ECAtlética suspende tradicional Quinta & Breja por tempo indeterminado após vários casos de sequestros
Por mais que os casos de violência na USP não sejam novidade, a situação chegou ao seu limite, principalmente nos arredores das tradicionais festas universitárias. O clima de insegurança levou a ECAtlética, organizadora da Quinta & Breja, a suspendê-la por tempo indeterminado, repetindo o ocorrido em setembro de 2012. “O vice-presidente na época sofreu um sequestro-relâmpago. Se isso aconteceu em 2012, que a violência era bem menor, por que não pode acontecer agora?”, questiona Gustavo Pessutti, presidente da ECAtlética.
W. V., estudante de inglês na FEA, foi vítima de um sequestro-relâmpago no último dia 8 de maio. Enquanto abria o porta-malas do carro de uma amiga, no estacionamento entre a Prainha e os bancos, foram abordadas por quatro rapazes. O sequestro durou três horas. Ao passarem por um carro da ROTA teve início uma perseguição que culminou com um acidente e, finalmente, com a prisão dos criminosos. “Depois que aconteceu isso comigo, fiquei realmente pensando no que poderia melhorar na Cidade Universitária. Eu não consigo pensar numa solução, porque é um lugar público. Mas acho que a iluminação deve ter ajudado. O lugar que o carro estava parado também. É um lugar meio deserto.”
Uma semana depois, a vítima foi J. F., que estacionava seu carro no mesmo local. Foi abordado e sequestrado por sete homens, na chegada à Quinta & Breja, por volta das 23h30. Naquele mesmo dia, outros dois carros tiveram seus vidros quebrados e pertences roubados. “O formato que a festa adquiriu hoje em dia acabou atraindo mais a galera para praticar esses atos de violência”, comenta Pessutti. “A Quinta & Breja tem três objetivos: financiar as atividades das entidades acadêmicas, no nosso caso o esporte para a ECA, promover uma integração básica e ocupar o espaço estudantil. Isso não tem acontecido. Não é mais um rolê legal para quem vai, nem para quem organiza. Não é mais um evento que dá o lucro e o giro de caixa de antes. Inclusive, está dando prejuízo, às vezes, e também é um rolê muito inseguro.”
Para, J. F., vítima do sequestro, a violência e o uso de drogas estão diretamente relacionados. “Não é só maconha que rola lá. Os estudantes mesmo alimentam a favela comprando droga. A pessoa que acredita que o bandido que vende droga é parceiro está sendo ludibriada, está alimentando e aumentando a probabilidade de risco.” Sobre possíveis soluções, J. F. comenta que não se pode proibir a entrada de ninguém num lugar público, porém é possível inibir o crime. “Qualquer pessoa deveria poder ser revistada, passar num detector de metais, como qualquer outro grande evento. A USP é repleta de grandes eventos. Que segurança aquilo oferece?”
Segundo a antropóloga Ana Lúcia Schritzmeyer, chefe de segurança da USP, o principal motivo para a insegurança nas festas universitárias é a falta de comunicação entre os organizadores e a Universidade, que deve garantir condições adequadas de localização e segurança para a realização desses eventos. Quanto à infraestrutura, existe uma comissão responsável por elaborar um plano de segurança para a Cidade Universitária, tratando de questões como iluminação, câmeras de segurança e outras medidas preventivas.
Guarda Universitária
Com a função de proteger o patrimônio físico da Universidade, a Guarda Universitária não possui porte de arma nem poder de prisão. “Eles têm o mesmo poder de um civil, de flagrar e noticiar uma ocorrência”, explica Ana Lúcia. J. F., que teve contato com alguns guardas durante seu sequestro, comenta sua experiência. “Eles não têm autoridade. Estão simplesmente vigiando. Estão de mãos atadas. Os caras se sentem completamente incompetentes.”
A crise na segurança levanta outra questão polêmica: a presença da Polícia Militar no campus. Para quem foi vítima de algum tipo de violência, a necessidade do policiamento na Cidade Universitária é unânime – embora os parâmetros ainda precisem ser discutidos. “É muito complicada a situação da segurança na USP. Realmente, uma polícia agressiva não seria muito saudável para a Universidade. Mas acho que tem que ter algum tipo de segurança mais efetiva lá dentro. Está todo mundo muito inseguro lá, todo mundo com medo”, conta W. V. A outra vítima, J. F., acrescenta: “A polícia não quer saber de entrar lá porque é reprimida. Os alunos não querem saber da polícia porque a polícia é corrupta. Quem tira vantagem nisso? Só o bandido.” Sobre essa questão, Ana Lúcia aponta a necessidade de uma guarda mais preparada na Cidade Universitária, ponderando que simplesmente introduzir a PM não é a solução. “É preciso haver diálogo”, afirma a antropóloga.
Na Assembleia do dia 27 de maio, os estudantes decidiram usar a Quinta & Breja como “instrumento de greve”. J. F. e W. V., no entanto, não pretendem mais frequentar as festas no espaço universitário.
Fotos: João Ortega