Escolha de Professor Titular do CBD recebe críticas por parte de alunos e professores da área
Por Iolanda Paz e Ian Alves
O concurso para Professor Titular do Departamento de Informação e Cultura (CBD), realizado em junho deste ano, provocou repercussões e estranheza na área acadêmica. Eugênio Bucci, professor do Departamento de Jornalismo e Editoração, foi nomeado para a vaga, o que gerou contestações de alunos, docentes e da Comissão de Pós-Graduação da ECA. Depois da nomeação, a professora Marilda de Lara, uma das três concorrentes à vaga, abriu recurso no dia 13 de julho com a intenção de anular o resultado.
A validade da inscrição de Eugênio Bucci causou certa confusão por conta da portaria nº 54 de 2015 da ECA. Essa portaria recomenda que os candidatos tenham 5 anos ou mais de livre-docência, além de 10 anos em Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP) – critérios não cumpridos pelo professor. Entretanto, ela se refere à avaliação dos candidatos, e não a sua inscrição.
O que valida a participação do professor no concurso são as Diretrizes Gerais da USP – soberanas à portaria – que requerem apenas o título de Livre-Docente, mesmo que não seja da USP, para a legalidade da inscrição. “Se houvesse realmente um impedimento, o que seria natural e correto a se fazer seria recusar a minha inscrição”, afirma Bucci. “Ela foi aceita e tramitou por todas as instâncias da ECA, porque, evidentemente, ela é legal”.
Quanto ao resultado, a média final de Eugênio (8,67) foi menor que a de Marilda (9,33), mas ele obteve nota superior às dela por três avaliadores e, consequentemente, 3 das 5 indicações dos integrantes da banca avaliadora. Segundo a Resolução nº 3745 de 1990 da USP, o candidato que receber o maior número de indicações, e não a maior média, obterá a vaga – o que respalda a nomeação.
Foi questionado pelos estudantes, ainda, se a trajetória acadêmica de Eugênio, jornalista por formação, seria compatível à área de Biblioteconomia, única habilitação do CBD. Contudo, a vaga expressa no edital do concurso (nº 19 de 2016) era para a área de “Informação e Cultura”, que é o novo nome do departamento desde 2015, antigamente chamado de “Biblioteconomia e Documentação”.
Área do concurso
Em entrevista ao Jornal do Campus, Bucci explicou como seu histórico se relaciona à área temática do concurso. “O meu livro O estado de narciso, que foi minha tese de livre-docência, é um trabalho mais aprofundado sobre a gestão da informação no Estado – e no Estado brasileiro em particular”, menciona o professor, entre outros exemplos. “Eu não tenho uma trajetória na área de Biblioteconomia stricto sensu, mas eu tenho uma produção na área de informação e cultura”, completa.
A mudança de nome do Departamento foi aprovada nas devidas instâncias, mas, para integrantes desse campo acadêmico, a expressão “informação e cultura” pode ser abrangente e pouco clara. “Muitas áreas trabalham com informação. Existe informação genética e informação jornalística, por exemplo. Ela não é exclusivamente uma propriedade da Biblioteconomia ou da Ciência da Informação”, diz Marilda. A professora explica que esse campo trabalha com aspectos relacionados à organização e à difusão da informação, e principalmente com aquela que está registrada.
Marilda de Lara tem vinculação formal à área de Informação e Cultura. Ela ministra, desde 2009, disciplina obrigatória com esse mesmo nome dentro do CBD, no programa de pós-graduação Cultura, Informação e Público. A professora é bolsista produtividade PQ 1B do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), categoria de alta relevância nessa modalidade de bolsa.
Para Asa Fujino, professora do CBD, o resultado do concurso é constrangedor. “Temos um candidato que recebeu 10 como uma das notas [Eugênio Bucci], mas que não tem nenhuma participação no programa de graduação e de pós-graduação do departamento, e não ministra nenhuma disciplina de informação e cultura”, afirma. “Mesmo que o concurso pudesse ocorrer legalmente, acho que, do ponto vista moral, ele é questionável”.
