Crescem busca por terapia e número de projetos envolvendo o tema

O aumento é causado pela pandemia cujos medos e incertezas promoveram um maior debate sobre saúde mental

Por Maria Laura López

Com o isolamento social, a terapia também precisou se adaptar do divã para o celular. São Paulo/SP – Brasil, 09/07/2020 – Foto: Maria Laura López/Jornal do Campus

O interesse por atendimento psicológico no Brasil não costuma seguir um padrão. De acordo com o Google Trends, quando olhamos para os últimos cinco anos, o pico de popularidade na pesquisa desse assunto aconteceu na semana de 8 a 14 de setembro de 2019 — possivelmente por influência da campanha do Setembro Amarelo. Mas, só nos seis primeiros meses deste ano, a média de 2020 já é três vezes maior que a de 2015 .

Na semana de 29 de março a 4 de abril de 2020, quando a maioria dos estados brasileiros já havia decretado quarentena, a busca por atendimento psicológico no Google chegou a 88%. A pesquisa por esse serviço on-line foi de 41%, enquanto na semana de maior popularidade do assunto, em 2019, a procura era de apenas 11%. Segundo o psicólogo e pós-doutorando da Faculdade de Medicina da USP, Daniel Fatori, tem duas questões que podem estar mexendo mais com as pessoas atualmente. “O fator do medo, tanto de pegar a Covid-19 quanto de que algum parente fique doente, e a própria questão do distanciamento social, para aquela parcela da população que realmente está aderindo.”

Gráfico: Pedro Teixeira/Jornal do Campus

Com quase um mês de isolamento mais rígido, de 19 a 25 de abril, a busca pelo termo atendimento psicológico foi de 84%, enquanto a do on-line ficou em 33%. Depois de dois meses de quarentena, de 24 a 30 de maio, esses números eram respectivamente 76% e 50%. “Nesse momento de incertezas e de ter que ficar longe de quem você gosta em muitos casos, o atendimento psicológico pode ajudar muito”, afirma Fatori. Segundo ele, o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas está oferecendo uma espécie de plantão psicológico para atender, em especial, os profissionais de saúde. E ele mesmo está participando como voluntário de um outro projeto da Faculdade de Medicina da USP, voltado para o atendimento dos alunos de pós-graduação. 

Gráfico: Pedro Teixeira/Jornal do Campus

“Apesar desse atendimento ser feito de maneira mais pontual, sem um acompanhamento constante, a gente percebe que isso tem um impacto positivo nas pessoas”, afirma Fatori. De acordo com ele, esses momentos às vezes são os únicos em que as pessoas têm alguém com quem conversar e desabafar. A importância desse tipo de serviço fica visível quando se pensa na falta de precedência da pandemia, que impede uma noção prévia de suas consequências nas pessoas. “Desde que essa situação se instaurou, têm-se estudado mais sobre a saúde mental dos profissionais de saúde, e bem pouco sobre como outros grupos são afetados”, diz o psicólogo.

Pensando nisso, ele e outros pesquisadores se juntaram a Guilherme Polanczyk, coordenador do estudo Jovens na Pandemia, que busca entender o comportamento da saúde mental de crianças e adolescentes frente à pandemia da Covid-19. “É uma pesquisa que os pais respondem via internet, com questionários em uma plataforma própria que tem algumas escalas para avaliar essas questões de comportamento e emoções”, explica Fatori. Segundo ele, o estudo quer entender aspectos das crianças e adolescentes frente ao ambiente familiar e aos pais durante a quarentena, para aqueles que aderiram.

A pesquisa trabalha com a faixa etária de 5 a 17 anos e já contou com a participação de cerca de três mil pessoas em 27 estados do país. Um dado preliminar divulgado pela rede social do projeto é de que 87% das crianças e adolescentes têm usado eletrônicos por mais tempo do que antes da quarentena. “Em termos de hipótese a gente imagina que vai encontrar um impacto significativo do distanciamento social e/ou da pandemia na saúde mental das crianças, mas o tamanho real desse impacto não dá para saber ainda. A pesquisa está rodando tem menos de um mês”, afirma Fatori.

Os interessados em participar do estudo podem entrar no site do projeto Jovens na Pandemia e acessar o link para os formulários, os únicos pré-requisitos são ter filhos dentro da faixa-etária e disponibilidade para responder. “É uma pesquisa geral mesmo, e o que a gente está oferecendo para todo mundo que entra é receber um feedback para ter uma noção da parte de saúde mental do filho”, conta Fatori sobre esse estudo que, no futuro, poderá ajudar a entender melhor esse período na vida dos jovens. 

