Final de Jogo em 2020

Por Karina Merli

O avanço do novo coronavírus fez muitas atléticas refletirem sobre o seu papel social e adiarem os jogos universitários para 2021. Foto: Reprodução/Victor Silva para o Especial Covid-19

Os jogos universitários são uma das principais atrações de lazer, esporte e integração para muitos alunos. Tradicionalmente, essas competições ocorrem em feriados prolongados, nas cidades do interior, envolvendo turmas do mesmo curso, mas de instituições diferentes ou de vários cursos de uma mesma universidade. 

Neste ano, com o avanço do novo coronavírus, as atléticas precisaram adiar ou cancelar esses eventos para evitar aglomerações e, por sua vez, preservar a saúde de todos os participantes. Economíadas, Juca, Copa Inter Atlética, Internutri e Bife foram alguns dos torneios que optaram por essas medidas. 

Começa o jogo

No início do ano letivo, a chegada do novo coronavírus ao Brasil parecia ser algo pouco provável. Diante disso, o calendário esportivo da USP e das atléticas de seus cursos seguia normalmente. O Bichusp, jogos realizados para a integração dos bixos (forma como os calouros são chamados pelos veteranos) de todos os institutos da instituição teve início no dia 14 de março. 

Porém, três dias depois, as aulas na USP e na Universidade Estadual Paulista (Unesp) foram suspensas, seguindo as recomendações do Ministério da Saúde e da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Naquela altura, o Brasil somava 291 casos de infecção por Covid-19 e registrava a sua primeira vítima fatal, na capital paulista. Era inimaginável o cenário atual, mas as atléticas começariam ali a repensar seus processos. 

Diante disso, a alternativa foi adotar treinos on-line. Na Associação Atlética Acadêmica XXXI de Agosto – Nutrição e Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP), de acordo com o vice-presidente e estudante de Nutrição, Victor Kenji Cordeiro Sueyoshi, para manter os atletas em forma, “metade do tempo é de exercícios físicos e coordenativos, enquanto a outra é de treino tático, analisando jogos e jogadas.” 

Para o aluno de nutrição, no momento, o foco está em ajudar os que precisam e nas aulas on-line. GIF: Victor Kenji Cordeiro Sueyoshi/JC

Pré-temporada

As atléticas dedicam um ano inteiro para vivenciar a experiência dos jogos universitários, com o máximo de membros possível. Na Atlética XXXI de Agosto, o planejamento anual é baseado em muito treino, formas de arrecadar dinheiro para abater as despesas que os atletas terão e nos itens que irão compor os kits dos torneios. Na ECAtlética, entidade esportiva e social da ECA-USP, também não é diferente.

“O inter [termo usado para denominar jogos universitários] é aquela coisa. Mata-mata, emoção, é sangue no olho. Os atletas esperam muito por isso, porque são quatro dias inesquecíveis”, revela, Catarina Couto, estudante de Educomunicação, nadadora da ECAtlética e representante da ECA nos Jogos Universitários de Comunicação e Artes (Juca). 

“Tem a torcida, toda a atlética se mobilizando para ir, comparecer, ajudá-los e apoiá-los o tempo todo. Esse clima favorece para que os nossos atletas se sintam, de fato, abraçados por todos nós”, complementa a estudante.

Fim de jogo?

A pandemia no país foi avançando gradualmente e, desde então, o pico da doença vem sendo adiado repetidas vezes. Hoje, de acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), a previsão é que o país alcance o pico no mês de agosto. O otimismo sobre a volta à normalidade foi começando a enfraquecer. Enquanto isso, as atléticas começaram a se questionar sobre o que fazer com os jogos universitários.

As preocupações passaram a ser relacionadas com a saúde dos que iriam e como os jogos poderiam manter a tradição de serem eventos marcados pelo agito, risadas e emoção. Como esses dois pontos, simultaneamente, eram inviáveis, o cancelamento das edições deste ano foi a melhor alternativa encontrada pelas entidades. 

