TJ-SP determina reabertura de creche da USP

Stephanie Pumarino e sua filha, Rosa. Ocupação defende direito de crianças e mães de estarem na USP (Foto: Carolina Marins)

A recepção de novas crianças na Creche e Pré-Escola Central e a emissão de um mandado de segurança que exige a reabertura da Creche e Pré-Escola Oeste, na Cidade Universitária, indicam uma nova fase das disputas pela educação infantil na USP. Divulgados no último dia 21, o mandado e o início das aulas ocorreram após anos sem novas vagas nas creches uspianas. A questão se inflamou com a ocupação da unidade oeste do campus da capital em janeiro.

O mandado de segurança, emitido pelo juiz Kenishi Koyama, da 11ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), respondeu à ação da Associação de Pais e Funcionários da Creche Oeste (Apef), que pediu a suspensão da incorporação pela Reitoria da unidade oeste com a Creche e Pré-Escola Central. A medida contrariou decisão do Conselho Universitário (CO), que votou pelo preenchimento de vagas ociosas no limite da capacidade das creches no ano passado.

“A Reitoria diz que abriu 59 vagas (na Creche Central), mas não lembra que tirou mais de cem”, diz Nani Figueiredo, professora de educação infantil na USP. Com a incorporação de uma creche à outra e o fechamento de um dos prédios, a resolução estabelecida pelo CO, na prática, não se cumpriu.

No documento, o juiz reconhece que a realocação, embora não corresponda formalmente à extinção da unidade, acaba esvaziando-a. Por conta disso, a medida configura “desvio de finalidade”, já que, de acordo com o Estatuto da USP, a extinção de órgãos internos cabe apenas ao CO. O prazo dado para a reabertura da creche foi de 40 dias úteis e o não cumprimento da ordem pode resultar em multa de R$ 1 mil por dia após 19 de maio.

Após a liminar, a Apef quis acordar a desocupação do prédio, deflagrada quando se anunciou o fechamento do local (leia mais abaixo). Também foi marcada uma reunião de negociação para a reabertura. Contudo, segundo a associação, a Reitoria tem negado a proposta.

NOVAS VAGAS

A decisão do CO pelo preenchimento de vagas foi tomada em 8 de novembro do ano passado. Na ocasião, foi discutida a inclusão de uma emenda sobre o assunto no tópico de Diretrizes Gerais das Diretrizes Orçamentárias da USP. 38 conselheiros foram favoráveis à medida, 36 se colocaram contra e 13 se abstiveram.

Segundo a estudante e mãe Stephanie Pumarino, que faz mestrado no Instituto de Matemática e Estatística (IME) e acompanhou a mobilização pelas creches até o ano passado, o principal argumento dos conselheiros foi o desempenho das creches em atividades de ensino, pesquisa e extensão. “A permanência é importante, mas não o único papel que a creche cumpre aqui”, destaca. De 2009 a 2014, só a Creche Oeste foi tema de 15 pesquisas, apresentou 55 trabalhos acadêmicos, teve 125 estagiários e recebeu 1165 visitantes de todo o Brasil.

A justificativa para a suspensão de novas vagas, desde 2015, esteve relacionada ao Plano de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV), que, até este ano, tirou 30% dos funcionários das creches. Em esclarecimento da assessoria de imprensa, a Reitoria chegou a apontar os valores que a USP economizaria desligando suas creches. A Apef, no entanto, apresenta dados discordantes, e, em novembro, conselheiros também apontaram que a reabertura não seria prejudicial às contas. A questão, no entanto, não é um consenso.

PROBLEMAS

17842073_775281992645173_581387842_nApesar da conquista, a seleção das crianças neste ano foi criticada. No caso da Creche Central, reclamou-se da pouca divulgação do edital, da não realização de entrevistas com as famílias, do número baixo de crianças para a pré-escola e da desproporção entre a seleção de filhos de docentes, estudantes e funcionários. As mães falam, principalmente, da falta de esclarecimento quanto aos critérios de seleção.

Um exemplo é o de Bianca Andrade, servidora de nível básico no Hospital Universitário, cuja filha não conseguiu vaga na creche. “No começo, fiquei esperançosa, pois vi no edital que o critério de seleção seria sócio-econômico. Na hora da entrega dos documentos na SAS, contudo, uma funcionária me disse que não”, conta. Quando saiu o resultado, Bianca pesquisou a relação de selecionados e percebeu que apenas seis pessoas do nível básico haviam conseguido vagas; em contrapartida, doze filhos de docentes se matricularam. “Que critério foi usado? Quando um docente ganha [em relação a nós]?”, pergunta.

O JC procurou a administração da Creche Central, mas, devido à sobrecarga de trabalho e à falta de autorização da SAS, eles não puderam responder. A Superintendência também não falou com a reportagem.

COM OCUPAÇÃO, CRECHE OESTE FICA “ABERTA”

A ocupação na Creche e Pré-Escola Oeste ocorreu em 17 de janeiro, um dia após o anúncio de seu fechamento, quando pais, estudantes e professores impediram que um caminhão enviado ao prédio retirasse seus equipamentos e móveis. Com articulação rápida, o movimento logo divulgou o acontecido e organizou eventos junto à comunidade uspiana, intitulando-se “Ocupação Creche Aberta”.

Além da preservação do patrimônio, os ocupantes reivindicaram a reabertura da Creche Oeste e o preenchimento das vagas ociosas em todas as unidades da USP, conforme decisão do CO. Exigiram também diálogo do reitor com as partes envolvidas.

Para se manter de pé, a creche, de fato, “abriu”: o prédio é acessível a todos que queiram conhecê-lo, e os ocupantes promovem eventos tanto para informar e atrair apoio quanto para a coleta de recursos. Inspirados na autogestão, eles oferecem almoços às quintas-feiras e uma “pizzada” nas noites de sexta, sempre abertos ao público. O preço das refeições é definido pelos próprios consumidores.

Após oitenta dias, a ocupação conta com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), da Associação dos Docentes da USP (Adusp), do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e de centros acadêmicos.

Atualização

Na última sexta-feira (7), dois dias após o fechamento desta matéria, a técnica de apoio educativo Sandra Regina Alves Naletto, da Divisão de Creches e Educação Infantil da SAS, enviou esclarecimentos ao JC. No texto, Sandra afirma que o número de crianças matriculadas neste ano nas creches em São Paulo – 4, na Creche da Saúde e 58, na Cidade Universitária – possibilita a manutenção da qualidade do atendimento e bem-estar do local. Além disso, afirma que o prédio da Creche Central – agora chamada de “Creche Cidade Universitária” – tem comportado a todos com segurança e conforto. As outras creches administradas pela Superintendência, localizadas em São Carlos e Ribeirão Preto, também mantêm o atendimento às crianças, embora, em janeiro de 2017, seu comando tenha sido passado às prefeituras dos campi. Sobre o mandado de segurança e o rumo que as creches terão em 2017, a SAS diz apenas que primará pela qualidade do atendimento a crianças e famílias e acatará às orientações dos órgãos centrais da Reitoria.

Ainda na sexta-feira, a Ocupação Creche Aberta recebeu a chegada de uma oficial de justiça, que veio acompanhada da Guarda Universitária, de um advogado da Procuradoria Geral da USP e da Polícia Militar. A oficial notificou aos ocupantes um pedido de reintegração de posse solicitado pela Universidade, com prazo de 72 h para retomada do prédio e uso da força policial. O JC está acompanhando a repercussão do caso e pretende informar os próximos acontecimentos em breve.