Águas subterrâneas são subutilizadas em SP

Os reservatórios que abastecem poços artesianos da região metropolitana de São Paulo poderiam dobrar a capacidade de abastecimento da cidade

Na região metropolitana de São Paulo, as águas subterrâneas abastecem menos de 1% da população pelo sistema público. Armazenadas em formações geológicas, elas formam os aquíferos da cidade. De acordo com o professor Ricardo Hirata, vice-diretor do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas (CEPAS|USP) do Instituto de Geociências (IGc) da USP, a maioria dos poços (estrutura utilizadas para extrair recursos hídricos do subsolo) pertence a usuários privados. A partir desses reservatórios, são retirados cerca de 10 metros cúbicos de água por segundo, um número importante já que, no período da seca, a capacidade de extração de água do reservatório da Cantareira quase chegou nesse valor. Hoje, o manancial opera com 64,8% da sua capacidade.

Esquema que mostra a exploração de águas subterrâneas (imagem: Julio Viana)
Esquema que mostra a exploração de águas subterrâneas (imagem: Julio Viana)

Esse cenário mostra que os grandes utilizadores de águas subterrâneas são os aeroportos, postos de gasolina, condomínios, hotéis ou mesmo os proprietários individuais. Isso levanta uma importante questão: é possível retirarmos mais água dos aquíferos? Para o professor, esses reservatórios poderiam abastecer a região metropolitana de São Paulo duas vezes mais que abastece hoje, chegando a 20 metros cúbicos por segundo. Entretanto, devido ao número expressivo de poços necessários para serem operados, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) não teria condições de conduzir essa ação. “Uma das soluções seria mostrar às pessoas que os poços também são uma alternativa de abastecimento adicional”, ressalta Hirata.

O protagonismo da população

O estado de São Paulo possui uma lei que regulariza a exploração dos recursos hídricos da cidade. Para uma pessoa abrir um poço em sua casa, ela deve solicitar uma permissão. O governo analisa o número de captações da região e se a área não está contaminada ou não tem outra restrição, é permitida a perfuração. Depois desse processo, o proprietário faz uma análise química da qualidade da água e entra com o pedido de autorização (outorga) para o uso do recurso hídrico.

Para o professor Hirata, o Estado, ao invés de ter apenas um papel de fiscalização, também poderia ser um parceiro do usuário. Assim, incentivaria as perfurações em locais adequados, que não possuam uma densidade muito alta de poços. Além disso, criaria um apoio técnico para auxiliar na exploração dos recursos hídricos e fornecer informações sobre as análises químicas. “Se aumentasse a quantidade de poços privados, diminuiria a pressão em cima dos usuários públicos”, ressalta o pesquisador.

Isso seria uma mudança de paradigma, pois a gestão da água seria distribuída entre vários usuários. O professor ainda ressalta que o processo de outorga é muito caro e burocrático, fazendo com que muitos proprietários perfurem poços ilegalmente. Em 2009, a  Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo fez uma estimativa da quantidade de poços em operação na Bacia do Alto Tietê. Esse levantamento mostrou que cerca de 70% dos poços são ilegais. Hoje, segundo Hirata, esse perfil não mudou muito.

Optar pelo caminho ilegal pode trazer prejuízos para a qualidade da água. Quando o usuário solicita a outorga, o Estado exige uma análise química completa, para checar se o poço foi construído dentro das normas legais. No entanto, quem perfura e compra o serviço, muitas vezes, desconhece a relevância de fazer uma avaliação confiável da água. O Estado deveria, assim, fornecer informações sobre a importância dessas análises químicas, com qual frequência elas deveriam ser executadas e também atuar no credenciamento das empresas perfuradoras. “É um mercado que falta informação para o público”, destaca o professor.

 

Por Amanda Oliveira