Identidade afrolatina em exibição: A arte de Wilton Garcia

A instalação do artista plástico mineiro, Latinoamérica_negra_contemporânea, foi inaugurada no Memorial da América Latina

por Lara Paiva

Foto: Victória Pacheco/JC

Em 20 de novembro – Dia da Consciência Negra –, a exposição Latinoamérica_negra_contemporânea, do professor e artista visual Wilton Garcia, com curadoria assinada por Luciano Maluly (ECA-USP) foi inaugurada. A abertura contou com a performance #Ébano Celestial, de Terezinha Malaquias.

Localizada no Espaço Gabo do Memorial da América Latina, a exposição foi feita em parceria com a Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Ela conta com obras feitas em meios mistos, que misturam diversas referências para criar um estilo único e contemporâneo – dentre estas Arte Naif, Arte Pop e Bricolagem. 

O projeto, realizado em 2022 no ateliê de Garcia na área rural de Nazaré Paulista, surgiu quando o artista contemplou como se retrataria a Persona Afrolatina. O desejo era de constituir um valor observando não só o sujeito América Latina, mas também seu território. 

A experimentação de meios chama atenção – são usados como tela de pintura sacolas, embalagens, jornais, cardápios, propagandas, folhas de caderno, plantas arquitetônicas, revistas, entre outros. 

Wilton Garcia explica que o desenvolvimento do trabalho surgiu a partir de uma demanda técnica e de uma questão decolonial. O reuso de materiais diversos descartados como lixo leva o espectador a notar inadvertidamente as deformidades e imperfeições do meio. 

Os traços coloridos e marcados de Garcia contrastam com o fundo de materiais descartados como lixo – evidenciando a preocupação do artista de “dar um outro fim para os materiais”. Foto: Victória Pacheco/JC

O Memorial da América Latina

O artista explicita que esse tipo de exposição no Memorial da América Latina tem consequências significativas. Por ser um espaço público e gratuito, o Memorial é mais acessível que grande parte dos museus e fundações culturais. Isso pode ajudar a disseminar mais sobre a arte contemporânea: “A questão do livre acesso deste equipamento é fundamental para convidarmos as pessoas a conhecer as novas vertentes do que está sendo produzido no Brasil e no mundo sobre a América Latina”, afirma Garcia. 

O Memorial teve uma programação bem agitada no segundo semestre de 2022, afirma Ana Clara Gaspar, assessora de imprensa. O Espaço Gabo recebeu três exposições seguidas – uma da fotógrafa Maureen Bisilliat, uma homenagem ao cartunista Angeli e Latinoamérica_negra_contemporânea. Outros eventos culturais promovidos no Memorial – como shows, festivais, seminários – ajudam a levar público para as exposições. “Uma pessoa vem para a Feira Preta e já dá uma passada [na exposição]; a outra vem para o festival gastronômico, vem para cá e depois para um show”, ela exemplifica. 

O processo de criação

Wilton Garcia explica que, quando começa a trabalhar em uma obra, se debruça sobre ela em uma escala menor. O artista fez estudos de cor, forma, tema, conceito, visitou o espaço do Memorial da América Latina, conversou com a curadoria, e assim, encontrou um caminho para criar suas obras. 

“Para mim, experimentar é a palavra de ordem quando se pensa em arte contemporânea”, diz Garcia. “É preciso radicalizar e, inclusive, ir um pouco mais além para alcançar uma produção subjetiva. A experimentação com os materiais (que o artista chama de experimentação poética, por derivar do ato de fazer e colocar “as mãos na massa”)  se uniu à orientação da curadoria, ao discurso de valor intencionado e aos enfrentamentos com os materiais artísticos para formar o conjunto de obras expostas atualmente no Espaço Gabo. 

Além dos retratos de line-art coloridos, algumas obras têm palavras como “diversidade”, “+plural” e “diversos” estampadas entre os traços. Foto: Victória Pacheco/JC

A reutilização de materiais também implica uma sensibilidade para o artista. “Parte um pouco daquilo que a gente tem instaurado, e a partir daí desenvolver estratégias e compor com os elementos técnicos e estéticos, mas também com os elementos éticos”.  O valor de discurso da arte é almejado desde o processo de criação: “A gente pretende também considerar que a obra traz um discurso e que toda a arte tem a sua dimensão política e identitária”, complementa. 

A exposição Latinoamérica_negra_contemporânea estará exposta no Espaço Gabo do Memorial da América Latina até 04 de fevereiro. O acesso pode ser feito por meio da estação Barra Funda-Palmeiras do metrô. A entrada é gratuita e ocorre de terça a domingo, das 10h às 17h.