Entidades de cultura da USP apostam nas redes sociais para manter programação

Transmissões ao vivo no YouTube, postagens no Instagram e até podcasts passam a integrar a agenda de órgãos que expandiram o público durante a quarentena

 

por Isabel Teles

Diferentes telas exibem conteúdo dos centros de cultura da USP. Foto: Beatriz Azevedo

 

Enquanto o país discute a retomada das atividades de comércio e serviços – depois de meses de quarentena provocada pela pandemia do novo coronavírus –, um setor permanece sem expectativas de retorno à normalidade. Com a impossibilidade de promover apresentações com público, a cultura se transformou. E na USP não é diferente. 

Se antes o público das exposições, concertos e espetáculos promovidos pelos centros culturais da Universidade era predominantemente a comunidade uspiana, agora, há espectadores de todo o país. A ampliação do alcance, percebida principalmente pelo aumento de seguidores nas redes sociais, foi perceptível durante a quarentena. 

“Temos um número muito expressivo de interações e de alcance das nossas publicações, tanto no Instagram quanto no YouTube e Facebook. Sempre que postamos, ganhamos novos seguidores”, conta Roberto de Freitas Soares, estudante de Audiovisual na ECA e bolsista PUB, no Cinusp Paulo Emílio.  

Entre as adaptações para o contexto de isolamento, o cinema, que costumava ter um intenso calendário de mostras temáticas, passou a exibir sessões virtuais, webinários e até um podcast, o Cinusp em Casa. Como o nome indica, a proposta do projeto é ampliar a discussão sobre filmes para o público que está em casa, com episódios disponibilizados gratuitamente no YouTube.

Redes sociais que serviam para divulgar a programação passaram a ser uma importante ferramenta de aproximação entre quem consome e quem produz arte. Segundo a Professora Ana Magalhães, curadora e diretora do Museu de Arte Contemporânea da USP, o MAC, antes da pandemia, esse recurso era usado de forma mais  convencional. 

“O fato de termos criado uma programação, estabelecido um calendário, criando eventos, movimentou muito as redes sociais e acabamos aumentando o número de seguidores. Estamos descobrindo agora e aprendendo como se faz. Com certeza as redes sociais e o site do museu serão ferramentas muito poderosas de comunicação com o público.”

Durante a quarentena, o MAC tem usado as redes sociais para divulgar o acervo, além de promover lives com artistas e a equipe do museu, webinários e cursos, que receberam inscrições de pessoas de todo país. Para a diretora do museu, este é um ponto positivo da programação virtual, uma vez que as atividades presenciais restringiam o público à população da cidade de São Paulo e arredores.

No Instagram, o MAC-USP destaca obras de seu acervo. A foto mostra a obra “Notícias de Lugar Nenhum” (1970), de Felipe Cama. Foto: Instagram @mac_usp

 

Todos os centros culturais entrevistados pela reportagem afirmam que não houve uma demanda oficial da USP para que investissem em programação virtual, apesar de a universidade incentivar o oferecimento de conteúdo on-line. A Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU), responsável por gerenciar cursos e atividades oferecidas pela USP à comunidade, encara a digitalização como uma forma de democratizar o conteúdo artístico produzido na universidade. 

Por meio de um perfil no Instagram (@culturanausp), a PRCEU passou a divulgar a programação oferecida durante a quarentena. Segundo Michel Sitnik, analista de comunicação do órgão, “a ideia é ter como principais critérios a divulgação de eventos que sejam on-line, gratuitos ou de baixo custo, e de interesse amplo, com viés cultural e de prestação de serviços.” 

Sobre a migração para a programação do presencial para o virtual, há um consenso entre as instituições culturais uspianas de que, no contexto de distanciamento social, o fenômeno não poderia ser evitado.  “Foi uma percepção geral de que não teríamos os concertos ao vivo, mas ao mesmo tempo deveríamos não deixar a programação parar e abandonar nosso público”, conta Patrícia Santana, produtora da Orquestra Sinfônica da USP (Osusp).

