Plano USP prevê retorno gradual de atividades presenciais

Após semestre adaptado pela pandemia, grupo de trabalho delimita plano de ação para a volta de atividades presenciais nos campi da USP até janeiro de 2021

 

por Marina Reis

Arte: Danilo Moliterno

 

 

Após um primeiro semestre adaptado de última hora pelas dificuldades decorrentes da pandemia do novo coronavírus, no último dia 19 de agosto o Canal USP no Youtube transmitiu a live “Os desafios para uma volta segura aos campi da Universidade”, organizada pela reitoria em união com o Jornal da USP e o grupo de trabalho de Readequação do Ano Acadêmico. O objetivo foi reunir a comunidade para a apresentação do Plano USP para o retorno gradual das atividades presenciais, possibilitando que os espectadores comentassem e tirassem dúvidas ao vivo.O grupo de trabalho responsável pela elaboração do plano foi definido a partir de decisão oficializada na Portaria GR 288, de 26 de maio de 2020, e conta com os integrantes: Gerson Tomanari, professor do Instituto de Psicologia e superintendente de assistência social da USP; Mônica Sanches Yassuda, atual Diretora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH); Edson Cezar Wendland, professor da Escola de Engenharia de São Carlos; Tarcísio Eloy Pessoa de Barros Filho, da Faculdade de Medicina; e André Lucirton Costa, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto.

O Plano

Com seu texto divulgado pela Reitoria no dia 18, o documento de 23 páginas traz considerações gerais para um progressivo retorno presencial. Suas cinco fases são baseadas no plano de flexibilização econômica do governo para o Estado de São Paulo, buscando adaptá-lo às peculiaridades da comunidade universitária a fim de proteger e preservar a saúde e a vida.

Segundo Antonio Carlos Hernandes, vice-reitor da USP, a execução do plano teve início no dia 7 de agosto, já com a maior parte do estado de São Paulo na Fase Amarela. 

A fase A, correspondente às fases vermelha e laranja do Plano SP, é de restrição máxima. Nesta fase, apenas pesquisas relacionadas à Covid-19 e outros serviços essenciais, como o de limpeza e alimentação, estão liberados. Todas as outras atividades possíveis devem ser feitas de forma remota.

A partir da fase B se inicia a flexibilização, sendo imperativo que a cidade em que se encontra cada campus antes se mantenha por pelo menos quatro semanas consecutivas na fase amarela do Plano SP, período que avalia a estabilidade dos casos da doença na região. Então, fica a cargo do diretor de cada unidade decidir liberar ou não a volta de até 30% dos funcionários técnico-administrativos. Segundo a última atualização divulgada pelo grupo de trabalho, os campi de Bauru, São Paulo, Lorena, Piracicaba, São Carlos e Pirassununga se encontram atualmente na fase B, enquanto o de Ribeirão Preto foi mantido em restrição máxima.

O Plano USP prevê ainda que, depois de quatro semanas consecutivas na fase verde do Plano SP, os campi liberados para a fase C poderão contar com a volta de até 60% dos servidores técnico-administrativos. A partir da Fase D, esse número poderá ser aumentado para até 90% de acordo com as decisões das diretorias locais.

Na última fase, intitulada Normal 2021, espera-se condições que possibilitem a retomada completa das atividades presenciais e o retorno de toda a comunidade universitária. A USP planeja, a partir de janeiro do próximo ano, conseguir a reposição de aulas de disciplinas de graduação impossibilitadas pelo ensino à distância, que será mantido até o fim de 2020, com exceção apenas para alunos participantes em atividades relacionadas às áreas de saúde humana e veterinária e integrantes de grupos de pesquisa.

O documento traz ainda maiores especificações para cada fase, como o número máximo permitido de pessoas em ambientes fechados por metro quadrado e os critérios de acesso aos diferentes ambientes dos campi como edifícios, laboratórios, bibliotecas e refeitórios.