Banca avaliadora
A definição dos membros da banca foi feita em reunião do Conselho de Departamento do CBD, ocorrida no dia 6 de março. Em sua composição final, estavam Martin Grossmann e Waldomiro Vergueiro, professores do CBD, cujos votos foram para Eugênio Bucci. Além deles, participaram da banca Emir José Suaiden (UnB), que também indicou Bucci, e as professoras Henriette Ferreira Gomes (UFBA) e Vera Lucia Dobedei (UNIRIO), que votaram na professora Marilda.
A aluna Mariana Crivelente, então Representante Discente, estava na reunião e contou ao Jornal do Campus que votou contra a presença de professores do CBD, de modo geral, na banca. Mariana fala que, se os integrantes tivessem relação constante com os candidatos, o julgamento poderia ser parcial. Apesar de as normas da USP exigirem um ou, no máximo, dois docentes da própria Unidade (ECA), a representante indicou professores que não eram do CBD, mas que eram da ECA e davam aula para Biblioteconomia. “Possíveis afinidades e desgastes não influenciariam na análise”, explica.
Mariana também comentou que estava preocupada com a relação profissional existente entre Eugênio Bucci e Martin Grossmann, que presidiu a banca avaliadora. Bucci fez parte do Conselho Deliberativo do Instituto de Estudos Avançados (IEA) durante a gestão de Martin como diretor do Instituto.
“Ninguém na banca é amigo meu”, afirmou Eugênio, quando questionado sobre a relação com Martin. “E se há alguma irregularidade na composição de uma banca, isso tudo é alegado e discutido antes.” A relação de nomes da banca avaliadora foi decidida na reunião do Conselho do CBD e depois aprovada pela Congregação da ECA em 23 de março.
Na avaliação do concurso, Martin Grossmann atribuiu a nota máxima (10) a Eugênio Bucci, o que criou um clima de estranheza em razão da portaria nº 54 de 2015 da ECA, que é explicitamente citada no edital do concurso como orientação para avaliação dos candidatos. Essa portaria apresenta critérios que não são contemplados por Eugênio, como os cinco anos de livre-docência e os 10 em RDIDP, mencionados no artigo 9º, incisos II e VI.
Ao ser questionado pelo Jornal do Campus sobre os critérios que utilizou na atribuição de notas aos candidatos, Martin preferiu não se posicionar individualmente. A resposta do professor foi de ordem institucional, em concordância com a nota de esclarecimento do Departamento de Informação e Cultura, que reitera a legalidade do concurso.
De acordo com as normas da USP, os resultados de concurso para Professor Titular precisam ser homologados, ou seja, aprovados nas congregações das unidades. Na reunião da Congregação da ECA do dia 28 de junho, foram lidos três manifestos diferentes que contestavam a nomeação de Eugênio: um assinado por docentes, outro por alunos e um último pela Comissão de Pós-Graduação da ECA. Mesmo assim, a nomeação de Bucci foi aprovada com 10 abstenções, 10 votos a favor e 2 contra – quórum suficiente para homologação.
O assunto também teve repercussão nacional na área da Ciência da Informação, e nomes como José Augusto Guimarães e Johanna Wilhelmina Smit reprovaram o resultado em redes sociais. “Uma vaga de Professor Titular destina-se a lideranças acadêmicas de uma área”, afirma Asa Fujino. “É o coroamento de uma carreira.” Na USP, somente Professores Titulares podem ocupar cargos como Reitor, Vice-Reitor e Pró-Reitor.
“É claro que eu quero que o concurso seja revertido, mas eu entrei com recurso não por mim, mas por achar que essa é uma postura que tem que ser defendida dentro da Universidade”, diz Marilda sobre o recurso. Ele ainda será avaliado na próxima reunião da Congregação da ECA, que ocorrerá no dia 30 de agosto.