O que são NFTs e como essa tecnologia está criando um mercado milionário

Sistema emite tokens que certificam a propriedade de objetos físicos ou virtuais. Algumas vendas já atraem investimentos volumosos, como no caso de obra digital leiloada por R$ 389 milhões

 

 

por Victor Aguiar Ferreira

Meme “Nyan Cat” foi vendido como NFT por quase 600 mil dólares em leilão que durou mais de 24 horas. Foto: Reprodução

 

A arte contemporânea é, há muitos anos, objeto de discussão e questionamento por parte de seu público. Obras como o quadro Onement VI, de Barnett Newman — vendido em 2013 por 44 milhões de dólares — causam polêmica e acalorados debates em torno de temáticas como “o que é arte” e “por que tanto valor em obras assim”.

 Mulher observa a obra “Onement VI”, de Barnett Newman. Foto: Reprodução

 

Com o surgimento e popularização dos NFTs — “non-fungible tokens” em inglês ou “token não fungível”, em tradução livre —, a tendência é que esse tipo de discussão se estenda para um campo ainda emergente no âmbito cultural: o da arte digital.

A grosso modo, um NFT é um certificado de autenticidade. Seja de um arquivo de imagem, de um tweet, um texto publicado em um site, um vídeo, uma coluna de jornal, um meme, uma peça musical; não importa. Seu propósito não muda: garantir a autenticidade e exclusividade daquilo que é comprado.

Um exemplo do uso de NFTs é o caso de  Zoë Roth, mais conhecida como “Disaster Girl”, que foi eternizada na cultura viral por uma foto tirada em 2005, em frente a um edifício em chamas. Recentemente, no final  de abril deste ano, Zoë vendeu a imagem em formato NFT para a 3F Music, um estúdio musical sediado em Dubai, por 500 mil dólares. 

Por ser baseado na tecnologia Blockchain, um sistema que permite rastrear o envio e recebimento de alguns tipos de informação pela internet, um NFT é inviolável, ou seja, não pode ser duplicado e, por isso, permite que esses arquivos digitais sejam vendidos como peças únicas, como acontece com as obras de arte. Mesmo que você consiga visualizar o meme em questão logo abaixo, a lógica, segundo os defensores da prática, seria a mesma se fosse inserida uma foto da Monalisa: é apenas uma réplica, então só uma pessoa pode ter o status e o prazer de ser a dona do quadro.

 Meme “Disaster Girl”, vendido como NFT por 500 mil dólares. Foto: Reprodução

 

“Disaster Girl” é, no entanto, somente uma foto entre múltiplas vendas que utilizaram o certificado. Recentemente, também foram vendidos como NFTs: o primeiro tweet da história, publicado em 2006 pelo fundador da rede social, Jack Dorsey, por 2,5 milhões de dólares; o vídeo viral “Charlie Bit My Finger” — que foi deletado do YouTube após a venda —, por 760 mil dólares; e, na transação mais notável no universo dos NFTs até agora, uma obra do artista digital Beeple, que alcançou a marca dos 69 milhões de dólares.

Para além de conteúdos audiovisuais, a venda de NFTs não é menos intensa. Na terça-feira, 15, o cientista da computação Tim Berners-Lee, inventor da internet, anunciou que vai leiloar o código original da rede como NFT. O New York Times, em março, vendeu uma coluna do repórter de tecnologia Kevin Roose como NFT por 560 mil dólares. A NBA, ao longo dos últimos meses, também tem apostado no sistema: lançou a Top Shot, plataforma na qual são feitos leilões de grandes momentos da liga de basquete como NFTs.

 Obra NFT de Beeple “Everydays: The first 5000 days”, vendida por 69 milhões de dólares. Foto: Reprodução

Os NFTs, contudo, não estão isentos de críticas

A tecnologia, no entanto, não está isenta de polêmicas. As transações com blockchain gastam uma quantidade enorme de energia — só as movimentações em bitcoins consomem, anualmente, mais energia do que toda a Argentina, segundo levantamento da Universidade de Cambridge. Além das transições em si, também são necessárias verificações — as chamadas proof of work — para garantir que a criptografia de um bloco é válida, e os cálculos envolvidos nessas verificações aumentam ainda mais o gasto de energia, já elevado.

Além disso, como toda nova possibilidade de investimento que surge no mercado e gera uma grande movimentação, há o risco de pessoas ansiosas por lucros a curto prazo acabarem entrando em uma bolha financeira.

“O que pode acontecer, e já vem acontecendo, são as pessoas colocando valores absurdos em objetos que, na realidade, não têm valor nenhum”, afirma Rocelo Lopes, especialista em tecnologia blockchain e criptoeconomia

Em uma galeria tradicional de arte, por exemplo, para que uma obra receba o selo de autenticidade, é necessária uma análise de especialistas para verificar se ela é real, e não uma cópia. Todo o ideário das criptomoedas, por outro lado, é fundamentado na proposta de um sistema descentralizado, em que qualquer pessoa pode emitir um NFT — logo, esse processo de validação não acontece. 

Essa lógica também levanta outra problemática: a da falsificação. Qualquer pessoa pode anunciar uma obra ou mídia nas plataformas de venda de NFTs, por mais que não seja o responsável pela obra. Em casos do tipo, o NFT pode chegar a ser vendido sem que qualquer lucro seja direcionado ao autor original do objeto de venda. 

Fato é que o mercado dos NFTs ainda está em crescimento e a tendência é que situações ainda mais complexas venham a aparecer com o decorrer do tempo. A única certeza é que, seja você um entusiasta ou não, eles vieram para ficar.