De acordo com Alfred Silva de Oliveira, diretor de marketing, membro da comissão organizadora do Bife na ECAtlética e presidente da Diretoria Executiva do Bife, no caso do campeonato interno, o adiamento para o próximo ano foi consenso entre as dez atléticas participantes (ECA, Química, AAAGW, IME, Educação, VET, GEO, ICBIO, FFLCH e FAU). O mesmo ocorreu na Liga das Atléticas de Comunicações e Artes (Laaca), entidade responsável pela realização do Juca.

Apesar da saudade, Alfred acredita que, cancelar o Bife deste ano, foi a melhor decisão a se tomar. GIF: Alfred Silva de Oliveira/JC

“É uma decisão muito difícil, pois temos um apreço enorme por tudo isso, mas entendemos que no contexto atual, em que vivemos uma pandemia, não teria como realizar um evento desse porte, garantindo as condições mínimas de saúde. Acredito que não havia como ser diferente, visto tudo o que estamos passando”, complementa Alfred, que estuda Publicidade e Propaganda.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Passar as datas dos “inters” em branco não é algo fácil, como ele relata: “Sendo organizador e participante assíduo desses eventos, eu sinto uma falta enorme, mas sei que estamos fazendo isso agora para garantir que tenhamos condições de voltar com tudo lá na frente.” A saudade é um ponto em comum entre os entrevistados, mas as preocupações com a pandemia e as aulas on-line falam mais alto neste momento.

Para aqueles que não estão conseguindo lidar com a rotina sem jogos universitários, Alfred conta que diversas interações deverão ocorrer. “Para este ano, no Bife, vamos focar em trazer conteúdos e eventos on-line para movimentar o pessoal, estamos estruturando o funcionamento. Iremos aproveitar esse tempo para nos organizarmos internamente, preparando tudo com mais calma e qualidade para o segundo semestre de 2021”, revela o diretor de marketing da ECAtlética.

Os membros das atléticas afirmam que o cenário permitiu aprendizados, como a gestão em situações de crise e a entender o importante papel da responsabilidade social. “Fiquei bem feliz, na verdade, pela nossa maturidade de respeitar isso, sermos responsáveis e vestir a camisa. O principal aprendizado para nós, como organizadores desses eventos esportivos acaba sendo de que não temos controle da situação inteira e essa é a maior verdade da vida”, afirma Catarina Couto, que é conhecida como Tita.

Segue o jogo!

Enquanto não se sabe quando a epidemia do novo coronavírus acabará, as atléticas buscam alternativas para manter o caixa no azul e os seus atletas motivados. Na atlética da FSP, por exemplo, o jeito foi criar rifas e vender produtos on-line. Além disso, de acordo com o vice-presidente, uma palestra on-line está sendo organizada com o intuito de arrecadar algum dinheiro para o pagamento dos técnicos. O mesmo está sendo feito pela ECAtlética para quitar as dívidas.

“Estamos criando formas de permanecer por perto dos times, com ações, principalmente, através das nossas redes sociais e dos nossos grupos do WhatsApp. Nós promovemos alguns desafios físicos, que eles estão fazendo entre si e gerando conteúdo sobre os seus próprios esportes. Há um desdobramento nesse sentido criativo para manter a união”, afirma Tita.

O contato entre as entidades também continua, mas por WhatsApp. De acordo com Victor Kenji, “a Liga Atlética Acadêmica da USP (Laausp) faz reuniões mensais para discutirmos as mudanças no formato de campeonato e possíveis datas para retomarmos as atividades esportivas”.

As aulas presenciais na USP têm previsão de volta em meados de 2021, no entanto, isso não quer dizer necessariamente na volta dos torneios. Para todos os entrevistados desta reportagem, o cenário ideal para a retomada seria com uma vacina consolidada, com abraços, risos, choro e o tal sangue no olho.

As incertezas, porém, não impedem de se criar grandes expectativas sobre os jogos pós-pandemia. “Para a próxima edição, sei que o público vai estar sedento pelo Bife e, com certeza, faremos de tudo para que, dentro das condições de saúde e segurança adequadas, o XXI Bife seja incrível”, diz o presidente do Bife. Já Catarina, torce para que a ECA seja a vencedora do Juca e que os atleticanos “aproveitem as pequenas coisas”, das quais estão sentindo tanta falta.