Originais reprovados: autores desconhecidos e aprendizados editoriais

Revista literária publicada pelos alunos de Editoração da USP dá voz para textos escritos por alunos e funcionários da Universidade

por Bianca Camatta

Arte: Lucas Torres Dias/JC

“A escrita me atrai desde a infância. Não sei explicar essa paixão, deve ter sido amor à primeira vista: sei ler e escrever desde que consigo me lembrar, devorava quase tudo a que tinha acesso em matéria de conteúdo impresso em minha infância e adolescência.” É o que conta Eudes de Pádua Colodino, que teve um texto publicado na última edição da Originais Reprovados, revista que publica prosas e poesias escritas por alunos e funcionários da USP e é produzida pela Com-Arte Júnior, empresa júnior de Editoração da universidade.

A Originais Reprovados surgiu em 2005 e foi idealizada por um estudante do curso de Editoração, com o objetivo de dar voz a autores desconhecidos que estão na universidade. A revista literária tem publicação anual e pode receber textos de pessoas de todos os Campus da USP.

Além de dar espaço para aqueles que gostam de escrever, a publicação também é uma oportunidade para os alunos de Editoração poderem entender melhor sobre o processo de produção de livros e revistas.

Espaço para a escrita

Ana Lívia Marcílio, atualmente diretora de projetos da Com-Arte Júnior, acredita que na faculdade há um maior espaço e valorização da escrita acadêmica. Assim, a escrita criativa fica em segundo plano, muitas vezes deixando de ser praticada ou, no máximo, sendo encarada como um hobby. “A Originais vem para dar essa voz e colocar em evidência o outro lado do aluno, do funcionário, que muitas vezes é ignorado, porque você não espera que seu professor escreva poemas, não espera que a moça da limpeza escreva poemas. Mas as pessoas são artistas”, diz. 

E a inserção de funcionários da USP no projeto é um diferencial da revista. “Abrir a participação aos funcionários técnicos e administrativos, quadro do qual faço parte e que é tantas vezes esquecido quando pensamos em comunidade universitária, foi um acerto e tanto por parte da equipe da Originais”, conta Eudes, que trabalha na Biblioteca do Conjunto das Químicas. “Sempre achei divertida a forma de se comunicar da revista, justamente provocando os escritores da comunidade a tomar coragem e resgatar seus textos do fundo das gavetas e das mentes e trazê-los ao mundo na Originais Reprovados”, complementa

Essa iniciativa abre espaço para a escrita de forma profissional. Ana conta de uma ocasião em que um autor, que teve um texto publicado na revista, entrou em contato para saber se o texto poderia ser publicado em outro projeto. Assim, participar dessa iniciativa pode ser o momento inicial para que a pessoa passe a se enxergar como autora e alcance leitores para os seus textos.

A escrita também pode ser importante para a saúde mental. Para Eudes, escrever o ajudou em um momento difícil, foi como uma “terapia”, em que escrevia sobre seus sentimentos, observações e impressões. 

O conto de Eudes fala sobre a natureza que está ao nosso redor e que muitas vezes é negligenciada. “Terreno Baldio veio justamente para lançar luz a essa natureza imediata, vizinha, que reside ao lado e dentro da minha casa e com a qual interajo cotidianamente, e que fervilha nos pequenos santuários ocultos por velhos portões e muros limosos que são os terrenos baldios, que guardam preciosidades da natureza nativa da metrópole”, conta o autor. 

Produção e aprendizado

Para ser produzida, a revista passa por alguns processos. Primeiro há a abertura para inscrições de textos à comunidade uspiana. Quando esse processo é fechado, inicia-se a seleção pela equipe de quais textos vão fazer parte da Originais Reprovados, para que a escolha não seja influenciada, a autoria é escondida nesse momento. 

Depois de selecionados os textos, ocorre o processo de revisão, que vai lapidar a prosa ou poesia produzida. “Nessa parte, nós conversamos com os autores, e precisamos entender o que ele quer passar e também precisamos respeitar muito. E isso é muito legal para ir conhecendo os limites da revisão e os limites da arte”, comenta Ana sobre um dos aprendizados que conquistou durante o processo de produção da revista.

Há ainda a etapa da arte e da diagramação que acrescentam uma outra forma de linguagem e dão forma aos escritos. 

Por fim, há a programação do e-book. Durante sete anos, a revista era apenas impressa. Quando o curso de Editoração foi reformulado e passou a ensinar programação de e-books, esse novo formato passou a ser incluído. E, com a pandemia, as impressões ficaram paradas por um tempo. Para a impressão, a Com-Arte busca parcerias com gráficas, que possam imprimir a edição gratuitamente em troca de divulgação, por exemplo.  

Todas essas etapas tornam a Originais Reprovados importante não só para os autores, mas também para os estudantes. “O mundo da Editoração é bem complicado para quem quer começar, então, ter essa oportunidade no curso e no primeiro ano foi incrível para começar a aprender as coisas”, conta Ana. 

Eudes conta que conhecia a revista desde que fazia parte da graduação em História na faculdade, ele conta que via a divulgação nos ônibus circulares e espalhados pelo Campus. Já como funcionário, ele ficou sabendo que as inscrições para revista estavam abertas por meio de um e-mail enviado para a comunidade uspiana. Ana aponta que, apesar das pessoas da faculdade conhecerem o projeto, muitas vezes, a revista alcança apenas esse público. Então, buscar outros meios de divulgação é um objetivo da empresa.

Um dos novos meios pensados pela Com-Arte é levar as revistas e outras produções para a Festa do Livro da USP. Eles pretendem divulgar a 17° edição da revista, que tem previsão de ser publicada no final do ano, nesse evento.

“A universidade tem muita gente talentosa em seus quadros, cujos dons muitas vezes são desconhecidos delas mesmas”, comenta Eudes. Com a iniciativa de expandir a divulgação da Originais Reprovados, mais pessoas poderão conhecer esses autores ou se reconhecer como autores.