Topografia do campus permite criação de circuitos semelhantes aos das competições
Por Rafael Castino
Mauro Nohara, 25 anos, é líder do ranking nacional de ciclismo paraolímpico na classe H1. O esporte, que começou como hobbie, há 3 anos virou sua profissão. Atualmente, o campeão brasileiro faz uso do campus Butantã durante a rotina de treinamentos. Com variações de percursos, curvas e subidas, a Cidade Universitária tornou-se o local ideal para preparação às provas.
“Hoje, o esporte paraolímpico só existe por conta da divisão de categorias, responsável por nivelar os atletas conforme as limitações impostas por cada tipo de deficiência.”, comenta Nohara. A classe qual Mauro compete é a H1, abrigando esportistas com capacidade limitada nas pernas, braços e tronco. Para além da divisão, existe uma mudança também no equipamento. Na prática, utiliza-se uma handbike – triciclo no qual os ciclistas posicionam-se deitados e pedalam usando as mãos. Apesar da ilusão que existe pelo fato dos competidores estarem na vertical, Mauro comenta que a posição é muito incômoda, e qualquer buraco ou desnível no percurso gera um impacto desagradável direto em seu corpo.
A rotina de treinamentos de Nohara é dividida em 3 períodos. Além de um simulador de ciclismo que permite o exercício do atleta em sua residência, Mauro pratica crossfit adaptado – programa de força e condicionamento físico geral baseado em movimentos funcionais. A parte própria do pedal é exercida em estradas e no campus da Cidade Universitária, ambiente que, segundo o atleta, assemelha-se muito ao das disputas “contra o relógio” de sua categoria.
“Na modalidade, existem dois tipos de provas: uma mais rápida, individual e com maior variação do trajeto; outra de grande distância e enfoque na resistência,“ comenta Nohara. “Na primeira delas, os atletas costumam largar sozinhos, estabelecendo uma diferença de um minuto para o outro. Durante o percurso, que tem cerca de 10 quilômetros, encontra-se um terreno cheio de curvas, desníveis e subidas. Algo muito semelhante ao que temos no campus Butantã. Treinar aqui permite a modelagem de circuitos muito próximos aos do dia competição”―
Durante a prova de resistência, os atletas largam juntos e executam percursos que variam de 20 a 60 quilômetros. Os terrenos são mais planos, o que leva a realização das provas geralmente às autoestradas e rodovias. Na visão de Nohara, o circuito nacional é bastante complicado, muito por conta da baixa qualidade do asfalto, que dificulta o deslocamento dos competidores.
A profissionalização
Em meados de 2013, Mauro Nohara transformou o hobbie do ciclismo paraolímpico em profissão. Sua primeira competição aconteceu em Rio das Ostras, no Rio de Janeiro. Apesar dos contratempos com o equipamento e a última colocação, o atleta leva este dia como o mais marcante de sua vida esportiva.
“Durante a primeira etapa, não tinha experiência nenhuma. No entanto, estava lá, conhecendo gente nova em meio aquela correria, emoção e empolgação.”, comenta Mauro. “Foi naquele momento que percebi realmente que competir era aquilo que desejava fazer para minha vida. O espírito da competição tinha me tomado, entendi que tais disputas eram algo extremamente diferente do que pensava. Antes, achava que o circuito profissional era sinônimo de desgaste, e que neste meio não teria tempo para fazer mais nada… Depois que participei de um campeonato vi que todo sacrifício anterior ao dia da competição valia muito a pena.”, completa.
Após a iniciação no esporte, Nohara passou por um processo gradativo de melhora, alcançando colocações mais altas até chegar ao pódio. O bronze veio na etapa de Brasília da Copa Brasil, a primeira medalha de ouro em Araraquara, São Paulo.
“Entre todas as conquistas, a que teve mais sacrifício envolvido foi a primeira medalha de ouro. Sempre dou muito valor às colocações mais altas do torneio. São durante esses títulos onde rivalizo com outros competidores, disputando a vitória em milésimos de segundos e contribuindo para aumentar cada vez mais o nível nacional.”
Mesmo com o título de campeão brasileiro em 2016 e a atual liderança no ranking da modalidade, o atleta sofre do um grave problema que afeta o esporte paraolímpico como um todo – a falta de apoio e patrocínios.
Segundo Nohara, o paratleta nacional é independente. As primeiras posições no meio nacional garantem um incentivo do Ministério do Esporte, conhecido como Bolsa Atleta. Os valores variam conforme o nível do esportista, aumentando em instâncias internacionais e olímpicas.
Por sua vez, patrocínios privados ocorrem na forma de permuta. Poucos são os atletas que recebem dinheiro de empresas e instituições. Em sua maioria, os apoios vêm na forma de serviço – manutenção de equipamentos e fornecimento de peças. Como troca, esportistas estampam em suas vestimentas e bicicletas a marca responsável por fornecer o auxílio.
“De dois anos para cá, com o cenário de crise, a questão do patrocínio esportivo mudou bastante. Atualmente, quem é patrocinado está próximo ao nível internacional da modalidade ou possui vínculo com a seleção brasileira.”, explica Mauro. “Hoje em dia, o que falta ao esporte paraolímpico é visibilidade.”
O valor do esporte
Como todo atleta de alto nível, Mauro Nohara carrega o desejo de disputar uma paralimpíada. No entanto, o caminho até os jogos paralímpicos é longo e bastante complicado, exigindo do esportista certa experiência internacional – como a participação em copas do mundo e campeonatos mundiais. Para além dos torneios, a presença do atleta no evento esportivo mais importante de todos fica muito a critério do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) e do Comitê Brasileiro de Clubes (CBC).
“Treino intensamente para que isso se torne realidade. É muito difícil, mas ser medalhista olímpico é o sonho de todos neste meio esportivo, se enxergar subindo no pódio com o hino nacional tocando e a bandeira do seu país sendo hasteada.”
Mesmo com todas conquistas e o alto nível das competições, o valor do esporte – na visão de Nohara – ainda está muito próximo àquele que o levava a praticar ciclismo como um mero hobbie.
“Para qualquer pessoa, a prática esportiva é muito importante na construção de uma vida melhor. Eu aconselho todo mundo a exercer alguma atividade física, independente do tipo – seja corrida ou musculação, de forma amadora ou profissional – praticar esporte é necessário sempre, para assim, melhorar a qualidade de vida.”, comenta o atleta.
“Aqui dentro do campus você consegue perceber muitas pessoas fazendo atividade física. De sábado, isso aqui fica lotado de gente correndo, pedalando, se exercitando… Nosso papel deve ser incentivar bastante essa prática. O esporte é algo muito valioso na vida das pessoas.”