Não é só cansaço

 

por Rebeca Alencar

Foto: Lacie Slezak/Unsplash

 

No início da pandemia, um dos assuntos do momento era a avalanche dos workaholics. A surpresa do tempo de sobra para alguns que já possuíam uma rotina estável, somada à ilusão do “serão só duas semanas”, impulsionou uma produtividade frenética na comunidade universitária que havia acabado de voltar de férias ou iniciar o primeiro ano letivo. 

Com o passar das duas semanas — que se tornaram meses — deixamos de ver na mídia informativa matérias como “5 sites de cursos online gratuitos” e voltamos às tradicionais “10 dicas infalíveis para uma noite de sono tranquila”. Não que elas não existissem antes, mas, dessa vez, tomaram frente nos veículos de comunicação. Por que será?

Desde a suspensão das aulas presenciais, a universidade nunca parou, apenas se adequou, na medida do possível, às condições do ensino remoto. Em consequência, não há como descansar do que nunca teve pausa. Na tentativa de aproveitar o mínimo do que seria a experiência universitária presencial, os novos alunos se envolveram no máximo de projetos possíveis para que tivessem um pouco do campus nas suas telas. Já os antigos tentaram usar do processo de transição em seu favor para organizar as pendências que estavam em aberto e as que com certeza ainda estavam por vir. 

Mas essas duas semanas não acabaram. Pelo contrário: se multiplicaram.  O tempo perdido com a reformulação do funcionamento de uma universidade — que nunca foi estruturada para ser remota — custou caro aos professores, que sentiram o seu rendimento profissional e interação na relação professor-aluno cair, e aos alunos que, com cada vez mais demandas acadêmicas, encontram-se na angústia do sentimento de incompetência e esgotamento físico e mental. 

A graduação sempre foi um compromisso, mas sempre havia aquela certeza da diversão no encontro com os amigos aos finais de semana e um bom descanso ao chegar em casa. O que o corpo discente encontra hoje no seu ambiente de descanso é o mesmo ambiente de trabalho, de estudo e de descontração, sem saber qual será a próxima função da vez. 

E ao passo que se sabe que o dia tem apenas 24 horas, é nesse período de tempo em que os alunos da Universidade de São Paulo buscam ser eles mesmos, estudantes, filhos, amigos e profissionais em formação. A diferença é que a divisão de duas horas no trânsito, seis horas em aula e oito horas de sono não existe mais. E a fala bem-humorada que resgata a “saudade do ônibus lotado no fim da tarde” não se trata somente de ver pessoas e circular pela cidade, mas, sim, de saber que naquele momento sua única responsabilidade era voltar para casa.

Não é só cansaço. É depressão. É ansiedade. É insônia. É, principalmente, a falta da nossa vida de volta.