O JC precisa entrevistar mais e melhor

Por  Rodrigo Ratier

A escuta às chamadas fontes de informação é um dos alicerces da apuração jornalística. Entre as várias classificações disponíveis, uma é central para a produção de notícias: a distinção entre fontes testemunhais e especializadas. As primeiras se qualificam a ser ouvidas pois participam efetivamente do fato que está sendo narrado. Quanto às segundas, sua legitimidade se deve ao saber específico: elas são imprescindíveis para contextualizar o acontecimento imediato, inserindo-o em um espaço-tempo ampliado e auxiliando a conferir sentido ao que está sendo exposto.

Jornalistas vivem em busca do delicado equilíbrio entre os dois tipos de fonte. A edição anterior do Jornal do Campus apresenta algumas fragilidades nesse aspecto. “Experiências com o ensino à distância” é um exemplo. Com título e subtítulo genéricos e redundantes (não é aceitável a repetição da expressão “experiências com o ensino” nos dois espaços mais visíveis da reportagem), o texto traz um apanhado disperso de contatos de alunos e professores com as telas educativas no período pandêmico. Se por um lado há bom número de fontes testemunhais, os especialistas estão ausentes. Ficamos, assim, sem saber se estamos diante de casos típicos ou desviantes, e em que medida as trajetórias retratadas representam, efetivamente, a multiplicidade de experiências vividas ao longo de 2020. “Mulheres contra o coronavírus” apresenta problema semelhante, ainda que algumas informações – por exemplo, quanto aos anos de estudo – permitam entrever uma diminuição na desigualdade entre sexos na carreira científica. Poderia se buscar mais dados de contexto ou entrevistados que os pudessem citar.

Em “Em Fuvest 2021: ‘Pretendemos lançar mão de todas as medidas de prevenção à pandemia'”, o problema é também com as fontes, mas de outra ordem. Belmira Bueno, diretora executiva da Fuvest, defende os protocolos para realização da prova presencial. Sua presença se justifica por ser fonte “oficial”, às quais deve-se evitar postura reverente ou laudatória. A entrevista deixa lacunas ao não especificar quais seriam esses protocolos e também ao não insistir na questão da duração de prova – há evidências de que o tempo de permanência em locais fechados é um dos fatores-chave na propagação do coronavírus. A falta de incisividade é ainda mais evidente quando outra reportagem da mesma edição, sobre a suspensão dos concursos, afirma que a medida se deu, entre outras razões, porque “a realização das provas e processos de avaliação normalmente requerem a presença de muitas pessoas”, sendo “o risco de transmissão alto”. O maior vestibular do país tem tamanho incomparavelmente maior.

Em “A suspensão dos concursos fere o quadro de docentes da USP”, falta pluralidade de pontos de vista. A reportagem assume viés negativo quanto à suspensão dos concursos (o verbo “ferir” no título reifica o “quadro docente”) sem ouvir um dos atores fundamentais, a Reitoria da USP. Há acusações de sucateamento da estrutura, feitas pelo entrevistado da Adusp, que pedem direito ao contraditório.

Curtas

  •         De volta para o Futuro Em “Atletas olímpicos protestam pelo retorno aos treinos na Raia Olímpica: ‘Trancados para fora de casa'”, somos informados de que a “Cidade Universitária está, neste momento, na Fase B da retomada gradual, com expectativas de entrar na Fase C no dia 23 de outubro”. A reportagem foi publicada em 9 de novembro. Uma foto fala “Raia da USP em condições abaixo do ideal” sem informações adicionais (seria a qualidade da água? o nível da raia?)
  •         No escuro Não funcionou o ensaio fotográfico “Estrelando… Cinema Drive-in”. O formato de publicação torna o ensaio pouco distinguível de uma reportagem comum. Talvez seja o caso de pensar em um template específico para galeria de fotos. As imagens também se beneficiariam de legendas específicas e mais informativas.
  • Perdidos no espaço O título “Expectativa x realidade”, sem maiores explicações, não serve para a internet. A referência ao meme perde sentido, por exemplo, nos mecanismos de busca, onde deve-se abandonar a poesia em prol de palavras-chave que possam identificar mais facilmente a reportagem.