Psicólogos on-line

Para quem busca apoio agora, algumas alternativas estão sendo oferecidas pelo Instituto de Psicologia da USP (Ipusp). São três modalidades diferentes de atendimento que são feitas via internet e servem desde a comunidade USP até as pessoas em geral. Além de um quarto projeto que tem como objetivo oferecer ferramentas que ajudem psicólogos hospitalares em atendimentos durante a pandemia. Um modelo desse serviço já era prestado pelo Centro Escola do Instituto de Psicologia (Ceip) de forma gratuita antes da quarentena, mas agora a iniciativa teve que se adaptar.

“A gente tinha um time de plantonistas e supervisores que ficavam disponíveis toda terça-feira no final da tarde e era aberto para qualquer pessoa”, conta Lucas Weguelin, um dos estudantes de psicologia que eram voluntários nesse plantão. Segundo ele, esses encontros eram únicos, “se a pessoa voltasse, ela provavelmente não seria atendida pelo mesmo voluntário”, diz ele. Até existia um projeto de acompanhamento psicológico mais contínuo, mas por ser gratuito e aberto a fila de espera era muito longa. 

Os atendimentos feitos on-line seguem pontuais, e agora estão divididos em setores para atender alguns grupos de forma mais específica, como os profissionais de saúde. “O que mudou é que quem está atendendo mesmo são psicólogos já formados, porque o Conselho Federal de Psicologia recomenda que alunos não atendam pela internet”, afirma Weguelin. Segundo ele, o projeto que envolvia mais os estudantes de psicologia foi colocado em pausa para que outro fosse formulado diante de um momento como a pandemia. “A gente só acompanha algumas supervisões e algumas discussões sobre o assunto, mas sem atuar direto com o paciente mesmo.”

Esse tipo de acompanhamento tem sido muito procurado durante a quarentena e, nesse período difícil para todo mundo, pode ajudar. Conforme os dados, embora os números tenham diminuído um pouco na última semana, de 28 de junho a 4 de julho, sendo de 74% a procura pelo termo atendimento psicológico no Google e 29% a procura pelo serviço on-line, o interesse ainda é muito grande. Iniciativas como a do Ipusp, e o estudo Jovens na Pandemia são formas gratuitas de entender um pouco melhor esse período.

Maicon Douglas Gomes é artista plástico, oficineiro e tatuador, seus trabalhos têm como temática principal a biodiversidade e a cultura capixaba. Com a pandemia ele teve que se conectar com a natureza de outras formas, e cuidar das plantas de sua casa é uma delas. “Tem um cantinho verde aqui, e é o lugar onde mais gostamos de ficar”, conta ele. Sua relação com terapia vem do curso de Arteterapia e reaprendizagem emocional. São Paulo/SP – Brasil, 06/07/2020 – Foto: Maria Laura López/Jornal do Campus

Tainah Ramos é estudante de Jornalismo na ECA e estagiária da Agência Pública. No tempo livre ela vê série, lê ou toca o ukulele que começou a aprender agora. O que ela queria fazer mesmo era dançar o reggaeton, mas uma lesão no joelho ainda não deixa, então só escuta mesmo. “Tenho diversificado bastante minhas atividades para me distrair”, diz ela. Tainah faz terapia desde 2019, mas a pandemia fez com que sua ansiedade aumentasse muito. Agora ela toma remédio e se sente bem melhor. São Paulo/SP – Brasil, 03/07/2020 – Foto: Maria Laura López/Jornal do Campus

Breno Queiroz também é estudante de Jornalismo da ECA e estagia na InvestNews. No início da quarentena ele se mudou para a casa da namorada, onde está até hoje. Na maior parte do tempo em que não está trabalhando Breno passa assistindo séries e filmes ou jogando Civilization, um jogo de estratégia. “É um jogo bem longo, bom para passar o tempo”, conta. Ele tinha acabado de começar a terapia com um novo psicólogo e o assunto atendimento já teve que ser on-line por causa da pandemia. São Paulo/SP – Brasil, 07/07/2020 – Foto: Maria Laura López/Jornal do Campus

Isabela Guasco é formada em Relações Públicas e trabalha no Teatro Municipal de São Paulo. A pandemia a sobrecarregou um pouco no trabalho, e a saudade de sair e ver os amigos também pesa de vez em quando. Mas, o cantinho na janela do quarto é seu refúgio disso tudo. “Eu sempre acendo um incenso, às vezes tomo um chá, como um bolinho e fico ali vendo Bethânia”, diz ela. Bethânia é a árvore na calçada em frente à janela de Isabela. Há pouco menos de um ano ela começou na terapia on-line, sem precisar se adaptar por causa do isolamento social. São Paulo/SP – Brasil, 08/07/2020 – Foto: Maria Laura López/Jornal do Campus