Recalculando rota: circulares ameaçam mudar, mas seguem nos mesmos trajetos

Mudança definitiva deve ocorrer após consulta, diz prefeitura; pesquisa aponta que maior problema é falta de ônibus

Por Camila Sales Machado, Julia Ayumi Takeashi e Julia Ganzer Estanislau

No dia 20 de fevereiro, cinco dias antes do ano letivo da Universidade de São Paulo (USP) começar, a Prefeitura do Campus USP da Capital (Pusp-C) anunciou as novas rotas dos ônibus circulares, que deveriam ser implementadas no dia 26 do mesmo mês. Durou pouco. Com inúmeras críticas, um dia depois do anúncio, a Pusp-C suspendeu as alterações.

O objetivo da mudança das rotas dos circulares e da criação de uma nova linha (8042-10), que deverá circular apenas dentro do campus, é diminuir os trajetos – possibilitando um maior número de viagens com a mesma frota –, e reduzir o tempo de espera nos pontos e terminais.

Após a revogação, a Prefeitura abriu um formulário online para consulta pública sobre a proposta, que ficou disponível até dia 8 de março.  

A revogação tem o propósito de permitir “uma participação mais ampla da comunidade USP na definição das mudanças antes de implementá-las”, diz a prefeita do Campus da Capital Raquel Rolnik em entrevista ao Jornal do Campus. As alterações devem acontecer, mas não há data prevista para isso. 

Quando questionada sobre o porquê da consulta ter sido aberta depois da decisão de mudar as rotas, respondeu que “também tinha uma aflição no sentido de tentar implementar alguma melhoria imediatamente antes do semestre letivo começar”.

Agora, a prefeitura diz que está analisando as reclamações e demandas, que já foram encaminhadas à São Paulo Transportes (SPTrans). Caso haja necessidade, o projeto apresentado anteriormente poderá ser alterado. 

As novas rotas foram pensadas a partir de uma pesquisa amostral origem-destino – que analisa o deslocamento dos alunos no Campus – e de um estudo interno, desenvolvido por uma consultoria formada por ex-alunos da Escola Politécnica e pelo GT Mobilidade do Plano Diretor Participativo. 

Aplicada entre julho e agosto de 2023, a pesquisa foi conduzida pela empresa privada Scipopulis. De um total de 70.027 pessoas na comunidade USP, 9,5% responderam o questionário. 

A pesquisa da Scipopulis apresenta três sugestões de novas rotas para sanar a demora dos trajetos, a espera dos ônibus e a superlotação em horários de pico, entre 7h e 9h da manhã e 16h e 19h, à noite. 

A sondagem apontou rejeição às mudanças de rota. De acordo com a Scipopulis, a melhor solução seria o aumento da frota, de forma a manter os trajetos atuais e melhorar todo o atendimento. Hoje, são 18 ônibus atendendo o campus.

Entre os apontamentos feitos pelos estudantes, a alteração da rota que passa na Rua do Matão teve uma atenção maior. “Com essa mudança, teríamos apenas o 8022-10, então lotaria e demoraria mais para entrarmos em um circular. A redução das rotas não compensa a falta de pontos nos institutos; a solução é colocar mais ônibus e não alterar as linhas”, comenta Maria Fernanda, estudante de Geologia.

Em contrapartida, o acréscimo da linha de ônibus favoreceria os estudantes de institutos próximos ao portão 3, que ficam mais afastados dos Restaurantes Universitários e das estações de metrô. “A nova linha poderia desafogar as linhas principais e eu teria mais liberdade para almoçar em qualquer RU. Mas não acredito que retirar o ponto do CRUSP para acrescentar mais uma linha vá melhorar o fluxo dos ônibus”, aponta João Siqueira, estudante de Fisioterapia. 

Após o primeiro mês de aulas, o circular 8032-10 sofreu uma ligeira alteração na rota, no sentido de retorno ao terminal Butantã. Agora, o ônibus passa novamente no ponto da Faculdade de Educação, logo antes de sair pelo Portão 1.

“Temos plena consciência que o sistema atual é muito ruim”, diz Raquel.

A “nova rota”: o que muda?

O JC conversou com dois dos representantes discentes do Plano Diretor do Campus: Lucas Bogéa, aluno de Economia, e o suplente Felipe Gomes de Almeida, da graduação de Ciências Sociais. Eles explicaram mais sobre as “novas rotas” e o futuro dos circulares no campus.

Quando começou o projeto para reformular o funcionamento dos circulares? 

FELIPE: O retorno pós-pandemia escancarou o problema de mobilidade, com comoção por parte dos estudantes e funcionários. Uma audiência pública foi realizada em junho de 2022 pela Câmara Municipal de São Paulo para tratar do assunto, convocada pela vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL). Na época, a prefeita do Campus salientou a falta de fiscalização por parte da própria SPTrans ao serviço dos circulares como um dos principais problemas.

Como o Plano Diretor e os estudantes se encaixam nisso?

FELIPE: Apesar de possuir um Grupo de Trabalho (GT) focado em mobilidade na USP, o novo Plano Diretor do Campus, que está em elaboração, não teve envolvimento direto no planejamento daquelas rotas, mesmo que alguns dos membros dele também estejam no Conselho Gestor. Além da pesquisa origem-destino, não houve participação estudantil.

Quais são as limitações para o aumento da frota e melhora do serviço?

LUCAS: Mesmo que o contrato com a SPTrans possa ser rediscutido e alterado por meio de aditamentos, o terminal Butantã não é capaz de comportar muitos veículos parados de uma só vez. Adquirir uma frota e um serviço próprio também não é uma opção para a USP, pois a SPTrans detém monopólio do transporte público na Capital.

E agora, o que será feito? 

LUCAS: A Consulta Pública que esteve aberta até março irá orientar a organização da mobilidade na Cidade Universitária. Para isso, também está sendo criado um GT especial dentro do Plano Diretor apenas para pensar as rotas dos circulares.

“Apesar de que o processo provavelmente vai ser mais demorado, a partir da formação desse GT acho que vai ter mais espaço para participação estudantil”, explicou Felipe Gomes.