Ombudsman: Bom jornalismo, hoje, é só o começo da história

 

por Rodrigo Ratier

“FHC e Lula empatam na USP”, “Liminar garante inscrição de carentes na Fuvest”, “Alunos não conhecem preço Coseas”. Vistas com 22 anos de distância, as manchetes que o Jornal do Campus estampava entre agosto e novembro de 1998 são o retrato de um mundo que ficou para trás. Quando ajudei a escrever os títulos que abrem este texto, o jornalismo também era outro: não havia redes sociais, não existiam smartfones, a internet era pouco mais que uma coisa lenta cuja conexão gerava barulho irritante. Também não se ouvia falar de fake news nem de tentativas deliberadas de minar a credibilidade jornalística – se havia, certamente não eram um problema social de grandes dimensões como hoje.

Mas nem tudo mudou. O JC, acredito, continua sendo um divisor de águas no curso de jornalismo da ECA. Uma espécie de ponto alto, um antes-e-depois, um momento de intenso amadurecimento no contato com a prática jornalística de verdade: jornal-laboratório é, e deve sempre ser, jornalismo para valer. Também sou capaz de apostar que a relação nem sempre harmônica com o Jornal da USP e a própria USP é muito pedagógica sobre a vocação da publicação: retratar o que acontece nos campi da maior universidade do Brasil, com especial atenção à função jornalística de watchdog, a vigilância criteriosa sobre o poder.

O bom jornalismo também não mudou, e se eu puder dar um conselho sobre quais atributos priorizar, eu elegeria a pluralidade e a precisão. Mais do que nunca, precisamos construir relatos da realidade que sejam complexos e acurados. O que mudou é que fazer bom jornalismo é só o começo da história. Hoje é preciso cuidar para que a notícia encontre seu público, ouvi-lo e abrir canais de diálogo civilizados e serenos.

Acima de tudo, é preciso levar a audiência a ver valor naquilo que produzimos. Como ajudar as pessoas a distinguir o jornalismo legítimo e profissional – aquele feito com apuração consistente, que lança mão dos melhores recursos estilísticos em sua redação, que edita de maneira justa e equilibrada – da produção de conteúdo hiperpartidário ou abertamente mentiroso? Complicando um pouco mais, como será fazer tudo isso em meio à maior pandemia dos últimos 100 anos? Para mim, será uma honra navegar com a turma de colegas de profissão que se propõe a enfrentar, aqui e agora, esses enormes desafios.

Rodrigo Ratier é autor do blog Em Desconstrução ,  coordenador do blog coletivo Entendendo Bolsonaro, fundador do curso online contra fake news Vaza, Falsiane e professor de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero (SP).  

Foto: Arquivo Pessoal