Uma derrota no estômago e no bolso

16 horas, almoço de domingo. A televisão está sintonizada para a tão esperada disputa 

 

 

por Lucas Zacari

Arte: Lucas Zacari

 

Narrador: Estamos aqui, ao vivo e em definitivo para todo o território brasileiro, para essa que promete ser umas das partidas mais complicadas que o esquadrão canarinho já enfrentou. Os mais de 212 milhões de torcedores estão apreensivos com o que pode acontecer ao final do confronto. Contra a fome, a equipe, que já foi de primeira, está usando elementos de segunda e precisa vencer para não ir para os de terceira. 

Comentarista: É uma pena que o time tenha chegado a esse ponto de desespero. Gigante como esse, que já figurou entre os 10 clubes com melhor economia no mundo, teve sua gestão destruída a partir do início do mandato de seu presidente e dos atuais conselheiros e diretores, que preferem colocar em pauta orçamentos secretos, para pegar dinheiro do clube e perpetuar-se no poder, do que os problemas reais e verdadeiros da sua torcida. 

Narrador: Antes da partida, vamos para a escalação que vai tentar mudar o panorama do campeonato. No gol, Batata; a zaga é composta por Açúcar, Arroz, Feijão e Pão; no meio de campo, temos a presença do Café, da Manteiga e do Ovo; e no ataque, de um lado, o Óleo, do outro, o Macarrão, e, de centroavante, a Farinha. 

Repórter: É importante falar que quem está conseguindo manter a equipe são os próprios torcedores. A diretoria do clube não aparenta ajudar e, inclusive, parece aumentar o salário dos jogadores sem pensar nas consequências para o torcedor. Por conta disso, a Carne, a craque do time, teve de ser retirada da escalação, tendo em vista que seu salário aumentou em 30,7% no último ano.

Comentarista: É uma vergonha os torcedores sofrerem tanto para conseguir bancar e financiar essa equipe, chegando a pagar R$ 700,00 para bancar o elenco, enquanto os responsáveis pelo clube não tentam ajudar. É mais de 60% do salário mínimo do país!

Narrador: Isso sem contar na própria escalação do ovo, que por vezes já foi considerado um vilão nutricional e de baixa qualidade e, hoje, tem de ser o camisa 10 e o principal jogador da equipe. Mas vamos parar de falação e vamos para a partida decisiva. Mexe na bola e rolou o melão! Na verdade, é melhor lavar e deixar ele guardado, está muito caro. 

Alguns minutos se passaram e a fome já está vencendo.

Comentarista: É inadmissível, o time está apático, o valor alto dos salários não condiz com a realidade, não pode ter tão pouca oferta de sustância para a população. Se não mudar isso, a fome vai golear e fácil, fazendo o torcedor sofrer. Porque quem não dorme por conta da dor de não comer é a torcida, os dirigentes preferem discutir outras coisas, eles tem o que comer. 

Repórter: Daqui do campo, é possível ver algumas pessoas fazendo fila para procurar um mísero reforço de alimentação, mesmo que seja no caminhão de lixo. Em outro setor, dá para ver que está saindo uma confusão por alguns pedaços de ossos. A que nível chegou esse time?

Narrador: E como vocês falaram, quem sofre é o torcedor, não os dirigentes. Mas enquanto isso, lá vem mais um, olha a bola tocada, virou passeio… 

Acaba a partida, o torcedor está chorando pela fome ter dominado o jogo e vencido. 

Narrador: Apita o árbitro, final de jogo. Um dos piores e mais massacrantes resultados que o Brasil já viu. A fome goleou e, mais uma vez, a torcida não tem o que a sustente. 

Repórter: O técnico Paulo Guedes, que outrora disse ser ovacionado pelos torcedores, definitivamente não sente mais isso. Com a volta da torcida, a vaia é quase uníssona e a pressão pela demissão fica cada vez mais intensa. 

Comentarista: Se não estivesse tudo tão caro, a “turma do amendoim” estaria em polvorosa jogando o petisco pra cima do treinador e do presidente da equipe. O problema é que parece que a saída dessa situação parece estar longe de acontecer…