PL 529: A tesoura cega de João Doria

 

por Pedro Lobo

PL 529 – Cortes na pesquisa. Arte: Pedro Lobo/Foto: Freepik, GOVESP e Nappy

 

Digamos que as coisas apertaram. Vieram as vacas magras, sai mais dinheiro do que entra e é preciso economizar. Por onde você começa? Sim, eu te dou tempo para pensar… Talvez você comece parando de tomar café na padaria, corte a sobremesa, tome banhos mais curtos, enfim, corte os supérfluos. Simples, não? Intuitivo, ir cortando o que não faz falta. Infelizmente para nós, a PL 529 do governador João Doria (PSDB) mostra que ele ainda não aprendeu a cortar.

Desde o início da pandemia do novo coronavírus, nosso gestor tem repetido juras de amor à ciência. Clamado devoção pela pesquisa e pelo avanço científico, uma de suas bandeiras no discurso, especialmente quando no extremo oposto, o do negacionismo, está um de seus maiores inimigos políticos: o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

No entanto, as declarações românticas não foram suficientes para que mantivesse medidas mais rígidas e efetivas de isolamento social, muito menos impediram que, na primeira oportunidade, saltasse com o escudo do “ajuste fiscal e equilíbrio das contas públicas” para cortar investimento à pesquisa no estado que governa. 

Chega a ser cômico. Trajando um abadá do Instituto Butantan com uma grandíssima CoronaVac estampada no peito, objeto de grande orgulho (e palanque político) de Doria, o amado decide confiscar anualmente o saldo positivo da nossa trinca de universidades estaduais: USP, Unicamp e Unesp, além da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), através da PL. 

Só para recordar, as pesquisadoras que sequenciaram o genoma do coronavírus são não apenas da USP, mas apoiadas por bolsas da Fundação. No mês passado, a Fapesp confirmou um investimento de R$ 82,5 milhões no Instituto Butantan, para apoiar os ensaios clínicos da fase 3 da vacina. É sério que daí que nós vamos cortar? 

Nenhum desses avanços parece valer fora das entrevistas coletivas. E não me entenda mal, não estou advogando por uma universidade intocável, a USP mesmo já gastou com elefante branco e insiste em salários para aposentados acima do teto, o problema é na tesoura de Doria: quer cortar muito, mas corta mal.