Não existe filme grátis: o financiamento de projetos dos alunos de audiovisual da USP

Estudantes da graduação buscam caminhos para complementar a verba de projetos de TCC

por Beatriz Herminio

Fotos: Beatriz Herminio/JC

Nas últimas semanas, quem passasse pelos prédios da Escola de Comunicações e Artes (ECA) pela manhã poderia encontrar alunos vendendo lanches, cafés e doces em frente ao Departamento de Cinema, Rádio e Televisão (CTR). O grupo responsável pelo TCC Reminiscências de Outro Sol, formado por alunos do curso de audiovisual da USP,  criou a loja “Sol e Gatinhos”. Com perfil de divulgação no Instagram, vendem lanches e bolos veganos para arrecadar fundos para custear o projeto, atividade comum aos estudantes do curso. 

Em forma de curta-metragem, esse é o primeiro trabalho experimental do departamento em muitos anos, afirma Laís Vallina, integrante do grupo. Ao lado dela, em frente ao CTR, Helena Gurovitz vendia café para a produção de seu grupo, um videoclipe para a música Convenções humanas, das bandas Pluma e Walfredo em busca da simbiose. Diferente do curta-metragem, o videoclipe “tem um formato mais estabelecido, mas que também abre muito espaço para experimentação”.

Para desenvolver essas produções, algumas questões financeiras surgem no caminho: a contratação de atores, alimentação da equipe, transporte, locação de lugares para gravação e equipamentos são alguns exemplos. Parte dessas despesas, contudo, são cobertas pelo CTR, seja pelo fornecimento de equipamentos e de seu transporte, seja pelo fornecimento de verbas destinadas ao desenvolvimento dos trabalhos, explica Laís.

O investimento em equipamentos é o que Almir Almas, chefe de departamento, classifica como um dinheiro “não visto”, com câmeras que podem chegar a custar R$40 mil. Ele afirma que a verba fornecida é um auxílio ao estudante, “não é para o aluno gastar com o que quiser. Vamos supor, o aluno recebe R$2.600. Ele tem que fazer uma prestação de contas”, pontua.

Para o professor, a ajuda do departamento é grande, e o subsídio é uma política pedagógica do CTR. “Cenografia, iluminação, ilha de edição, montar imagem, fazer correção de cor, tudo isso é um custo enorme que o departamento cobre porque a gente entende isso como nossa missão.” Contudo, a sofisticação demandada pelos TCCs muitas vezes reflete a necessidade de arrecadações.

O grupo de Laís pretende arrecadar cerca de R$3 mil. Ela aponta que muitos projetos são feitos no departamento ao longo do ano e que, em 2022, a carga é maior devido ao atraso provocado pela pandemia. “Não tem como eles darem uma verba muito grande. A gente complementa com arrecadações porque a gente também quer fazer um trabalho que seja o nosso portfólio. Quando a gente sair daqui vai ser nossa entrada no mercado, queremos complementar também para fazer uma coisa mais legal, uma produção mais bem feita.”

O destino da verba varia conforme cada produção. “A gente está arrecadando para conseguir dar uma alimentação de qualidade para a equipe. Também queremos pagar os atores de uma forma adequada, porque a gente está se formando, mas pra eles é um trabalho”, pontua Laís. Para explorar a relação do corpo com a cidade por meio da performance – como propõe o curta-metragem – o grupo precisará gastar verba com locações, “é um pouco mais ambicioso”.

Para o videoclipe, não há uma preocupação com locação. Apesar disso, “tem a [câmera] Super 8 que custa caro. Também é caro revelar, escanear e comprar o filme em si”, explica Helena. Além disso, ela lembra que a direção de arte é muito produzida para ressaltar a visualidade do videoclipe, por isso figurino, maquiagem e cenário representam boa parte das despesas.

Divulgação dos projetos de arrecadação. Instagram: @solegatinhos e @sopadesiva

Outras formas de arrecadação ainda são utilizadas ao longo do curso. No caso do exercício do segundo ano, comumente chamado de “rodízio” – que propõe que todos os alunos tenham a oportunidade de atuar com as principais funções de uma obra audiovisual, como roteiro, direção, produção, fotografia, som e montagem –, elas lembram que a turma montou um brechó. Em outros momentos, trabalharam com rifas ou não realizaram arrecadação, mas dividiram os custos entre a produção e a direção. 

O Reminiscências de Outro Sol irá trabalhar com a dança e movimentos para construir a relação do corpo com diferentes espaços: um apartamento, um local aberto e arborizado e uma vila com casas antigas. O nome do projeto faz alusão à relação entre tempo e memória: “É uma lembrança de um outro Sol, pode ser o sol do passado, o de hoje”, conta a aluna. 

“A ideia é fazer uma experimentação. Não tem uma narrativa linear, não tem uma historinha, não tem os personagens fixos, não tem diálogo”, porque o trabalho experimental foge da construção narrativa tradicional, explica Laís. Responsável pelo som da produção, ela está buscando alternativas aos instrumentos musicais. “Estou tentando trabalhar com som de objetos e sons orgânicos para compor o filme, para não ser uma coisa muito convencional.”

No caso do videoclipe, Helena explica que a gravação será feita em estúdio e em outros dois espaços da USP, um fechado e construído – um prédio da biologia – e um aberto, com natureza – o parque Esporte para Todos.

No momento, os projetos estão em fase de arrecadação e planejamento das filmagens e locações, entre outros aspectos da pré-produção, antes de iniciarem as gravações em julho e agosto.