A instalação, na FEA, de catracas para controle de acesso gera discussões quanto às suas despesas e custos, além de levantar questionamentos sobre até que ponto a medida traz segurança ou separa mais o ambiente universitário da sociedade
A proposta de instalação de catracas na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, após ser aprovada em plebiscito realizado no final de maio do ano passado, começa a se materializar aos poucos. O resultado da votação, em termos de número de votos, foi contrário ao emprego das catracas; 71% dos alunos, por exemplo, reprovaram o projeto. Contudo, ele venceu entre professores e funcionários. Como estas três categorias tinham o mesmo peso na decisão, saiu vitorioso o projeto de “controle de acesso”, conforme alcunhado pelo diretor da FEA, Reinaldo Guerreiro, que acredita que a ideia de catracas seja “pejorativizada e agressiva”.
De acordo com ele, este projeto havia sido encomendado a uma empresa de ex-alunos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP e encontra-se agora em fase de análise. Neste momento, o processo de licitação das obras está em andamento. O diretor informou que os reforços começarão nos próximos meses e que seu orçamento estimado é de R$ 1,2 milhão.
“Até o final do ano temos que tomar uma decisão para dar início às obras. Neste segundo semestre elas terão de estar ao menos licitadas”, afirmou.“É um mega projeto! Vai ficar bonito! Tem que ter tecnologia. Por exemplo, já temos câmeras, aí também vai ter todo um processo de integração. Tem a parte física que precisa ser colocada, além da parte dos fundos”, definiu o diretor.
Segundo informações fornecidas pelo representante discente (RD) do Conselho Técnico-Adminstrativo (CTA), Caio Callegari, o orçamento que está sendo analisado nesta fase do processo de reforma é o da empresa Global e divide o valor de R$ 1,2 milhão em R$ 410 mil na reforma da entrada principal e R$ 775 mil na dos fundos. Tal montante, porém, não engloba a compra dos equipamentos de controle de acesso, conforme apontado pelo RD. Guerreiro, contradizendo tal informação, garantiu que este valor abarca todas as despesas da obra.
O diretor explicou que o processo de remodelagem da fachada principal (Av. Prof. Luciano Gualberto) será simples. Haverá apenas a reposição da vidraça da entrada (com as portas automáticas) alguns metros à frente do lugar em que se encontra atualmente e o acréscimo de uma cobertura de vidro entre tal vidraça e o início do hall, onde serão instaladas uma nova portaria e as catracas.
A entrada dos fundos, por sua vez, terá a fachada e o entorno totalmente reformados, já que, conforme analisado pelo diretor, “lá vai ser uma parte nobre, com o Centro de Difusão Internacional”.
Apesar de a categoria dos professores ter se posicionado a favor da implantação das catracas de acesso na FEA no plebiscito que ocorreu ano passado, há os que, dentro desta camada, são contrários ao projeto. O professor Alexandre Saes, que ministra as disciplinas História Econômica e Formação Econômica do Brasil, é exemplo disso. Saes, assim como o diretor Reinaldo Guerreiro, apresentou os argumentos de sua posição.
Segurança
Reinaldo Guerreiro: A segurança se dá através de um conjunto de elementos. Eu não vejo a catraca como aquilo que vai resolver o problema de segurança. A catraca é vista de uma maneira pejorativa, como uma coisa agressiva. Eu sou diretor da FEA e, sendo responsável pelas pessoas que estão na FEA, é uma boa política deixar quem quiser entrar aqui na hora que quiser, sem se identificar? Só porque isto aqui pertence ao estado de São Paulo qualquer um tem o direito de ficar entrando? Qualquer aluno da USP terá acesso à FEA com seu cartão. Se a pessoa não for da comunidade USP, ele terá apenas que se identificar. Não estamos cerceando o direito de ninguém, nem perguntando o que as pessoas estão vindo fazer aqui.
Alexandre Saes: Eu acho que a catraca, em si, não resolve potenciais crimes e problemas. Pode até ter uma redução do número de furtos, mas a catraca não te garante isso.
Acredito que o problema de colocar essa restrição, mesmo contando que, teoricamente, qualquer pessoa vá ter autorização de entrar mediante apresentação, é que ela reforça um problema da própria universidade. A USP já tem uma certa distância da sociedade e, em algum nível, a Faculdade de Economia tem uma certa distância das outras faculdades dentro da USP também, ainda que isso seja um pouco estigmatizado.
