Desde o fim de sua primeira etapa em 2014, o programa de pesquisa Ciência sem Fronteiras (CsF) não abre novos editais para vagas em instituições estrangeiras. Estudantes da USP, universidade que mais enviou alunos para o exterior, são prejudicados com a falta de bolsas de estudos.
Criado pelo governo federal em julho de 2011, o Ciência sem Fronteiras tinha como objetivo distribuir 101.000 bolsas de estudos para promover o intercâmbio de universitários brasileiros no exterior. Porém, há dois anos não são abertas novas vagas, o que levou muita gente a crer que o programa tinha acabado. Claudio Possani, diretor adjunto de mobilidade da AUCANI (Agência USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional), afirma que este é um pensamento errôneo. “O que temos, desde 2014, é o silêncio. Não há nenhuma oficialização de que o CsF não existe mais”.
Durante a primeira etapa do projeto, a USP foi a universidade que mais enviou estudantes para o exterior. Conforme dados do Data Mart do CsF, foram 5.541 bolsas implementadas na instituição. Dessas, 73% foram distribuídas entre os graduandos.
O programa possui enfoque nas ciências exatas e, por causa disso, a faculdade que mais se enquadrou no perfil selecionado para bolsas foi a Escola Politécnica. De acordo com Fernando Josepetti Fonseca, vice-presidente da Comissão de Relações Internacionais da Poli, a unidade chegou a mandar 350 alunos para o exterior em um ano. Fonseca acredita que o grande mérito do CsF foi “dar condições a alunos que gostariam de ir, mas que não tinham condições econômicas”.
Antes da criação do CsF, os universitários que faziam intercâmbios optavam por países em que o ensino superior era público, como Portugal, Espanha, França e Alemanha. Após a consolidação do programa, com as taxas acadêmicas liquidadas, os estudantes passaram a ultrapassar essas fronteiras. “Durante a vigência do projeto, enviamos muitos alunos para os EUA, Ásia, Canadá e Austrália. Eles puderam escolher com mais liberdade”, reconhece Possani.
Fonseca conta que, por causa do CsF, uma cultura de reserva de dinheiro para intercâmbios foi quebrada. “Até 2011, não existiam muitas bolsas, e os alunos se preparavam desde o primeiro dia de aula, fazendo reservas financeiras”, explica. “Quando veio o CsF, a estrutura foi desmontada”.
Com a ausência da abertura de novos editais, a certeza de muitos estudantes se transformou em desilusão. Agora, graduandos que estão nos semestres finais não possuem condições financeiras para arcar os custos da viagem e correm o risco de perder suas últimas oportunidades. “Aqueles que não têm condições pessoais ficam comprometidos”, afirma Fonseca.
É o caso de Marina Monteiro, estudante de engenharia civil na Poli. Ela vinha se preparando há mais de um ano para estudar em alguma instituição estrangeira, fazendo aulas de italiano. “Na Poli existem alguns projetos de intercâmbio, mas eles são muito poucos comparados com a quantidade de alunos da faculdade, e para conseguir a aprovação em um deles é preciso uma média ponderada bem elevada. Por conta de tudo isso,sempre vi no CsF uma solução”. Marina afirma não possuir condições financeiras para pagar um intercâmbio: “Eu tenho outra irmã na faculdade, e já seria difícil para os meus pais conseguirem enviar uma de nós. Mandar as duas é inviável”.
A USP oferece um programa próprio de bolsas, o Bolsas Mérito Acadêmico, que cobre a mensalidade em instituições estrangeiras. Possani reconhece que, apesar de englobar todas as áreas de conhecimento, o programa não consegue atingir a mesma dimensão do CsF. “Houve uma queda na oferta de intercâmbios com bolsas, mas é um número bastante importante ainda”, afirma o diretor adjunto.
A diminuição de bolsas já é sentida pelos estudantes. Das 350 vagas de intercâmbio oferecidas pela Poli no início do ano, apenas 40 foram preenchidas. “São 40 alunos que tinham condições de pagar sua ida. A Bolsa Mérito Acadêmico deu ainda um gás, mas não supriu”, revela Fonseca.