Viver é um ato político

Para além dos botões da urna, a política na nossa vida, na nossa morte e em tudo que acontece nesse ínterim

por Laura Guedes

Foto: Duda Ventura/JC

Afinal, o que é política? Dizem que esse papo começou lá na Grécia, há muitos séculos. A tal da política começou graças à passagem da consciência mítica para a atitude filosófica. Eles a compreendiam como o ápice da realidade humana e a principal característica do homem livre. Milhares de anos e confusões depois, ela já não é mais tão bem quista por grande parte da sociedade de um país enorme, latino-americano, sem dinheiro no banco e na corda bamba de sombrinha.

Quem viveu 2013, viu. O que antes era “assunto chato”, virou tema de conversa em mesas de bar e de jantar por todo o Brasil. As opiniões até divergiam, mas um consenso se fazia presente na maioria dos casos: “nenhum político presta, não quero saber de política”. Quase dez anos se passaram e passaram por cima de muita gente, mas essa ideia segue firme em um enorme estrato social.

Em um ano em que a eleição define muito mais do que o nome de quem ocupará o palácio do Planalto, eleitores de várias idades tentam não se comprometer, sob a máxima de que não se importam com isso de “política”. Talvez por falha do sistema educacional, talvez por falha de cada um de nós, criou-se uma sensação de que a política só existe na hora de apertar o confirma na urna e que depois disso ela some, evapora.

Meu caro leitor, não sei se para você isso será uma novidade, um alívio ou um tormento, mas até naquele cafezinho depois do almoço a tal da política está presente. No almoço então, nem se fala. Na carne, no arroz e no feijão? Cadeira cativa. Toda decisão tomada por aqueles que elegemos impacta diretamente no nosso dia a dia. As medidas econômicas, as relações internacionais, os programas sociais.

Às vezes, por costume, privilégio ou falta de tempo, isso tudo passa até desapercebido. No entanto, a atenção logo dá o ar da graça quando uma assinatura pode evitar que você e quem você ama fiquem em uma UTI lotada, sem oxigênio. Quando essa assinatura não vem, aquela urna deixa de ser uma obrigação, uma chatice, e vira a mão que pode segurar a sua na beira de um penhasco.

Mas, sabe, leitor, tem muita gente que conhece esse abismo diariamente e todos os dias passa por ele com medo e uma coragem absurda. Para milhões de brasileiros, levantar-se da cama de manhã e voltar de noite é um ato político. É sobreviver a uma cultura que historicamente odeia negros, pobres, mulheres, LGBTs e muitos outros. Um ódio covarde que não suporta dividir espaço com o diferente. Por incompetência, violência ou maldade.

O ponto é: a política está em tudo. E quando a gente decide tirar o corpo fora, não se posicionar, não falar sobre isso, não discutir, não buscar entender melhor essa confusão toda – que é difícil mesmo de compreender, eu sei –, não votar com consciência, alguém escolhe por nós. Sem dialogar, sem tirar um minuto para pensar no Brasil, em problemas que talvez não sejam nossos, mas do outro, não existe país. País é só um conceito. Sem um povo, tudo não passa de um pedaço de terra no meio de um planeta cheio de água.

Nesse dia 30 de outubro, teremos uma oportunidade de reforçar que a democracia persiste e não será intimidada. Que essa não seja a nossa última chance. E que aproveitemos para resgatar, também, a origem da política de desconstruir os mitos. Com coragem. Para que nenhuma criança durma com fome, nenhuma mãe morra porque o governo não enviou um cilindro de oxigênio, nenhuma universidade pública feche as portas e nenhum brasileiro fique sem esperança, sem trabalho e sem dinheiro, enquanto orçamentos secretos e declarações vergonhosas nada secretas sequestram o nosso país.

O Jornal do Campus está com vocês na luta contra o autoritarismo em todos os poderes.