A educação superior como mercadoria

Habemus privatização!

por Sofia Kercher da Silva

Arte: Vinícius Byckowski/ Foto: Roque de Sá / Agência Senado

Criada em 2019 pelo deputado General Peternelli (União Brasil), com relator Kim Kataguiri (União Brasil), a PEC 206 propõe que as universidades públicas brasileiras passem a cobrar mensalidades dos alunos.

Segundo os deputados, a medida garantiria a gratuidade para estudantes que não tivessem recursos suficientes. O corte de renda seria definido pela própria instituição, e não está especificado na proposta exatamente como esse controle seria feito.

Ao clamar, sem qualquer vergonha, que “a educação brasileira não pode continuar sendo uma máquina de desigualdade social (tirando dos pobres e dando pros ricos)”, Kataguiri monta um espetáculo impressionante para fingir que se importou, alguma vez na vida, com a vida dos estudantes de baixa renda nas universidades.

Como bem se sabe, o ano eleitoral leva qualquer deputado à loucura. Kataguiri e Peternelli, que claramente nunca estiveram tão distantes do dia a dia das universidades públicas, não pensam nas ramificações práticas que essa medida poderia ter nos alunos. 

Ignoram a desigualdade evidente que estaria sendo imposta; a provável queda de permanência dos alunos; a alta chance de mensalidades serem cobradas injustamente, levando alunos de baixa renda a desistirem do curso; o menor investimento na pesquisa e espaço universitário. A medida ainda abre um precedente perigosíssimo no qual, caso caísse nas mãos erradas, uma mensalidade geral poderia facilmente ser implementada. 

Somado a isso, desconsideram todo o avanço feito com as cotas raciais e sociais, e reforçam ao máximo a ideia de que o investimento com ensino superior é algo supérfluo e desnecessário.

Lentamente, a direita brasileira implementa seu projeto de privatização do país, onde a educação superior é construída como privilégio – e, acima de tudo, como mercadoria. 

Pior ainda é saber a verdade: a eles não importa a permanência desses estudantes na universidade, bem como não interessa o que acontece com o bebê depois que sai do útero. Mas, na mão deles, o aborto continuará criminalizado, e a universidade pública brasileira se transformará em um playground da iniciativa privada.

Ainda assim, resistimos. Lutamos pela reposição do orçamento das universidades, do fortalecimento das políticas de permanência estudantil, da renovação da Lei de Cotas – que já está batendo na porta. Pelo aprimoramento da educação básica, do ensino fundamental e do ensino médio. 

No meio tempo, tiramos um tempinho para compor esta edição do JC. Boa leitura!