Proibição de debates políticos gera insatisfação

Segundo a Procuradoria Geral, discussões não abrangeriam todos os lados; alunos discordam
foto: Ana Luisa Moraes

Uma interpretação da Procuradoria Geral da Universidade de São Paulo (PG-USP) sobre o artigo 73 da Lei Eleitoral, a 9.504/1997, tem impedido a realização de debates políticos no interior do campus da Cidade Universitária.

O parecer negativo emitido pelo órgão com relação a essas atividades considera que elas só podem ser admitidas “quando o evento for promovido em caráter institucional e desde que garantida a observância aos princípios da impessoalidade e moralidade administrativa”.

“Não é a situação tratada nos presentes autos, uma vez que a organizaçäo do evento é pretendida por associação de natureza privada, não sendo possível garantir a igualdade de tratamento e oportunidade entre todos os candidatos ao cargo de vereador”, diz o documento, referindo-se a um debate que o Centro Acadêmico Visconde Cairu (CAVC), da Faculdade de Economia e Administração (FEA), pretendia realizar.

O evento era previsto para ocorrer no dia 1º de setembro no auditório FEA-5 e possuía, entre os debatedores convidados, o ex-secretário municipal de cultura, Nabil Bonduki (PT), além de Mario Covas Neto (PSDB), Marina Helou (REDE), Ricardo Nunes (PMDB) e Sâmia Bomfim (PSOL).

O CAVC afirma que não é a primeira vez que surge um obstáculo à realização de debates do tipo na FEA. Nas eleições municipais passadas, em 2012, ocorreu a mesma situação. “Nos dois casos, os esforços do CAVC em mostrar que o evento não pretendia privilegiar nenhum grupo, mas expor as grandes forças e pautas das eleições municipais, foram em vão”, observa. O centro acadêmico ainda tem a intenção de realizar o evento, agora em 22 de setembro, dizendo-se comprometido com questões relevantes do cenário político fora da Universidade.

Em nota de repúdio publicada em 24 de agosto denominada “Um peso e duas medidas?”, a organização cunhou a diretoria da FEA como “parcial” por ter feito um evento com João Doria, hoje candidato a prefeito pelo PSDB em São Paulo, e, ao mesmo tempo, ter acatado o parecer negativo da PG que vetava o debate com candidatos ao cargo de vereador.

O diretor da unidade, Adalberto Fischmann, pontua que à época em que o evento foi feito, em 4 de maio, Doria não era oficialmente candidato pela sigla tucana, embora já houvesse vencido a prévia peessedebista batendo Andrea Matarazzo em segundo turno. Fischmann disse também que a temática do encontro, cujo nome era “Conjuntura Política e Econômica da Cidade de São Paulo”, visava discutir questões empresariais da alçada profissional do postulante à Prefeitura paulistana, e que “a FIA (Fundação Instituto de Administração) fez o convite, tendo a FEA hospedado o evento”.

Segundo Luiz Carlos Santos Gonçalves, Procurador Regional Eleitoral de São Paulo, o debate que propunha o centro acadêmico feano é uma “questão controvertida”, já que, para a realização de encontro envolvendo candidatos a vereador, todos os competidores — no caso, seriam 1315 — haveriam de ser, no mínimo, convidados a fim de que não fosse afetado o nível de exposição dos concorrentes na disputa eleitoral. “Se um só ficar de fora (de ser no mínimo convidado), vai se dizer que o debate beneficiou os demais, fazendo incidir a vedação do artigo 73, com graves consequências para o administrador público e para os candidatos beneficiados”, aponta ele. Isto corresponde a uma limitação imposta estritamente em tempos eleitorais, “destinada a assegurar a igualdade de candidatos” quando se diz respeito ao uso de bens públicos e comuns, caso do espaço uspiano.

Justificando o parecer, a PG afirma que “a questão, de acordo com a lei, é que todos os candidatos devem ser convidados para a sabatina ou debate”, e deu como exemplo a jornada eleitoral da Superintendência de Comunicação Social (SCS) com todos os candidatos a prefeito de São Paulo. “Alguns não compareceram, mas todos foram convidados”, diz.

Também outro debate, que ocorreria na Faculdade de Educação (FE) e era promovido pelo Centro Acadêmico Professor Paulo Freire (CAPPF), foi cancelado em virtude do mesmo parecer que impediu o evento do CAVC. Segundo disse o CAPPF, o texto é tão idêntico ao repassado à organização estudantil da FEA que a Procuradoria Geral da USP não se deu “nem ao trabalho de ao menos alterar o nome do centro acadêmico”. O debate teria lugar na própria FE, às 18h do dia 20 de setembro, e contaria com o ex-senador Eduardo Suplicy (PT), o militante do Movimento Brasil Livre (MBL), Fernando Holiday (DEM), e Diana Assunção (PSOL).