Em cartaz no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, a mostra “Flieg fotógrafo” explora as contribuições de Hans Gunter Flieg para a fotografia brasileira das décadas de 1940 a 1980. A mostra conta com 220 imagens do fotógrafo, que, nessa época, direcionou sua produção principalmente à indústria, à publicidade e à arquitetura.
Proveniente de família de origem judaica, o fotógrafo nasceu em 1923, na Alemanha, e chegou ao Brasil em 1939 devido ao anti-semitismo que se instaurara então no país alemão. “Hans Gunter Flieg faz parte de uma geração de fotógrafos estrangeiros que imigraram para o Brasil no período da Segunda Guerra Mundial e que contribuíram para a profissionalização de diversos segmentos de um mercado de trabalho ainda incipiente entre nós”, afirma Helouise Costa, docente e curadora do MAC.
Assim, na capital paulista, Flieg encontrou um mercado de trabalho propício para a fotografia, que era utilizada como meio de registro das atividades empresariais e principalmente da industrialização que acontecia em um ritmo acelerado nesse período. O fotógrafo recebeu encomendas de trabalhos para grandes nomes da indústria, entre elas a Pirelli, a Mercedes-Benz e a Cia. Brasileira de Alumínio.
Além disso, ele foi comissionado para registrar diversos eventos artísticos na década de 1950 – entre os quais um de importância extremamente relevante: a 1ª Bienal de São Paulo, em 1951. “[Flieg] fotografou diversas obras que hoje constam no acervo do MAC, no contexto em que foram apresentadas pela primeira vez ao público”, conta Helouise. Um exemplo é a escultura “Unidade tripartida”, do artista suíço Max Bill, posicionada logo à entrada da mostra. É interessante observar que a exposição acontece no mesmo período que a 31ª Bienal de São Paulo, e acaba sendo, dessa forma, uma oportunidade para se conhecer o traçado histórico do desenvolvimento artístico da cidade.
Entre as fotografias expostas, encontram-se ainda registros das mudanças arquitetônicas na capital paulista, como a demolição do belvedere do Trianon, para dar lugar ao pavilhão da Bienal, e a construção do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP). “Flieg documentou a afirmação da arquitetura moderna em São Paulo naquele período, sendo que o Palácio da Agricultura, edifício hoje ocupado pelo MAC, foi um exemplo importante daquele contexto”, afirma Helouise.
O que chama a atenção nas obras do fotógrafo é o seu olhar, que, apesar de ser extremamente técnico, tem também uma preocupação estética bastante evidente. Não são, portanto, registros meramente mecânicos, mas sim resultados de um verdadeiro envolvimento do autor com o retrato a ser fotografado. O jogo de contrastes entre luz e sombra, que se destaca ainda mais na película em preto e branco, aparece em todas as fotos, tornando-as reais e palpáveis. Mais do que isso, Flieg estabelece uma bela e forte relação entre arte e tecnologia, como em “Jogo de ferramentas Heinz”, onde transforma simples objetos em peças brilhantes e atraentes, que saltam aos olhos.
Esta é a primeira exposição apresentada por um proponente externo a ser realizada na sede do Ibirapuera do MAC – sua curadoria é do Instituto Moreira Salles, o IMS. “A política de exposições do museu prevê a abertura de dois andares e mais o prédio anexo para acolhimento de projetos dessa natureza, o que começou a se efetivar este ano com esta mostra”, esclarece Helouise. Além disso, é também a mais completa e abrangente acerca da obra de Hans Gunter Flieg já realizada após a retrospectiva feita pelo Museu da Imagem e do Som (MIS), em 1981.
por ANA CARLA BERMÚDEZ