Questão das ilhas de calor pode ficar de fora do Plano Diretor
Por Marcelo Teixeira*
De acordo com dados divulgados no primeiro relatório do Plano Diretor Participativo, áreas da Cidade Universitária como estacionamentos, espaços esportivos e a Praça do Relógio apresentam condições climáticas mais quentes e secas do que a média da Universidade. Apesar de contempladas no documento, as chamadas ilhas de calor não são mencionadas dentre as propostas da segunda fase do processo, e podem acabar sem soluções no novo Plano Diretor. A discussão sobre o tema ganhou força após o Brasil registrar a oitava onda de calor em 2024, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET).
“O termo ilha de calor é mais utilizado em escalas maiores, como a comparação entre municípios ou bairros”, explica Hugo Vilela, pesquisador e doutorando em climatologia urbana. “A Cidade Universitária pode ser considerada uma área de frescor em São Paulo, mas, em uma análise microclimática, como feita no Plano Diretor, é possível perceber temperatura e umidade distintas dentro do próprio Campus”. Diferenças na arborização, na área pavimentada e até nos materiais utilizados para tetos e chãos são fatores que contribuem para a variação climática de um lugar.
Os estacionamentos, por exemplo, são uma das fontes de ilhas de calor na USP por causa da presença de asfalto. Ele é inevitável em regiões com tráfego abundante de carros e especialmente capaz de reter a energia solar, aumentando a temperatura do solo e, consequentemente, do ar em volta.
Porém, a principal causa da variação térmica local, presente em todas as ilhas de calor identificadas pelo Plano Diretor, é a falta de arborização. “A presença de árvores é fundamental, não basta apenas um jardim ou um gramado”, explica Hugo. “Elas [as árvores] agem como verdadeiros ‘ares-condicionados’ naturais, criando sombra, diminuindo ventos e umidificando o ar”. Em locais como a Praça do Relógio e partes do Centro de Práticas Esportivas (CEPE) é pouca a presença de plantas ou qualquer tipo de sombra.
A exposição ao calor e à secura extrema por longos períodos de tempo, experienciada especialmente nesses espaços, apresenta sérios riscos para a saúde. A desidratação, a insolação e o câncer de pele tornam-se preocupações maiores para membros da comunidade USP, particularmente idosos, diabéticos, imunodeficientes e demais integrantes de grupos de risco.
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Alternativas
Para a professora de climatologia do departamento de Geografia da USP, Maria Elisa Silva, a solução principal do problema está na arborização. “Precisamos manter a cobertura de árvores que temos e expandi-la”, explica. O relatório da primeira fase do Plano Diretor também chega a essa conclusão e cita o aumento de áreas verdes como um passo importante para minimizar a formação de ilhas de calor.
Outras alternativas também poderiam ser utilizadas em conjunto com a arborização. De acordo com Hugo Vilela, “já existem uma série de materiais e tinturas que podem ser utilizados em áreas asfaltadas que diminuem o calor absorvido pelo chão”. Como adiciona a professora Maria Silva, “pode ser interessante a implementação de tetos verdes, como é feito em Singapura, que ajudam a refrescar o ambiente e o interior dos prédios, diminuindo a absorção de calor pelos telhados”.
Apesar disso, as propostas levantadas para discussão na segunda fase do Plano Diretor não aprofundam na questão das ilhas de calor. Quanto à arborização, por exemplo, é apenas citada a possibilidade da “elaboração de um plano de arborização urbana” para o Campus, sem mais detalhes. A diminuição de espaços asfaltados, comparativamente, tem maior profundidade, embora seja considerada apenas uma das possibilidades mais extremas na reforma da mobilidade interna da Universidade. Não há menção de trocas no material utilizado em ruas do Campus ou de implementação de tetos verdes.
*Com edição de Bárbara Aguiar