Jornal do Campus: Quais são suas propostas pro ensino superior?
Paulo Bufalo: Para falar de propostas, precisamos contextualizar e analisar a conjuntura do ensino superior no Brasil. Nós vivemos um processo de privatização, que teve origem com a criação desordenada e descontrolada de universidades privadas e o estancamento das públicas. Uma política mais recente que fecha esse ciclo de privatização é justamente o ProUni, em que, aliado à ideia de garantir acesso à universidade para a parcela da população filha de trabalhadores e submetida à pobreza, o governo transfere recursos públicos para a iniciativa privada.
No estado de São Paulo isso não é diferente, basta olhar como cresceram as empresas de educação nesse período. E a universidade pública, além de não crescer ou crescer com limitações, perdeu a sua base que lhe dá concretude, que é a idéia do tripé de educação, pesquisa e extensão, para atender a interesses mercadológicos. Por isso, é preciso que nós apontemos para estatização da universidade pública. Para isso, nós precisamos de mais investimento para desenvolver a educação, a pesquisa e a extensão. Não só nas áreas de tecnologia ou exatas, mas em todos os campos do conhecimento. É preciso valorizar a autonomia das universidades, respeitando o conselho universitário. É preciso que a relação com estado não sobreponha a própria universidade nos seus aspectos internos, para valorizar a democracia nesses espaços. E é preciso expandir a universidade pública para atender aos interesses do povo paulista e não aos interesses do mercado.
JC: Quais sãos as principais ideias para aumentar as verbas?
PB: Em primeiro lugar nós temos que combater as manobras contábeis que reduzem as verbas vinculadas, como a verba do ICMS, no conjunto do orçamento. E, segundo, garantir os 11,6% do ICMS para universidades públicas paulistas, que é a reivindicação histórica do ensino no estado, e os 2% para o centro Paula Souza. É importante destacar que o centro Paulo Souza, caso fosse cumprido seu vínculo com a Unesp, poderia cumprir um papel importante na tarefa de apoio à pesquisa e desenvolvimento e extensão, com aplicação das tecnologias e conhecimento para a área técnica.
Além dessas operações, nós defendemos fazer a auditoria da dívida pública do estado de São Paulo, porque ela consome uma parcela importante dos recursos que poderiam ser revertidos tanto para a ampliação da educação básica, como para o ensino universidade. É isso: expansão, construção, ampliação do que temos e suporte financeiro estrutural para que possamos fazer avançar a universidade paulista.
JC: E para a expansão das vagas, qual é o plano? Ampliar vagas nas instituições que já existem, criar outras ou estatizar privadas?
PB: Nós achamos que não podemos ter dinheiro público para universidade privada, como se adotou hoje com o ProUni. E em São Paulo, inclusive, vamos combater qualquer manobra nesse sentido, que transfira dinheiro público para iniciativa. É preciso planejar e ampliar a universidade pública. À medida que ela se expandir com qualidade, o mercado da universidade privada vai perdendo sentido. A qualidade dessas instituições privadas é tão baixa que não vale a pena para o Estado tê-las sob sua administração. O Estado vai avançar muito mais se criar vagas no ensino público do que se estatizar uma universidade cuja estrutura não é adequada para a educação.
JC: O que o senhor pensa sobre o processo de escolha do reitor na USP pelo governador?
PB: O papel estratégico da universidade precisa ser acompanhado também de uma mudança no modelo de gestão. Para nós, é preciso que a sociedade universitária possa escolher seu reitor e ter sua escolha respeitada a partir da proporcionalidade na votação. Não tem porque continuar uma lista tríplice, mas é preciso que a opção feita pela comunidade valha.
JC: Como o senhor vê a questão da presença da PM no campus, tanto para conter as manifestações grevistas como para garantir maior segurança na USP?
PB: A questão da segurança envolve a desmoralização da estrutura dos serviços públicos, sua terceirização e falta de treinamento dos terceiros, porque esse vigilante hoje está na USP, amanhã está num mercado, outro dia num banco, então não tem a formação profissional voltada para atender a essa tarefa. Não se faz concurso, não se contrata, não se cria vínculo do trabalhador com o público e com a própria universidade para cumprir sua tarefa de proteção. Em segundo lugar, as universidades públicas estão cada dia mais isoladas das comunidades em que estão instaladas. Elas vão construindo muros, grades, colocando alarmes e câmeras de vigilância. Se essa universidade não tem identidade com a sociedade em que está instalada, ela sofre com o problema da violência contra o patrimônio das pessoas e do patrimônio público com a depredação.
Tem se tratado uma greve de trabalhador não como uma reivindicação justa possível de se negociar, mas com o cassetetes na mão. Essa forma de relação do Estado com o trabalhador é truculenta e tem raiz na ditadura militar. Nós refutamos isso. Para nós, a PM de São Paulo deve ser desmilitarizada para que a corporação possa, em eventuais desvios, responder civilmente, como qualquer civil responde quando comete crime. E jamais, à medida que respeitamos a autonomia da universidade e defendemos a democracia, sob uma gestão do PSOL, a PM será usada para reprimir trabalhadores e, portanto, também não será usada para repressão no interior das universidades.
O diagnóstico que fazemos é que a atuação dessa polícia tem resquícios no regime militar, que não foi passado a limpo. A polícia precisa ser reconfigurada. Ela precisa ser uma polícia humana e, portanto, de formação continuada na área de direitos humanos. E essa nova configuração é que, no nosso ponto de vista, pode conciliar questões de segurança em uma universidade ou escola e das suas relações com a comunidade. Uma polícia com esse novo perfil pode cumprir esse papel sem sombra de dúvida.
JC: Qual é a sua opinião sobre a Ficha Limpa?
PB: Nós fomos para rua defender a tramitação da Lei da Ficha Limpa. Avaliamos que é uma lei muito positiva para o país. Mas achamos também que só uma lei positiva ou algumas leis positivas não são suficientes para que a gente barre o processo de criminalização dos movimentos sociais e de criminalização de pobreza que se abate sobre o povo paulista e sobre o povo brasileiro pelas totais injustiças cometidas pelas nossas instituições. Sejam elas do poder executivo, quando faz como fez com os trabalhadores, que colocam a polícia em cima; sejam do poder legislativo, quando se omite das suas tarefas de fiscalizar o poder executivo e de, por exemplo, adotar e elaborar legislações de controle para esse tipo de aplicação das Forças Armadas; sejam do poder judiciário, poder que prefere muitas vezes acolher e conceder um habeas corpus para um banqueiro e manter preso na cadeia uma mãe ou um pai que às vezes vai em busca de alimentar o seu filho. Temos uma boa lei e agora precisamos de boas instituições que a respeitem e que a coloquem em vigor.