Pais e mães estudantes têm rede de apoio fraca

Alunos ainda encontram dificuldades para acessar os institutos de assistência que a Universidade fornece às crianças

Foto: Marina Giannini/JC

Texto por Gabriel Carvalho*

Em julho deste ano, foi sancionada a Lei Federal Nº 14.925, que, entre outros direitos, permite a prorrogação dos prazos de conclusão de curso superior em até 180 dias, por força de parto, de nascimento de filho ou de adoção. Segundo a decisão, as instituições devem “assegurar a continuidade do atendimento educacional e efetuar os devidos ajustes administrativos” para estudantes e pesquisadores de graduação e pós-graduação. Até então, a Lei Nº 13.536, de 2017, só previa a prorrogação de bolsas de estudo e pesquisa, mas não definia regras para o afastamento temporário de estudantes em virtude de gestação.

Glaucia Barreto é estudante de Design pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e de Design (FAU) da USP, e em 2022 descobriu estar grávida. Como o curso de design não era sua primeira graduação, ela pôde priorizar o filho. “Para mim, a graduação é um sonho, mas não uma prioridade. Desde o começo, meu foco se virou para atender as necessidades dele”.

A mãe diz sentir falta de uma rede de apoio institucional. “Parece que eles [a Universidade] têm medo de dar esse apoio por achar que isso incentiva algo”. Ela também aponta a falta de recursos básicos, como fraldário, em muitos dos institutos da Cidade Universitária. O Instituto de Geociências, onde ela fez sua primeira graduação, só passou a ter um a partir de ações das próprias estudantes.

Glaucia considera tentar uma vaga na Escola de Aplicação (EA) – órgão da Faculdade de Educação da USP que oferece vagas para alunos do ensino fundamental e médio – e diz querer que o filho estude nas creches da Universidade, por serem institutos de referência, mas que o processo para conseguir uma vaga é difícil. “As vagas são muito poucas. Eu estou esperando sair esse novo edital para tentar fazer a matrícula”, conta.

A Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) oferece aos filhos dos funcionários, docentes e estudantes da universidade, vagas em quatro creches e pré-escolas – duas delas na capital paulista, e as outras duas nos campi de São Carlos e Ribeirão Preto – que atendem crianças até os cinco anos de idade.

As inscrições para vaga, porém, só são abertas entre setembro e outubro, com ingresso apenas no ano seguinte. O período é significativamente anterior à divulgação de resultados das várias formas de ingresso na USP, que costuma acontecer em janeiro, o que faz com que ingressantes precisem aguardar quase um ano inteiro para que seus filhos comecem as aulas.

Na Escola de Aplicação, são abertas 60 vagas por ano, sorteadas em três categorias na seguinte ordem: as 20 primeiras são destinadas aos filhos de professores e funcionários da Faculdade de Educação da USP, as próximas 20 para filhos de professores e funcionários dos demais institutos, e as restantes para a comunidade externa. As vagas que não forem preenchidas por uma categoria, são fornecidas para a seguinte.

A professora Vivian Batista, diretora da EA, disse ao Jornal do Campus que a criação de uma política de ingresso específica para filhos de estudantes da universidade já foi debatida pelo conselho escolar, mas que ficou decidido que a atual distribuição de vagas era suficiente para suprir a finalidade da Escola.

TRANCAMENTO

“Eu procurei um jeito de não trancar o curso. Tentei ver se a FAU tinha algum tipo de licença maternidade, e não me deram essa informação”. O Serviço de Graduação da faculdade disse, em resposta à solicitação de Glaucia, que o afastamento para alunas não estava previsto na legislação, e o que poderia ser feito era “um acordo, que não é obrigatório nem oficial”, diretamente com cada um dos docentes.

“O primeiro semestre da criança exige muito de você, não tinha como conciliar a gestação, trabalho e ainda ir atrás de cada um dos meus professores para algo que nem seria oficial”, conta a estudante. Glaucia trancou o curso no segundo semestre de 2022, e só retornou à graduação dois anos depois, em 2024.

O trancamento de matrícula implica diretamente na perda do vínculo entre o estudante e a Universidade, o que acarreta uma série de impossibilidades acerca do fornecimento de bolsas e vagas nas creches.

Parece que eles [a Universidade] têm medo de dar esse apoio por achar que isso incentiva algo

Glaucia Barreto

Segundo o regulamento da PRIP para o Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE), estudantes que estejam com a matrícula trancada, independente do motivo, não têm direito ao auxílio. O edital de vagas das Creches Central e da Saúde, e dos campi de Ribeirão Preto e São Carlos, também da PRIP, exigem a comprovação de vínculo com a USP para a inscrição nas vagas.

A lei trabalhista no Brasil garante uma licença remunerada de até 180 dias, com garantia de continuidade no emprego. A lei de estágio, (Lei Nº 11.788 de 2008), porém, dita que, uma vez que essa modalidade não configura vínculo empregatício, as mães e gestantes que estejam em regime de estágio não serão abrangidas pelo direito.

Até o fechamento desta edição, a Pró-Reitoria de Graduação (PRG) da USP – órgão responsável pela gerência dos contratos de estágio – não respondeu aos questionamentos enviados pelo Jornal do Campus sobre as políticas de apoio da Universidade às mães e pais estudantes.

*Com edição de Nicolle Martins