Entre os conteúdos divulgados durante a quarentena com a #OsuspEmCasa estão lives com debates sobre temas relacionados à música e a interpretação de repertório variado que vai de Bach a Pixinguinha. Todo o material pode ser acessado no canal da orquestra no YouTube, que também reúne publicações anteriores à pandemia.

Além de migrar a programação, a Osusp enfrentou o desafio de adaptar as atividades dos membros da orquestra. Santana relata que a alteração foi sentida pelos artistas, acostumados a interagir entre si e com o público de maneira presencial, que também passaram a enfrentar limitações técnicas. 

Newton Carneiro, músico da Osusp há 35 anos, é um dos que apoia os demais com essas demandas. “Com a pandemia, a orquestra se viu obrigada a disponibilizar conteúdo on-line e, como eu desenvolvi conhecimento nessa área por ter um estúdio de gravação onde isso é comum, passei também a colaborar com esses conteúdos.” 

Para ele, a distância entre os colegas e a produção à distância das apresentações, que exige gravações separadas com equipamentos convencionais, é um novo elemento na relação entre a arte produzida pelos músicos e o ouvinte, o que impõe desafios.

Se por um lado, a dinâmica de ensaios e apresentações é mais complexa de forma remota, por outro, há vantagens para a direção. Eduardo Fernandes, músico e regente de dois grupos do Coralusp, conta que ao escutar gravações individuais dos cantores é possível apontar detalhes que ficam menos evidentes quando as vozes estão em coro. “É legal porque você pode ouvir a pessoa cantando sozinha e fazer contribuições mais efetivas, pode dar um retorno individual para as pessoas.”

Um dos projetos que busca recuperar a unidade de vozes típica do coral é a publicação de vídeos feitos a partir da montagem de apresentações individuais enviadas por cada um dos cantores. Para celebrar a independência do Brasil, o coral desenvolveu uma interpretação da música Para Todos, de Chico Buarque, que contou com a participação do compositor e da Osusp. 

No canal do coral no YouTube é possível assistir a essa e outras montagens, além de vídeos com técnicas musicais da série “Quarentécnica”, divulgados às segundas-feiras. Para encerrar a semana, o Coralusp, que segue um cronograma de postagens temáticas nas redes sociais, exibe, às sextas, o #SextandoEmCasa, vídeos de apresentações da equipe artística.

Com experiência na divulgação de conteúdo online, a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) – que disponibiliza o acervo na internet desde 2009 – dedicou seus esforços no sentido de adaptar encontros presenciais. “A pandemia nos fez concentrar ainda mais o foco nos recursos online da BBM (BBM Digital, Atlas dos viajantes, Dicionários da BBM etc.), ao mesmo tempo que buscamos trazer para a esfera virtual algumas das atividades que em situação normal ocorreriam nas instalações físicas da bBiblioteca, como cursos, palestras e workshops”, relata o curador da BBM, João Cardoso.

Reprodução de tela da plataforma BBM Digital

 

A expectativa para retomada da programação presencial ainda é incerta. Segundo o Plano USP, anunciado em 19 de agosto pela Reitoria, os centros de cultura devem voltar a operar com visitas presenciais no primeiro semestre de 2021, quando a Universidade pretende retomar a totalidade de suas atividades. 

O contato com o público é considerado fundamental para a experiência cultural plena, segundo as instituições ouvidas pela reportagem – seja na visitação presencial de um acervo, seja ao assistir a uma apresentação ao vivo. A experiência de reabertura em outros países demonstrou que é possível retomar atividades culturais adotando medidas de segurança.

Mesmo com a volta ao oferecimento convencional da programação, as instituições de cultura da USP pretendem continuar investindo no uso das redes sociais e na programação virtual. “[O on-line] é um tipo de trabalho que dá muito certo e tem uma resposta positiva do público. Nós não podemos abandonar o público digital agora”, pondera Patrícia Santana, produtora da Osusp.

 

Conheça o perfil do Instagram dos centros culturais da USP citados na reportagem.