Mostra de cinema soviético no IEE se estende pelas férias

Não é só no Cinusp e na Escola de Comunicações e Artes que se pode ver e fazer cinema na USP. Tampouco é a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas o único lugar onde o Centenário da Revolução Russa recebe homenagens na Universidade. As palavras são de Thiago Brito, presidente da Associação de Pós-Graduandos (APG) do Instituto de Energia e Ambiente (IEE), organizadora da Mostra de Cinema Soviético e Russo: 100 Anos da Revolução de Outubro, que começou em maio e tem programação prevista até novembro.

Com uma seleção de 26 filmes russos e soviéticos legendados em português, a maioria deles inédita no Brasil, a mostra procura abranger todo o período de 100 anos da Revolução Russa através do cinema, pelo olhar do próprio país. Entre os eventos estão a Rússia pré-revolucionária, a 1ª Guerra Mundial, a própria Revolução de Outubro, a Guerra Civil, o Comunismo de Guerra, as políticas econômicas soviéticas como a NEP (Nova Política Econômica) e o Plano Quinquenal (industrialização acelerada e coletivização do campo), a 2ª Guerra Mundial, a consolidação do socialismo, o retrocesso revisionista, a restauração capitalista e o período atual.

Essa abordagem ampla compreende filmes de diferentes estilos, gêneros e épocas, sendo o mais antigo o longa-metragem de Serguey Eisenstein O Velho e o Novo, de 1929 — a ser exibido no dia 3 de agosto —, e o mais recente a produção de 2012 Tigre Branco, de Karen Shakhnazarov, que concorreu ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e abriu a mostra, no dia 4 de maio. A programação é estruturada em ciclos de acordo com o contexto histórico retratado em cada filme, e ao fim de cada ciclo é realizado um debate. As sessões são gratuitas e sempre às quintas-feiras, às 17 horas, no Auditório do IEE.

A mostra

Segundo o presidente da APG, Thiago Brito, um dos motivos para a criação da associação foi promover a integração dos alunos do IEE, que oferece apenas programas de pós-graduação. Uma das integrantes da APG, Mariana Moura, trouxe, então, a ideia de fazer uma mostra de filmes, a partir de uma conjunção de fatores favoráveis. “Cineclubes são tradicionais e são ótimos para integrar as pessoas e gerar debates. Já se fazia isso aqui na USP na época da ditadura, por exemplo, então era uma ideia. Com a inauguração do Auditório do IEE no começo do ano, as meninas aqui do Instituto projetaram um filme lá no Dia das Mulheres, e percebi que já tínhamos condições de fazer uma mostra”, conta Mariana.

“Eu costumo frequentar as sessões de cinema do Centro Popular de Cultura da União Municipal dos Estudantes Secundaristas (CPC-UMES), e a produtora deles lançou esse ano uma série de filmes soviéticos. Como 2017 é o centenário da Revolução Russa, decidimos fazer uma parceria com o CPC para abordar esse tema”, completa.
Os debates também eram uma ideia desde o início, conta Thiago: “Quando a Mariana trouxe a ideia da mostra e dividimos os ciclos de filmes de acordo com o contexto histórico, pensamos que uma boa forma de fazer debates proveitosos seria organizá-los ao fim de cada ciclo”. O primeiro e único debate até aqui ocorreu no dia 8 de junho, após a exibição do filme Lenin em Outubro, de Mikhail Romm, quando o professor de Economia Nilson Araújo de Souza fez uma exposição sobre as condições econômicas que levaram à revolução. Os próximos debates estão programados para acontecer em 20 de julho, após a exibição de 12 Cadeiras, de Leonid Gayday, e em 24 de agosto, depois de Aleksandr Nevsky, de Serguey Eisenstein.

Entre os destaques da programação dos próximos meses, Mariana cita Chapayev, de Georgi e Serguey Vassiliev, com exibição em 6 de julho e O Velho e o Novo, de Serguey Eisenstein, que será exibido em 3 de agosto. “Eisenstein é um dos mais famosos diretores soviéticos, e seu filme é interessante em particular não só por retratar o movimento de coletivização da agricultura, mas também pela sua produção, que foi interrompida e repensada várias vezes até ser concluída”, diz. “Já o Chapayev mostra um contraponto à tese de muitos críticos de cinema de que o cinema soviético é chapa branca, pois conta a história das disputas ideológicas e da profunda contradição entre o campo e a cidade na época da revolução.”

Segundo os organizadores da mostra, além da possibilidade de assistir a filmes raros, de diferentes estilos e de difícil acesso, ela promove uma nova visão dos fatos históricos. “Quando se assiste a um filme norte-americano sobre a Revolução Russa, inevitavelmente haverá um ‘ruído’. É bem diferente ver como os próprios russos enxergavam esse e outros momentos de sua história, e como expressaram suas impressões no cinema. Além disso, para quem gosta de História, como eu, a mostra é muito interessante para conhecer mais não só sobre os 100 anos da União Soviética, mas sobre a história mundial, que foi muito influenciada pelo que aconteceu naquela região”, afirma Mariana.

Interdisciplinaridade

Tanto Mariana quanto Thiago têm formação em Relações Internacionais (RI). Ela fazia pesquisas sobre meio ambiente, a partir das quais chegou ao IEE para seu doutorado; ele escreveu um trabalho de conclusão de curso sobre energia nuclear e as relações diplomáticas necessárias para que um país possa iniciar atividades nesse ramo, e hoje pesquisa combustíveis alternativos no Instituto. “Essa interdisciplinaridade faz parte da proposta do IEE, e logo percebemos que estaria presente na mostra também”, diz Thiago.

“Desde o início nos questionamos o que uma mostra de cinema soviético teria a ver com um instituto de pesquisas em energia e meio ambiente? Esse é o debate sobre a extensão universitária: se temos essa estrutura e ela é pública, por que não usá-la? Não temos que ser um instituto de pesquisa histórica, social ou artística para fazer uma atividade como essa, a proposta é justamente integrar a comunidade aqui do IEE e da USP”, explica o presidente da APG.
“Em RI temos uma linha de pensamento que acredita que é importante conhecer um pouco da história, da formação política e cultural de um povo para poder chegar a decisões de política externa em relações multilaterais, por exemplo. Tem muita gente aqui no Instituto estudando os BRICS do ponto de vista de energia, então estuda-se a Rússia, gás na Rússia, por exemplo. Então, além dos pontos que o Thiago colocou, acho que faz todo o sentido essa mostra aqui, e pretendemos fazer outras no futuro”, afirma Mariana.

Serviço

A Mostra de Cinema Soviético e Russo: 100 Anos da Revolução de Outubro, continua até novembro com sessões todas as quintas-feiras, exceto feriados, sempre às 17 horas, com entrada gratuita. As exibições são feitas no Auditório do IEE, na Avenida Professor Luciano Gualberto, 1289, na Cidade Universitária. A programação completa e pode ser obtida através do e-mail da APG: apgdoiee@gmail.com.