HC investiga casos de reinfecção pelo coronavírus

Estudo é feito com participantes de diversas cidades do estado de SP e ainda não confirmou nenhum caso de reincidência

 

por Mariana Catacci

Foto: Gabriel Cillo

 

O Hospital das Clínicas (HC), da Faculdade de Medicina da USP está realizando um estudo para identificar possíveis casos de reincidência do coronavírus. A pesquisa conta com 20 pacientes de diversas cidades do estado de São Paulo que apresentam sintomas de reinfecção, mas ainda não há casos confirmados. Outras unidades e instituições estão realizando trabalhos semelhantes, como a Faculdade de Medicina da USP Ribeirão Preto e a Fiocruz.

O primeiro caso comprovado de reincidência da Covid-19 veio de Hong Kong, trata-se de um homem na casa dos 30 anos que foi infectado pela segunda vez, quatro meses e meio após o primeiro diagnóstico. 

A infectologista Silvia Costa, professora da FMUSP e coordenadora do Grupo de Infecção em pacientes imunodeprimidos do HC, explica que para confirmar que se trata, de fato, de reincidência é necessário realizar estudos laboratoriais que seguem um protocolo rígido, não bastando apenas testar positivo duas vezes. A especialista, que atua selecionando possíveis casos de reincidência no ambulatório e indicando-os para a pesquisa, afirma que o segundo teste positivo é apenas o início da suspeita de reinfecção.

Depois de o segundo exame RT-PCR — o mais indicado para o diagnóstico da Covid-19 —  apontar a presença do vírus no organismo, inicia-se o processo de sequenciamento de seu material genético. Segundo Costa, o material genético é uma espécie de “carteira de identidade do vírus”, de modo que o sequenciamento permite que ele seja identificado com precisão. Na pesquisa realizada pelo HC, é preciso que o paciente apresente pelo menos dois meses entre os episódios sintomáticos para que essa segunda etapa se inicie.

A partir do sequenciamento, é preciso eliminar algumas possibilidades: a primeira é de que o exame não tenha identificado a presença de um outro vírus que não o Sars-CoV-2. A doutora explica que até 20% das infecções são acompanhadas por outro vírus, de modo que essa possibilidade seja recorrente. A segunda, por sua vez, é de que não se trata da mesma cepa do Sars-CoV-2, e sim de um outro tipo diferente do identificado na primeira infecção. Assim, é possível saber que não é um caso apenas de presença prolongada do vírus no organismo, mas de reincidência.

O Jornal do Campus entrou em contato com um dos pacientes que participaram da pesquisa. O homem, também na faixa dos 30 anos, preferiu não se identificar. Segundo ele, os primeiros sintomas de Covid-19 surgiram em maio de forma leve e perduraram por 18 dias. Nos meses seguintes, permaneceu assintomático. No início de julho, no entanto, os sintomas retornaram com maior intensidade, e foi então que obteve o segundo resultado positivo. De acordo com a infectologista, concluiu-se por meio do sequenciamento que se tratava de um outro vírus respiratório.

O paciente relata que, no primeiro episódio, se sentiu preocupado por não saber como a doença evoluiria ao longo do tempo, mas tranquilizou-se com os sintomas amenos. No segundo episódio, por outro lado, relata que pensou que precisaria ser internado devido à febre alta e baixa saturação. “Ficava aquela dúvida, como vão ser os próximos dias? Será que vou desenvolver um caso grave?”, conta o paciente. Atualmente, ele se encontra livre de sintomas e exercendo suas atividades cotidianas normalmente.

Segundo Silvia, a possibilidade de reinfecção também afeta o futuro da vacina contra a Covid-19, visto que a duração da imunidade contra o vírus é um dos fatores a serem considerados. Em sua opinião, as chances de que a vacina seja anual ou de periodicidade ainda menor são altas, já que a reinfecção é um fenômeno comum entre vírus respiratórios.

Algumas vacinas, como a da gripe, precisam ser administradas anualmente devido ao curto período de imunização. Foto: National Cancer Institute/Unsplash

 

Ela também afirma que a reincidência afeta a ideia de uma “imunidade de rebanho”, pois essa seria apenas temporária. Por enquanto, a médica recomenda: “é preciso manter a paramentação, o distanciamento social, porque mesmo quem já teve o vírus pode não estar totalmente protegido”.