Controle de Acesso
RG: O controle de acesso nunca impede o direito de ir e vir. Ele apenas traz um nível de responsabilidade maior para o ambiente público. Ambiente público não significa que tem que haver bagunça. O público é para ser de todo mundo, e dele as pessoas cuidam melhor. A USP é um dos maiores patrimônios do Brasil, então temos que cuidar de cada detalhe dela. Uma universidade pública não significa que todos podem entrar e fazer o que quiserem.
AS: Eu acho que a FEA é uma das faculdades que mais tem eventos abertos para toda a comunidade, o que às vezes traz a discussão de atrair pessoas muito restritas. Claro que isso não é a catraca que vai fazer, mas é um símbolo muito forte de reforço a esse problema. E, claro, mais do que tudo, é um projeto que é muito custoso, um recurso volumoso que vai ser gasto para isso e acredito que com uma efetividade baixa. O recurso poderia ser usado para tantas outras coisas, outras atividades.
Quanto a colocar mais ou menos segurança, hoje acho que já temos algo ostensivo que é câmera em todos os lugares. Todos os alunos e professores estão sendo filmados, e eu não sei até que ponto isso resolve.
Acho que talvez seja válido, por questão de controle para produtos, em institutos como a Física, o IPEN, a Química.
Isolamento
RG: Eu não quero cercear, não quero fazer discriminação, não quero saber de onde a pessoa é. A gente começa a ser rodeado de universidades particulares, que não têm uma biblioteca como a nossa – a melhor da América Latina na área. Então os alunos dessas faculdades vêm aqui estudar. Pois bem. Sejam bem-vindos! Só que tem uma coisa: é justo que quem entre na nossa casa tenha que se identificar.
AS: A FEA tem uma biblioteca extraordinária, que tem um acervo riquíssimo em ciências humanas. O problema é se criar barreiras que impeçam que os outros desfrutem disso. Infelizmente, nota-se que tem uma tendência a isolar um espaço que poderia ser muito mais rico: os cursos poderiam ter muito mais alunos de outras faculdades, um trânsito mais aberto não só entre as pessoas da faculdade, mas entre as pessoas de fora da faculdade também.
Votação
RG: Sabe por que os alunos tiveram tanta votação contra? Porque o CA fez um trabalho enorme para conseguir esta votação, como se fossem eleger um canditado, enquanto eu não fiz campanha junto a professores e funcionários. Os que votaram a favor do projeto, estavam conscientes disso. Não estou dizendo que os alunos não estavam conscientes, mas houve um trabalho muito intenso do CA. Sem ele, o resultado dos alunos seria muito menos expressivo.
Além disso, acho esse modelo justíssimo. Estou aqui há 23 anos, praticamente moro aqui dentro da escola. Meus funcionários estão há 10, 15, 20 anos, enquanto os alunos apenas passam por aqui.
AS: Acho que esse debate não é só da faculdade. Ele reproduz um sistema eleitoral que é da universidade, com a questão da proporção diferente de votos entre cada uma das categorias da universidade. Eu vejo que isso pode ser um problema, porque não é efetivamente democrático. Entendo os argumentos que falam que tem que ser diferente porque os alunos ficam quatro, cinco anos; os professores, 30 e os funcionários também tanto quanto os professores. Então há um entendimento da política da universidade que é diferente, mas eu também não sei se tem que ser ou não.
Alternativas
RG: O projeto das catracas foi feito aqui dentro da FEA. Quando pessoas que são PhDs, doutores nos assuntos de gestão, chegam à conclusão de quais recursos precisam ter, só se eu contratar uma consultoria multinacional para fiscalizar se estamos conceitualmente corretos ou não.
Isto aqui foi feito por pessoas de credibilidade. A USP está sendo toda rasgada para fazer o projeto de iluminação. E o professor Colombo, prefeito do campus, quer que a FEA seja a unidade piloto. É um projeto maravilhoso, de altíssima tecnologia, fora de série.
AS: Acho que a catraca não resolve e limita ainda mais a circulação, além da questão do custo. A iluminação é uma coisa que ainda está fora da faculdade, resolvendo o ambiente mais geral e continua com com furto porque ainda tem uma livre entrada de pessoas dentro do prédio.