2 reais ou uma fila misteriosa?

Estudantes reclamam das filas nos restaurantes universitários da USP, que se mostram ineficientes em atender ao público

Foto: Alícia Matsuda/JC

Por Gabriela Varão e Pedro Morani*

Os bandejões são a única forma para fazer refeições para pelo menos 40% dos estudantes da USP que responderam a pesquisa realizada pelo JC, tornando-se um dos principais meios de permanência estudantil. A sondagem é uma amostragem da nova realidade da Universidade: dados divulgados pela Pró-Reitoria de Graduação mostram que 54,1% dos estudantes aprovados no vestibular de 2023 são egressos de escolas públicas. 

O levantamento constatou que a maior e mais recorrente reclamação são as largas e longas filas. Com tempo de espera de até 1h40 nas refeições, o custo de apenas R$ 2 por refeição fica com sabor amargo na vivência universitária. Quase 87% dos estudantes que responderam à pesquisa relatam que já perderam o horário por conta da espera. 

Para adaptar a rotina, muitos usam técnicas para não atrasarem compromissos acadêmicos ou profissionais. “A gente tenta sair bem rápido das aulas para não perdermos o horário de almoço, e nem chegarmos atrasadas na aula da tarde”, explicam as alunas de pós-graduação da Faculdade de Saúde Pública (FSP), Bianca Guedes e Carla Gabrielle. 

A FSP tem um restaurante pequeno, mas que até pouco tempo atrás conseguia atender aos alunos. No entanto, a partir das férias do meio do ano, essa realidade mudou com a vinda dos estudantes da Faculdade de Medicina (FM), órfãos do restaurante interno que foi fechado para reformas em julho. A continuação do contrato com o Grupo Aze, empresa que opera o restaurante, era uma das reivindicações da greve deflagrada pela unidade no começo do ano, mas que não foi atendida. 

“O estopim da greve foi quando a Bonfá, diretora da FM, queria não só tirar o bandejão como tomar vários espaços do porão, local de vivência dos estudantes”, relata o estudante João Pedro Damasceno, do primeiro semestre do curso de Medicina. O restaurante funcionava com subsídio da faculdade, e os alunos pagavam os mesmos dois reais, podendo optar por comer refeições ou kits de lanches já estabelecidos. 

“Pelo que eu me recordo, chegou um comunicado de repente falando que o local ia ser fechado e caso não houvesse a nossa cooperação, também seria perdido o espaço de convivência”, completa João. Com isso, os estudantes de medicina passaram a frequentar os restaurantes vizinhos, da FSP e da Escola de Enfermagem. Estruturado para uma quantidade bem menor de pessoas, as filas aumentaram consideravelmente na percepção dos frequentadores. 

Esse é o caso da graduanda do quinto semestre do curso de Nutrição, Beatriz Pereira. “Na primeira semana, nem sabia o que tinha acontecido. A fila estava o dobro do que era, chegando num lugar que eu nunca tinha visto antes”. Ela ainda conta que algumas medidas foram tomadas para tentar diminuir o tempo, como a abertura de um espaço com mesas embaixo da biblioteca, onde funcionava uma antiga lanchonete, para aumentar a quantidade de lugares para receber os alunos. 

Enquanto isso, no prédio ao lado, o restaurante da medicina segue em reforma. Não há sequer o prazo para a reabertura do espaço. “Não tem nenhuma previsão oficial, a gente só sabe que quando reabrir vai ser um bandejão igual a todos os outros”, afirmam João Pedro e Felipe Vieira, também estudante do curso de Medicina. A reportagem do JC procurou a diretoria da FM por meio da assessoria de imprensa, mas não teve retorno até o fechamento dessa edição.

Parado no bandejão

No Butantã, os estudantes contam com quatro bandejões distribuídos pelo campus: Central, Prefeitura, Químicas e Física. O Central oferece em média 4 mil refeições diárias, já o Restaurante da Química serve 1,8 mil. Um dos principais pontos de alimentação da USP, o Central é conhecido pelas longas filas, principalmente no início de semestre. Segundo a pesquisa feita pelo JC, 90,6% dos estudantes utilizam o bandejão no Central e o tempo de espera pode variar de meia a duas horas, a depender do dia da semana e do cardápio. Quem quiser comer frango empanado, vai enfrentar uma longa fila.      

Por esse motivo, alguns alunos se programam para chegar mais cedo, quando o restaurante ainda não está aberto. Esse é o caso de Vitor, estudante de História, que frequenta o bandejão diariamente e que já ficou duas horas e meia na fila, esperando para comer. “Eu costumo chegar às 16h para ser o primeiro da fila. Eu chego mais cedo para comer mais cedo e ir para aula. Se eu gastar muito tempo na fila, eu vou chegar atrasado para aula”. 

“Eu chego mais cedo para comer mais cedo e ir para aula. Se eu gastar muito tempo na fila, eu vou chegar atrasado para aula.”

Vitor, estudante de História

Já a estudante de Fisioterapia, Giovanna Galvão Scheidegger da Silva, que também faz parte do Centro Acadêmico XXI de Junho, explica que sua rotina é muito corrida, já que tem aula tanto no Butantã, quanto na FM, localizada entre Bela Vista e Sumaré. “A gente tem muitas aulas de manhã na FM e de tarde na Fofito (Dpto. de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional), que é lá no fim da Cidade Universitária, no último ponto dos circulares, no P3. É muito corrido, têm  as filas do transporte público e dos bandejões”. 

João Pedro Mendonça, estudante de Letras, que depende exclusivamente do bandejão para comer, relata que já deixou de jantar por causa da fila. “Eu fui para aula porque estava atrasado e tinha uma fila enorme”, lembra. Dos 128 alunos que responderam à pesquisa, 75,8% já deixaram de fazer refeições por causa da fila.

*Com edição de Samuel Cerri