Lei de direitos autorais prejudica uspianos

Poder copiar no máximo um capítulo de livro é insuficiente para permitir que alunos tenham acesso a toda a bibliografia dos cursos

O nova gestão do Ministério da Cultura, encabeçada por Ana de Hollanda tem trazido preocupações para os defensores da reforma da lei de direitos autorais, cujo projeto está passando por Consulta Pública. Logo em sua primeira coletiva de imprensa, a cantora defendeu o ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) e a necessidade de cautela em relação às mudanças propostas para a lei. Houve também uma mudança do licenciamento do site do órgão, que deixou de estar sob o Creative Commons, que permite cópia e compartilhamento dos conteúdos.

Para professores e alunos é bem fácil infringir a lei 9.610, chamada Lei de Direito Autoral. O texto de 1998 não permite que músicas, filmes, fotos e cópias de textos (mesmo os esgotados) sejam usados com fins didáticos. Um estudo do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpopai–USP), ilustra bem como a compra de livros pesa no orçamento dos estudantes: para mais de 75% dos alunos, os custo anual para comprar de livros chega perto ou até ultrapassa sua renda total familiar. Além disso, mais de 30% da bibliografia obrigatória dos cursos da USP estão esgotados, de acordo com o mesmo estudo.

Cópia e castigo

Atualmente, xerocar trechos de livros é ilegal, ao mesmo tempo prática comum em quase todos os cursos. Por toda a universidade, podem ser vistos estabelecimentos com pastas cheias de textos deixados por professores. Um dono de diversas fotocopiadoras existentes dentro do campus, que não quis se identificar, conta que em 2005 ele e vários estabelecimentos sofreram investigações da ABDR, Associação Brasileira de Direitos Reprográficos. “Não fomos punidos, mas soube de casos de outras universidades que tiveram que fechar suas xerox. Apenas proíbo que alunos copiem livros inteiros, mas não interfiro no material que os professores deixam nas pastas”, diz.

Para o professor de gestão de Políticas Públicas e membro do Gpopai, Jorge Machado, pesquisadores de universidades públicas que proíbem cópias de suas publicações geram uma dívida com a sociedade. “Quando existe financiamento público por trás de uma obra, a publicação é apenas a coroação de um processo que envolve toda a sociedade. Restringir o acesso à informação é muito mais grave do que permitir que seja feita de uma forma acessível, que é a xerox”.

Depois dos imbróglios com a ABDR, a USP tem desde 2006 uma resolução  que permite cópias de pequenos trechos dos livros para uso privado do aluno, sem intuito de lucro. Esses pequenos trechos, no entanto, se limitam a um capítulo de livro. A medida também foi adotada pela FGV, PUC, Unicamp e UFRJ. Mas na prática, a situação é bem diferente. Paulo Macedo, aluno da FFLCH, conta que já xerocou diversos livros inteiros, em fotocopiadoras dentro do campus. “Quando o livro é caro ou difícil de achar, eu xeroco. Claro que fica mais desorganizado, mas não vejo saída com os livros no preço que estão”.

“A USP fez um avanço com essa resolução, pois as investigações cessaram desde então. No entanto, ainda temos muito que lutar para que a lei deixe de estar em descompasso com a democratização e a cultura do compartilhamento”, diz Jorge.

Em outras universidades, a situação é mais difícil, como explica Geraldo Vilela, ex-aluno do Mackenzie. “Os textos são distribuídos xerocados por professores. Xerox de livro dentro do Mackenzie não pode! Já fora, é uma festa danada. Havia inclusive a recomendação de um ‘point da xerox liberada’ entre os alunos.”

A saída que Jorge Machado vislumbra, além da reforma na lei, é que as editoras se abram mais à venda direta nas universidades, ampliando as conhecidas feiras de livros. “Sem a consignação das livrarias, os livros chegam mais baratos ao consumidor. No entanto, muitas editoras que se abriram a essa prática já foram repreendidas pela Câmara Brasileira do Livro”.

Xerox de textos é preferência de alunos da USP (foto: Firas Freitas)
Xerox de textos é preferência de alunos da USP (foto: Firas Freitas)