 matrizes de xilogravura e 390 mapas dos séculos 16 ao 19. Todo esse material tem o que Vidal chama de “inestimável valor acadêmico”.  

Para tentar mitigar as possíveis perdas, o Laboratório de Estudos de Cartografia Histórica (Lech), coordenado pela professora Iris Kantor, vem digitalizando os mapas do acervo e disponibilizando-os no site www.cartografiahistorica.usp.br/.