Ombudswoman: Na pandemia, tudo muda muito rápido

Marina Amaral

Ombudswoman

Agradeço o convite e as boas vindas que vieram na edição passada – além do generoso perfil. Espero corresponder trazendo críticas, às vezes exigentes, mas sempre construtivas porque o mundo não está brincadeira e cobrir o que está acontecendo nessa pandemia no Brasil, em um momento em que a informação se prova crucial, é um grande desafio também para um jornal de estudantes. Nos veículos profissionais como a Agência Pública, onde trabalho, o volume de trabalho é cada vez maior. Tivemos que aumentar a produção sem perder a profundidade. E ganhar muita agilidade, o que vale para vocês, do JC, pensarem nas próximas edições.
Repararam como envelheceu rápido a edição de março? O coronavírus estava presente, desde a capa, mas ainda assim em um proporção bem menor do que imagino que será nessa próxima. Em um lugar tão rico em ideias, como a Universidade de São Paulo, vocês estão em posição privilegiada para discutir ciência – como fizeram bem nessa edição de março. Mas tudo é muito perecível e é preciso tomar cuidado para
evitar matérias com viés maior de opinião ou análise.

Falo da reportagem“Por que damos tanta atenção ao coronavírus”, que desde o título mostra que certamente não seria escrita hoje (07/07) quando o país tem 65 mil pessoas mortas pela doença. Avaliar é  sempre um risco, principalmente quando se está no início de um problema e você não pode seguir cobrindo o tema para atualizá-lo. Não resolve consultar as fontes quando suas perguntas estão direcionadas em uma intenção, no caso: a de “desmitificar” o coronavírus, que estaria sendo excessivamente coberto pela imprensa, o que se mostrou um erro pela proporção que a pandemia tomou.

Gostei da escolha de Ester Sabino para a entrevista mas acho que vocês tem muito mais a extrair desse negacionismo da ciência e da perseguição às universidades movidas pelo governo Bolsonaro que agora mostram todo o seu peso, não apenas pela destruição de boa parte da pesquisa nacional, mas também pelo que podemos esperar da educação no país, alquebrada pela pandemia e por ministros incompetentes e despreparados que se sucedem no MEC. Fontes, certamente, não faltam.

As duas matérias sobre universidade, que infelizmente pereceram rápido, mostram que o JC pode fazer um bom jornalismo investigativo sobre o que está acontecendo com o ensino superior reduzido ao online, para além da USP, com a pesquisa no país e a autonomia das universidades. Como eu costumava dizer à turma anterior, o Jornal do Campus, pode ter como horizonte a universidade, a ciência e a realidade brasileira. Não precisa se restringir ao campus concreto. Até porque muitos dos que trabalham na USP formulam políticas públicas que interessam a todos os cidadãos.

Um último comentário: a capa. Gostei muito quando vi, porque pensei que haveria uma reportagem com jovens e idosos na pandemia, “Faces do coronavírus no Brasil”. Mas a foto da professora Ester Sabino está ao lado de um jovem que não consegui descobrir quem é. Ficou poética talvez, mas trouxe uma falsa impressão o que, na minha opinião, não é eticamente aceitável.

Mas vamos em frente moçada, porque nunca foi tão interessante ser jornalista. E essa edição mostrou que vocês têm um grande potencial. É sacudir a poeira do “já sei” antes de ir atrás das fontes, lembrar que o mundo gira rápido, e aproveitar da melhor maneira esse espaço maravilhoso que vocês têm. Mais reportagem e menos palpite. Saudações!