Em caso de regressão nas fases do Plano SP, também haverá regressão no Plano USP e, mesmo nos casos em que a flexibilização é permitida, o retorno presencial é facultativo a critério dos dirigentes. Mesmo a retomada planejada para janeiro de 2021 fica sob análise, dependendo do estabelecimento de condições favoráveis em relação ao andamento da pandemia no estado até lá.

Em aberto

Apesar de ter sido pensado por um grupo de trabalho composto por integrantes de diferentes áreas e de buscar abranger as peculiaridades que englobam a comunidade universitária para propor um retorno gradual, o Plano USP deixa pontos sem esclarecimento total. Um dos potenciais problemas está no fato de que todas as fases de flexibilização dependem fundamentalmente do automonitoramento para cumprimento de protocolos de proteção e prevenção de riscos.

Estes são os mesmos já bem conhecidos por todos: higiene pessoal, distanciamento social, sanitização dos ambientes, uso obrigatório e adequado de materiais de proteção e espaços físicos e o monitoramento das condições de saúde. O problema é que, com uma comunidade de cerca de 120 mil integrantes, essas medidas sem monitoramento seguro podem resultar em novos focos de infecção. Embora o grupo de trabalho tenha citado durante a live e no próprio documento a possibilidade de um plano de testagem em massa na USP, nenhum pronunciamento oficial foi feito a respeito.

Os trabalhadores

Apesar da adoção do trabalho remoto em alguns setores, aqueles considerados essenciais, principalmente relacionados à saúde humana e veterinária, como o Hospital Universitário e laboratórios com experimentos relacionados à Covid-19 e testes envolvendo animais, continuaram funcionando. Com isso, os funcionários têm enfrentado diversos desafios relativos às condições de trabalho desde o início da pandemia.

“Principalmente no HU travamos muitas discussões com a gestão. Inclusive tivemos que fazer atos públicos reivindicando coisas básicas, como a maioria dos EPIs, como máscaras, ainda mais num hospital, máscara cirúrgica para todos os setores e que pudesse ser trocada com regularidade”, conta Reinaldo Santos de Souza, representante da diretoria colegiada do Sintusp.

Os funcionários do Hospital Universitário ainda lutam por condições seguras de trabalho em meio à pandemia. Foto: Sintusp

 

 

Com o Plano USP pautando a possibilidade de uma volta progressiva dos funcionários aos campi antes do retorno das aulas no ano que vem, eles são a categoria mais diretamente afetada. Apesar disso, se sentem excluídos da decisão. “A rigor, esse plano não foi discutido nos conselhos centrais nem no Conselho Universitário. Ele foi elaborado a partir de um grupo de trabalho que a Reitoria instituiu numa reunião de dirigentes, que não é um fórum formal da universidade. Então não houve nenhum diálogo com aqueles que estão de fato implicados no plano. Além disso, o plano, na prática escolhe quem vai poder se expor ao vírus e essas pessoas são os funcionários.”

Frente a isso, o Sintusp tem buscado, além de EPIs e outros itens necessários para a segurança das condições de trabalho, liberações para funcionários dos grupos risco que foram mantidos em regime presencial e a responsabilização dos diretores de unidades que expuserem funcionários a condições de risco à saúde e à vida. Mesmo os funcionários em teletrabalho têm enfrentado dificuldades relacionadas aos equipamentos, condições ergonômicas e sobrecarga.

Segundo Reinaldo, têm-se notícia de pelo menos 10 mortes de Covid-19 de funcionários entre efetivos e terceirizados que, apesar de não serem oficialmente representados pelo Sintusp, têm reivindicações semelhantes. Para a maior parte deles, a exposição ao vírus é ainda maior, trabalhando em serviços essenciais relacionados à limpeza e alimentação. 

A Adusp também se posicionou contrária à forma como o plano foi elaborado. Para as duas entidades é problemático que o Plano USP seja baseado no plano de flexibilização do Estado, que eles acreditam ser motivado não por análise científica, mas por questões econômicas. “Esse é o maior problema: era preciso ouvir as pessoas. É claro, é mais difícil. Mas o espaço da universidade tem que ser um espaço democrático e da forma como está sendo conduzido não é”, afirma o presidente da Adusp, Rodrigo Ricupero.