Paralisação no Instituto e ato em frente à Reitoria exigem anulação da decisão, que demitiria cerca de 30 funcionários de dois navios de pesquisa da Universidade
por Diogo Leite
Na última sexta-feira, 5, alunos, funcionários e professores do Instituto Oceanográfico da USP (IO) e de outras unidades da Universidade realizaram uma manifestação em frente ao prédio da Reitoria, no Campus Butantã. O ato exigia a recontratação de 26 funcionários de dois navios de pesquisa do Instituto. Após ser recebido pela Reitoria, o Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) disse que a Universidade se comprometeu a negociar uma saída para o problema.
Na quarta-feira, 3, os trabalhadores receberam uma notificação oficial que dava a entender que estavam demitidos e não poderiam voltar às embarcações. Eles se recusaram a assinar a notificação, e, desde a última quinta, seguem ocupando os navios no porto de Santos, em protesto contra a decisão.
A Reitoria afirma que as notificações visavam apenas solicitar aos trabalhadores seus argumentos de defesa em um processo administrativo aberto por conta do caráter irregular das contratações, realizadas sem concurso público. Os vínculos de trabalho, no entanto, são antigos, sendo alguns de mais de 30 anos atrás, e somente agora a USP apontou o problema. “Precisamos deixar claro que a culpa pela irregularidade dos contratos é da administração da Universidade, e os trabalhadores não devem pagar por isso”, afirma Reinaldo Souza, diretor do Sintusp.
Pesquisas e aulas paralisadas
Os navios, chamados Alpha Crucis e Alpha Delphini, são utilizados para pesquisas e trabalhos de campo de alunos e professores do IO. De acordo com Wilson Natal, técnico de um dos laboratórios do Instituto, as demissões atrapalham gravemente as atividades da unidade. “Um navio não é igual a um carro, a Marinha exige que haja uma tripulação mínima para que ele continue operando. O reitor não obedeceu isso ao determinar as demissões, apesar de alertas do diretor do nosso Instituto”, explica. “Contratar toda uma nova tripulação e treiná-la levaria anos.”
Durante o ato, diversos alunos e professores declararam que tiveram atividades de trabalho em campo e coleta de dados para pesquisas interrompidas por conta das demissões. “Trabalhar com um barco é a coisa mais básica para uma carreira na Oceanografia”, conta Luiz Rafael, aluno do 4º ano de Oceanografia, diretor do Centro Acadêmico Panthalassa, do IO, e membro do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da USP. “Sem os navios, teremos projetos de pesquisa e TCCs paralisados, além de alunos impossibilitados de realizar matérias obrigatórias”, relata.
Wilson explica que a pesquisa oceanográfica desenvolvida pelos navios é de suma importância não só para a USP, mas para toda a sociedade, em nível nacional e internacional. “Uma das coisas que estudamos com os navios é o efeito do derretimento das calotas polares – causado pelo aquecimento global – nas correntes marítimas, que são responsáveis por regular a temperatura nos oceanos no mundo todo”, explica. “Essas pesquisas só são possíveis graças a esses trabalhadores”.
A resposta da Reitoria
A Reitoria concordou em receber representantes do Sintusp para discutir o assunto. Após a reunião, realizada no dia 5, ficou decidido que os trabalhadores seguirão empregados até o fim dos trâmites do processo administrativo. Segundo Reinaldo, a USP se mostrou disposta a buscar uma solução judicial para o problema, regularizando os contratos, mas a mobilização política deve continuar para que isso se concretize sem que os funcionários sejam prejudicados.
“O que eu vejo é que, desde que começaram as mobilizações, o reitor percebeu que está errado. Minha esperança é que regularizem esses contratos”, afirma Wilson. Luiz Rafael destaca que a mobilização no IO foi histórica, unindo de forma inédita professores, alunos e funcionários. Para ele, o movimento deve ganhar força nos próximos dias, chegando a outros institutos. “Só não podemos cair na armadilha de achar que está tudo resolvido. Sinais de precarização em uma unidade devem servir de alerta às outras, e ataques aos direitos dos trabalhadores indicam que o mesmo pode acontecer com nós, estudantes”, afirma.
Procurada pelo Jornal do Campus, a Reitoria da USP se manifestou em nota sobre o assunto: “Após um processo interno de sindicância, realizado em 2022, foi constatado que os contratos de trabalho foram feitos de forma irregular, sem a realização de concursos públicos ou comissionamento. A USP tem buscado soluções para o problema. No dia 4 de maio, os servidores receberam uma notificação em que podem apresentar, em até 15 dias, uma manifestação por escrito e documentos como forma de garantir o direito à ampla defesa e ao contraditório. Cada caso será analisado pela Procuradoria Geral da Universidade.”