Reintegração termina com duas detenções

Ação da Polícia Militar foi considerada pacífica, mas dois alunos foram detidos e encaminhados à detenção provisória

Após 42 dias de ocupação dos estudantes, a Polícia Militar reintegrou o prédio da Reitoria da Universidade de São Paulo, no início da manhã do dia 12. A Tropa de Choque cercou o prédio no fim da madrugada e a operação ocorreu por volta das 5h30 e durou poucas horas. Apesar de a ação ter sido considerada pacífica e dos estudantes desocuparem o prédio antes que a Polícia Militar entrasse, dois alunos do curso de filosofia foram detidos.

Histórico


Dois dias após a ocupação da Reitoria pelos estudantes, que se deu no dia 1° de outubro, a USP entrou com um pedido no Tribunal de Justiça de São Paulo para reintegrar o prédio. No dia 9 de outubro, o pedido foi indeferido. Seis dias depois, o desembargador José Luiz Germano concedeu 60 dias para que os estudantes desocupassem o prédio e tivessem tempo para negociar um acordo com a Reitoria. A Universidade recorreu e conseguiu a liminar de reintegração, entregue aos estudantes no dia 6 de novembro. No mesmo dia da entrega, os estudantes votaram por continuar a ocupar a Reitoria, até que, seis dias depois, a Polícia Militar cumpriu a ordem de reintegração.

Detenção


Inauê Taiaguara e João Vitor Gonzaga Campos foram presos pela Tropa de Choque na operação de reintegração. Eles foram encaminhados ao 93° DP, em Jaguaré, o que motivou a convocação de um ato dos estudantes em frente à delegacia. Na manhã do dia seguinte, os alunos foram levados ao 91° DP (Ceasa), acompanhados novamente pelo movimento estudantil. Do 91° DP, eles foram transferidos para o Centro de Detenção Provisória (CDP) da Penitenciária de Osasco. A ordem de soltura deferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) veio na tarde de quarta-feira, e, conforme a Secretaria da Administração Penitenciária, os estudantes foram liberados às 18h30.
De acordo com declaração de uma aluna da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), os dois estudantes foram vítimas de tortura física e psicológica, “conforme consta nos depoimentos deles”. A estudante declara que Inauê e João Vitor “foram pressionados a confessar que estavam na Reitoria, mas não o fizeram”. Em relato, ela afirma que os dois estavam em uma festa, que ocorreu no interior do Centro Acadêmico de Filosofia (CAF), do qual Inauê é diretor, durante a madrugada de terça. “Eles estavam nessa festa, juntamente com outros alunos da filosofia, durante toda a madrugada. Parte desses alunos já prestou depoimento à polícia”.
A estudante conta que, por volta das 5h, Inauê pediu aos guardas do prédio, onde ocorreu a festa, que fechassem o espaço dos estudantes, visto que eles estavam indo embora. “Nesse momento, quando os estudantes da filosofia – incluindo o Inauê e o João Victor – saiam do prédio, ouviram rojões vindo da região da Reitoria e desceram para ver o que estava acontecendo. Foi quando a Tropa de Choque avistou o conjunto de estudantes e os perseguiu. Parte deles conseguiu correr, mas Inauê e João Victor foram presos”, relata.
Segundo Celso Garcia, delegado titular do 93ºDP, a delegacia está analisando o inquérito sobre o caso. “Várias testemunhas favoráveis aos estudantes já vieram depor. Agora, estamos juntando provas para podermos apurar os fatos. Nós temos um prazo de 30 dias para a conclusão do inquérito, que é o estipulado normalmente”. Segundo Garcia, os estudantes foram detidos sob a alegação de furto, dano e formação de quadrilha. Os alunos foram transferidos para o 91ºDP porque, no 93ºDP, “não há carceragem, ou seja, não ficam presos”. “Quando a detenção por flagrante é feita, o acusado vai para um departamento de trânsito e eventualmente para o centro de detenção provisória”. Tal departamento de trânsito foi o 91ºDP.

Retenções


A direção da FFLCH, em conjunto com a da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), posicionou-se contrariamente às prisões dos estudantes, em nota divulgada em 13 de novembro. O Instituto de Psicologoia (IP) emitiu uma moção contra a detenção.
O Diretório Central dos Estudantes publicou uma nota repudiando a ação de detenção. De acordo com diretor do DCE, Camilo Martin, “os advogados do DCE foram bastante categóricos de que as detenções foram completamente arbitrárias, seja pela repudiável tortura física e psicológica a que [os estudantes] foram submetidos ou pelo enquadramento da prisão em flagrante e as acusações de furto, depredação de patrimônio público e formação de quadrilha, sem que houvesse qualquer tipo de prova para isso”. Segundo Martin, o DCE “repudia completamente a atitude truculenta da Reitoria e do Governo do Estado de optar mais uma vez pela uso da força policial, justamente em um momento de forte questionamento da falta de democracia na maior universidade do país e, inclusive, enquanto os estudantes exigiam a continuidade das negociações”.
Contatada desde a semana passada, a Sala de Imprensa da Polícia Militar informou que o pedido foi encaminhado à Secretaria de Segurança Pública, que diz não ter recebido a solicitação. Questionada sobre as detenções, a USP respondeu que “essa é uma questão policial e a universidade não se manifestará”.

Fotos: COLETIVO ALUNOS DO AUDIOVISUAL EM GREVE