O sentimento ambíguo de viver seu primeiro ano da graduação (e todas as experiências que ele carrega) longe da faculdade
Por Bianca Muniz
O primeiro ano da graduação costuma ser cheio de novidades: primeiras aulas, novos colegas e aprendizado fazem desse período um momento decisivo para conhecer muitas das possibilidades que a universidade oferece para além do ensino e da pesquisa. Mas como aproveitar este momento diante de uma pandemia que, além de causar milhares de mortes e escancarar desigualdades, interrompeu diversas atividades cotidianas — incluindo as aulas?
Quatro meses após a matrícula dos ingressantes de 2020, o Jornal do Campus conversou com calouros e veteranos da USP para entender como ocorreu essa recepção.
Assim que as listas de aprovados do Sisu e da Fuvest são divulgadas, é comum os veteranos procurarem os ingressantes nas redes sociais para recebê-los virtualmente antes da matrícula. Essa foi uma preocupação do CAEP (Centro Acadêmico de Engenharia de Produção da Escola Politécnica): “Desde o momento em que saiu a primeira lista de ingressantes, buscamos cada um dos bixos da Produção para se apresentar, explicar um pouco como é a Poli e adicioná-los nos grupos de Facebook e Whatsapp. A partir daí, organizamos eventos nas férias e acompanhamos de perto a semana de recepção”, conta Marina, integrante do centro acadêmico.
Apesar da pandemia interromper de forma precoce o semestre de aulas e todos os eventos presenciais na Universidade, as atividades da semana de recepção de calouros conseguiram passar um pouco das oportunidades que a USP e a vida universitária oferecem. Roberto Matheo, calouro de Engenharia Mecânica e Danilo Panda, de Pedagogia, concordam que a semana de recepção conseguiu apresentar seus respectivos cursos, sua inserção na sociedade e as diferentes entidades estudantis. “Conheci muitas pessoas envolvidas nas entidades e comissões de representatividade discente e tivemos discussões a respeito da educação e como ela tem sido vista nesses últimos tempos dentro desse cenário de governos liberais”, relata Danilo sobre as atividades na Faculdade de Educação.
No entanto, nem todos os alunos conseguem participar dessas atividades, principalmente aqueles que foram aprovados nas últimas listas do vestibular. É o caso das ingressantes em Gestão Ambiental, Nina Pasi e Gabriella Almeida. “Quando eu cheguei já tinha até trabalhos com grupos formados, mas todo mundo foi muito convidativo, muito ‘gente boa’ comigo”, conta Nina, que entende que os grupos no Whatsapp e Facebook com outros alunos da Each foram essenciais para conseguir se situar entre as tarefas acadêmicas e as entidades estudantis.
Acolhimento virtual
Um ponto que calouros e veteranos concordam é a importância da conexão nas redes sociais para acolher os estudantes, na falta de um contato presencial. Helena Leite, aluna de Relações Públicas na ECA, entrou no coletivo negro Opá Negra, na bateria universitária e participou de atividades da ECA Júnior logo nas primeiras semanas de aula. A suspensão das atividades presenciais não impediu que as entidades parassem com a recepção. “Deu pra ver que todas as entidades deram um jeitinho para se adaptar. Por exemplo, a BaterECA estava fazendo como se fosse um ‘EAD’ para ensinar os calouros a tocar as sequências de ritmos”, explica Helena, que aprendeu com os veteranos da bateria como criar instrumentos improvisados para ensaiar em casa.
As poucas semanas que separaram as matrículas dos novos alunos e a suspensão das aulas presenciais na USP podem não ter sido suficientes para muitos alunos conhecerem os colegas e criarem laços de amizade. Para o CAEP, isso afeta o sentimento de pertencimento à universidade e restringe a vivência universitária à experiência acadêmica. “Apesar do contato virtual, ele não é suficiente para estabelecer todo o apoio para aqueles que precisam de ajuda”, conta Marina. Além disso, há a dependência de boa conexão de internet para as aulas, reuniões de entidades e outras atividades online — o que prejudica a adesão dos novos alunos ao ambiente universitário e ao EAD.
Webfestas, competições e calls
Danilo também acredita que a experiência virtual prejudica a interação, mas aponta um outro motivo: a perda das famosas festas universitárias. “Essa reunião para conversar e conhecer pessoas, desenvolver vínculos não somente acadêmicos, mas de amizade e companheirismo entre nós ficou um pouco problemática diante da situação de pandemia”, conta.
Uma das saídas que os alunos encontraram para minimizar a expectativa frustrada da ausência de festas e eventos, foi recriar, no ambiente virtual, os espaços e situações que seriam comuns na vida rotina na faculdade. A Quinta I Breja, festa em defesa dos espaços estudantis da ECA, foi recriada no jogo Habbo Hotel; rodas de conversa de coletivos e reuniões de empresas juniores foram adaptadas para o Google Meets. Até mesmo as competições universitárias foram transferidas para o Facebook, por meio de desafios de “likes” e compartilhamentos entre faculdades.